Temer mantém Alves e breca nomeações políticas em estatais

 

07/06/2016

Andrea Jubé

Bruno Peres

Edna Simão

 

Após três semanas de governo, o presidente interino Michel Temer deflagrou uma ofensiva de comunicação, em que decidiu vir a público anunciar medidas de impacto positivo e tirar o governo da defensiva em relação à Operação Lava-Jato e às pressões por nomeações políticas para o segundo escalão.

Ontem, Temer convocou a imprensa para anunciar que não faltará aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB) para transportar órgãos ou pacientes para transplantes, e que suspendeu as nomeações políticas para diretorias de estatais e fundos de pensão. Em reunião fechada com auxiliares, decidiu manter no cargo o ministro do Turismo, Henrique Alves, acusado de ser beneficiário de desvios da Petrobras, segundo investigações da Operação Lava-Jato, e o advogado-geral da União, Fábio Osório.

Em pronunciamento à imprensa, sem perguntas, Temer avisou que fará pelo menos uma entrevista coletiva por mês. Na semana passada, concedeu a segunda entrevista exclusiva para uma emissora de televisão. Ainda no esforço de divulgar medidas positivas, Temer anunciará um pacote de medidas para superar problemas dos Estados aos governadores, na quinta-feira.

A decisão de suspender nomeações políticas vem na esteira da pressão que se intensificou nos últimos dias, em que aliados elevaram as cobranças por cargos em troca de votos favoráveis ao impeachment. Fontes do Palácio do Planalto confirmaram ao Valorque a cúpula do PMDB de Minas Gerais reivindicou indicar o novo presidente da Vale, no lugar de Murilo Ferreira. Uma fonte palaciana confirmou ao Valor que há estudos em curso sobre a substituição de Ferreira, mas que isso não ocorrerá no curto prazo. E lembrou que um voto decisivo virá do BNDES.

A mesma fonte do Planalto disse que o senador Romário (PSB-RJ) reinvidicou à Secretaria de Governo uma diretoria de Furnas. Na semana passada, Romário retirou-se da comissão do impeachment, reuniu-se com Dilma e divulgou que não havia definido voto.

Nos últimos dias, sob uma ofensiva de denúncias envolvendo seus auxiliares na Operação Lava-Jato, que investiga desvios na Petrobras, e sob pressão para nomear políticos de currículos questionáveis, Temer foi aconselhado por auxiliares e amigos a sair mais a público para dar boas notícias à sociedade e reafirmar o seu compromisso com a pacificação nacional, a ética e a recuperação econômica. "Temer tem que mostrar que é o anti-Dilma, que seu governo não será igual ao anterior", argumentou um assessor palaciano.

Foi nesse contexto que Temer anunciou ontem que suspenderá as nomeações para diretorias de estatais e de fundos de pensão até a regulamentação legal da matéria. Depois de discutir o assunto com o líder do governo no Senado, Aloysio Nunes (PSDB-SP) e com o senador Romero Jucá (PMDB-RR), Temer anunciou que as nomeações ficam suspensas até que o Congresso aprove o projeto de lei de responsabilidade das estatais que condiciona essas nomeações à qualificação técnica, e que os indicados pertençam aos quadros das empresas. Aprovado no Senado, a matéria aguarda votação na Câmara dos Deputados.

Ontem Temer decidiu, em reunião com Eliseu Padilha e com o ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, que manteria nos cargos Alves e Osório.

A determinação de que haverá pelo menos uma aeronave da FAB em solo disponível para o transporte de órgãos e tecidos para transplantes, ou se necessário, para o deslocamento do paciente, vem na esteira da crise envolvendo o advogado geral da União. "Leva-se em conta que saúde é vida", disse Temer. O anúncio foi reação a uma reportagem do jornal "O Globo", que revelou que 153 órgãos deixaram de ser transplantados nos últimos três anos porque não havia aeronave da FAB disponível, enquanto os aviões transportam políticos. A FAB voltou à ordem do dia depois que, na última semana, o titular da AGU, Fábio Osório, requisitou um voo da FAB para comparecer a um evento em Curitiba (PR), mesmo sem a prerrogativa de uso da aeronave, porque não integra o primeiro escalão.

Mas para preservar Osório, Temer também cobrou uma postura enérgica do titular da AGU. Temer não escondeu a insatisfação com Osório, que em sua avaliação não soube lidar com a mudança no comando da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC). Temer queria editar uma medida provisória para mudar o estatuto da EBC e afastar o presidente Ricardo Melo, mas Osório desaconselhou a estratégia. Agora Temer determinou que o titular da AGU reverta a recondução de Melo no plenário do Supremo Tribunal Federal.

Temer também decidiu que não demitirá nenhum de seus auxiliares se não houver denúncia grave e contundente contra eles. No caso de Henrique Alves, avaliou que os fatos divulgados ontem não eram novos, já que era conhecida a existência de um inquérito para investigar o ministro na Lava-Jato. Segundo o jornal "Folha de S. Paulo", a Procuradoria Geral da República concluiu que Alves teve parte da campanha ao governo do Rio Grande do Norte, em 2014, bancada com recursos de desvios, que teriam sido pedidos pelo presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ao ex-presidente da OAS, Leo Pinheiro.

Segundo um auxiliar muito próximo ao presidente interino, antes de lhe dar posse como ministro do Turismo, Temer perguntou a Alves se poderiam surgir fatos graves na Lava-Jato que o impedissem de conduzir o ministério. Alves respondeu que não. Além disso, Alves integra o seleto grupo de amigos de Temer. A eventual demissão de Alves abriria precedente para o afastamento, futuro, de outros amigos que integram a cúpula do governo.

 

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Fazenda diz que reajuste faz parte de estratégia de governo

 

07/06/2016

Ribamar Oliveira

Raphael Di Cunto

 

O Ministério da Fazenda foi consultado sobre os reajustes dos salários dos servidores federais, aprovado na semana passada pela Câmara dos Deputados. Embora considere que o sinal seja contraditório com o discurso do ajuste necessário das contas públicas, o que cria um inevitável ruído na comunicação com a sociedade, a área econômica não se opôs aos projetos de aumento salarial por concordar com a estratégia definida pelo presidente interino Michel Temer.

Temer avaliou que, neste momento, não é aconselhável criar novos conflitos com a burocracia dos três Poderes, mesmo porque os reajustes dos salários já tinham sido negociados pelo governo da presidente afastada Dilma Rousseff com quase todas as categorias de servidores e estavam previstos no Orçamento da União deste ano. O impacto financeiro dos aumentos foi até mesmo considerado no cálculo da meta fiscal revisada de 2016, de déficit de R$ 170,5 bilhões.

Uma fonte do governo lembrou ainda que o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, que presidirá as sessões do impeachment de Dilma, é quem mais lutou pela aprovação dos reajustes para os servidores do Judiciário e dos ministros do STF, o que eleva o teto salarial do funcionalismo.

Na avaliação do presidente interino, a decisão de evitar novos conflitos irá pavimentar o caminho para a aprovação, pelo Congresso Nacional, de duas medidas que são consideradas fundamentais pela área econômica: a fixação de um teto para a despesa total da União e a recriação da DRU (Desvinculação das Receitas da União).

Antes da votação dos projetos de aumento dos servidores, o líder do PSDB, deputado Antônio Imbassahy (BA) e outros tucanos foram conversar com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, para saber se havia algum impedimento. Sem defender abertamente os projetos, Meirelles lembrou que os reajustes previstos eram abaixo da inflação e que, por isso, não desrespeitavam a regra defendida por ele de teto para o gasto, que prevê correção da despesa total da União apenas pela inflação.

Para não criar uma celeuma dentro da base governista, os tucanos se comprometeram a não atrapalhar a votação, que foi simbólica, mas informaram que não aceitarão aumento ou criação de novos impostos. A medida desagradou ainda outros partidos aliados de Temer no Congresso, como o DEM, principalmente. "Muitos da base que conheciam os projetos votaram a favor com constrangimento e só apoiaram para não criar complicações para o governo", afirmou um dos negociadores.

O governo admite que foi pego de surpresa com a negociação para votar os projetos na noite de quarta-feira da semana passada, em acordo com a oposição para que não houvesse obstrução à apreciação da DRU. No dia anterior o acerto era que o mérito das propostas de reajustes salariais seria analisado em plenário apenas no fim deste semestre.

Segundo relatos de parlamentares, o ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, não sabia exatamente o conteúdo dos projetos, negociados pelo ex-ministro do Planejamento, senador Romero Jucá (PMDB-RR), que foi consultado e informou que havia consenso no governo em torno de três das 15 propostas: os aumentos para os militares e servidores das agências reguladoras e da educação.

A oposição negociou, em reunião a portas fechadas, a inclusão de outros cinco projetos, entre eles os do Judiciário, com os quais o governo concordou. Durante a sessão em plenário, porém, a oposição exigiu a aprovação em bloco de todos os projetos e o governo acabou cedendo - nos bastidores, já argumentando que o Senado precisaria alterar parte das propostas.

A estratégia do governo no Senado é eliminar a criação de 14 mil cargos para serem preenchidos por concurso, prevista em um dos projetos aprovados pela Câmara, e negociar outras mudanças, como a incorporação de benefícios por servidores da ativa e inativos e pagamento de honorários de sucumbência a advogados públicos. Parte dos textos sofreu alterações por relatores nomeados em plenário e até hoje, cinco dias depois, várias das redações finais ainda não estão prontas para que os projetos sejam encaminhados ao Senado.

Ontem, o Ministério da Fazenda assegurou, por meio de nota oficial, que "não há nenhuma divergência entre o Ministério da Fazenda e o presidente da República em exercício Michel Temer". Segundo a nota, "o reajuste do funcionalismo estará sujeito ao limite constitucional de gastos".

Em um primeiro momento, a estratégia de Temer de evitar conflitos novos surtiu efeito, pois, no mesmo dia em que foram votados os aumentos dos servidores, a Câmara aprovou a DRU, em primeiro turno, com desvinculação de 30% das receitas da União - um projeto que estava parado no Congresso desde meados de 2015.

O Ministério da Fazenda mantém sua avaliação de que a maneira mais segura de garantir a retomada do crescimento é o governo encaminhar uma solução definitiva para a grave situação das finanças públicas. Com isso, raciocinam as autoridades, haverá uma melhoria da confiança dos empresários nos rumos da economia, uma redução da percepção de risco do Brasil e a retomada dos investimentos. As fontes da área econômica estão convencidas de que a aprovação da DRU e do teto para os gastos vai melhorar significativamente as expectativas dos agentes econômicos.

Por isso mesmo, não há medidas de curto prazo em estudo para estimular à economia, garantem as fontes. A área econômica entende que a melhor iniciativa neste momento é acelerar o envio ao Congresso das medidas que já foram anunciadas pelo presidente em exercício Michel Temer, entre elas a fixação de um teto para as despesas da União, e aprovar as que já estão lá. A intenção do governo é enviar, na próxima semana, a proposta de emenda constitucional que fixa o teto para os gastos.

 

Valor econômico, v. 17, n. 4020, 07/06/2016. Especial, p. A14