Turbilhão de incoerências

 

12/07/2016
Eliane Cantanhêde

 

Vejam como estão as coisas no Congresso: a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ) deve aprovar a cassação do deputado Eduardo Cunha hoje e o plenário pode eleger um candidato pinçado, patrocinado e catapultado pelo mesmo Eduardo Cunha amanhã. Duplo réu no Supremo, afastado do mandato, ele acaba de renunciar à presidência, está às vésperas de ser cassado e corre o sério risco de ser preso em questão de semanas, mas continua sendo um fenômeno, raiando o patológico.

Cunha não deixa nada barato e, até na CCJ, temem-se surpresas. A previsão é de que trinta deputados discursem e que ele e seu advogado falem durante quase três horas, tudo isso mesclado com questões de ordem, trocas de desaforo, manobras ora sutis, ora escancaradas, para continuar empurrando o processo com a barriga e adiando o fim de Eduardo Cunha. Ele conhece o regimento como ninguém e mantém, apesar de tudo e de todos, uma tropa ainda fiel e disposta a passar os maiores vexames por ele.

O ideal seria que a CCJ votasse hoje pela cassação e já começasse a contar o prazo para a palavra final do plenário.

Mas, com Eduardo Cunha, não se brinca.

Há quem tema que ele consiga no mínimo protelar sua cassação e há até os apavorados com a hipótese de a maioria da CCJ acatar o parecer do relator Ronaldo Fonseca e devolver tudo para o Conselho de Ética. Seria o pior dos mundos, porque não faz tão bem assim a Cunha, mas faz um mal enorme à Câmara.

Uma inesperada vitória dele na CCJ não salva o seu pescoço, mas prolonga a agonia e gera uma indignação generalizada na sociedade.

Mas sejamos otimistas, acreditando na possibilidade mais forte, de que ele perca na CCJ. Só que tem de ser logo, porque um adiamento jogaria a questão e o destino de Cunha nas mãos do novo presidente da Câmara. E se ele for Rogério Rosso (PSD-DF), que foi indicado por Cunha e é do time dele? Cunha vai articular as jogadas para Rosso chutar em gol? Se a terça-feira começa com temores quanto à capacidade de resistência de Cunha, imagine-se como vai começar a quarta, com uma profusão de candidatos a presidente-tampão, uma nuvem de incertezas e a real possibilidade de mais um erro grave da Câmara. A sensação geral é que Rosso consolidou-se como candidato (graças a Cunha, ao "centrão", ou seja, ao "baixo clero" encorpado, e, dizem as más línguas, ao Planalto de Michel Temer). A questão é quem estará do outro lado para enfrentá-lo.

A olho nu, o deputado Rodrigo Maia (DEM) parece ser o candidato mais forte a candidato contra Rosso. Ele tenta amarrar o apoio do próprio DEM – que tinha outros postulantes, como José Carlos Aleluia –, e votos no PMDB, no PSDB, no PPS e em parte do Centrão, mas não descuidou da “nova oposição”, formada por PT, PDT e PC do B. Uma situação curiosa. Já imaginaram o PT apoiando o candidato do DEM e do famoso Waldir Maranhão? Mas é assim, nesse turbilhão de incoerências, de falta de lideranças, de partidos rachados, de imagem ferida, que a Câmara está se preparando para um presidente quebra-galho que substitua Cunha, arranque Maranhão da cadeira, comande as votações de interesse do governo Temer e seja o segundo na linha de sucessão da Presidência da República. Ah! E sem descartar um “tertius” de última hora. O processo não corresponde a tanta responsabilidade, mas, convenhamos, está à altura da qualidade da atual Câmara dos Deputados.

Para não chorar, basta lembrar que serão menos de sete meses, até a eleição para valer, ou seja, para um mandato de dois anos, se é que o futuro presidente também não estará às voltas com a justiça, com trustes, com ações no Supremo. Nessa eleição “para valer”, aí, sim, vão entrar os titulares e os principais times, PSDB, PT e PMDB _ que usam julho de 2016 para articular fevereiro de 2017. Um pulo no tempo.

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Mensagem sugere lobby de Cunha por empreiteiras

 

12/07/2016
Mateus Coutinho
Julia Affonso
Ricardo Brandt

 

A Polícia Federal encontrou nos celulares do empreiteiro Otávio Marques de Azevedo, da Andrade Gutierrez, que fechou acordo de delação premiada na Operação Lava Jato, diálogos que sugerem a atuação do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDBRJ) em favor de empreiteiras.

Em umas das mensagens, de abril de 2014, chamou a atenção dos investigadores o fato de Cunha confirmar a Azevedo que atendeu a uma demanda da construtora Odebrecht para modificar um trecho de um projeto de lei “em segredo”. “Eduardo, estas modificações propostas pela CNO (segundo a PF, referência à construtora Norberto Odebrecht) estão aceitas pelo governo e a Câmara?”, questiona Azevedo em uma das mensagens.

Em seguida, após listar os artigos em que pede modificações, o executivo continua: “Soube por eles: O ponto 1 estará alinhado entre o relator e a Fazenda, mas gostaria de assegurar que é isso mesmo”.

Na resposta, Cunha confirma, mas diz que precisa manter a alteração em segredo. “Esse ponto 1 eu acertei, mas tem de ser em segredo. O segundo não.” O relatório da PF não deixa claro qual o projeto de lei que os dois discutiram, mas reforça as suspeitas da Procuradoria-Geral da República de que o peemedebista atuava em favor de empreiteiras no Congresso. Uma das linhas de investigação contra Cunha no Supremo Tribunal Federal é justamente sobre a suposta atuação do peemedebista para fazer lobby e cobrar recursos de empresas em projetos de leis e medidas em tramitação no Parlamento. Em um outro diálogo interceptado, de fevereiro de 2014, Cunha e Azevedo marcam um encontro na residência do empreiteiro.Atualmente, o ex-presidente da Câmara é réu em ação penal por supostamente ter recebido propinas em contratos de navios- sonda da Petrobrás. Ele responde a uma segunda ação acusado de manter dinheiro de propina em contas na Suíça.

Uma terceira denúncia, ainda não analisada pelo Supremo, aponta a participação do peemedebista em um suposto esquema de corrupção envolvendo financiamentos do FI-FGTS, administrado pela Caixa Econômica Federal.

 

Defesa. Por meio de nota, a empreiteira Andrade Gutierrez disse colaborar com as investigações. “A Andrade Gutierrez mantém o compromisso de colaborar com a Justiça. Além disto, tem feito propostas concretas para dar mais transparência e eficiência nas relações entre setores público e privado”, afirma a nota da empresa. Procurado, o deputado afastado não respondeu até a conclusão desta edição.

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Análise de recurso de deputado na CCJ pode ficar para agosto

 
12/07/2016
Daiene Cardoso

 

Com mais de 30 deputados inscritos para discursar durante a sessão, a Comissão de Constituição e Justiça corre o risco de não conseguir votar hoje e deixar para agosto a análise do recurso do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Poucos dias após renunciar à presidência da Câmara para escapar da cassação, o peemedebista deve ir pessoalmente se defender perante os colegas.

O relator do recurso na CCJ, deputado Ronaldo Fonseca (PROS-DF), é cético em relação à votação de hoje e reclama que a sucessão na Câmara está “contaminando” os trabalhos na comissão. Como amanhã a Casa estará envolvida com a eleição do novo presidente, Fonseca acredita que o processo de cassação na CCJ pode ficar para depois de julho. “Se não votar terça (hoje) ou quarta- feira (amanhã), infelizmente só depois do recesso”, disse.

Considerado aliado de Cunha, o presidente da CCJ, Osmar Serraglio (PMDB-PR), recusou o pedido para antecipar a sessão, assim a sessão da comissão poderá ser interrompida pelo início das votações em plenário. “Não tenho a menor dúvida de que marcar a CCJ no mesmo horário da ordem do dia serve para adiar a votação desse recurso”, acusou o líder da Rede, Alessandro Molon (RJ). “Não é má vontade.

Existem regras. Amanhã (hoje) o primeiro que vai falar é o advogado, que precisa ser intimado 24 horas antes. Ele já foi intimado na semana passada. Se quiserem a nulidade do processo tudo bem, nós vamos admitir”, rebateu Serraglio. O presidente da CCJ disse que a votação do parecer dependerá do “comportamento” dos membros.

Acompanhado de seu advogado Marcelo Nobre, Cunha deve assistir a uma batalha regimental entre aliados e adversários.

Quem defende a cassação do peemedebista usará de artifícios para acelerar a discussão; já os aliados do deputado afastado vão tentar deixar a votação para agosto. “O regimento favorece a protelação”, afirmou Fonseca, que se disse favorável a um desfecho rápido do caso.

Vice-líder da bancada do PSOL, Chico Alencar (RJ) afirmou que deixar a votação na CCJ para agosto é uma “protelação inaceitável”. “Cunha está sendo velado, seu corpo político é falecido. Eles querem adiar ao máximo o sepultamento.” Se não votar hoje, a comissão tem sessões amanhã e quinta-feira.

Deputados que são membros terão 15 minutos para falar, os não integrantes terão dez e os líderes poderão usar a palavra pelo tempo proporcional ao tamanho de sua bancada. Também está prevista a apresentação do advogado de defesa por até 2 horas e 19 minutos e do próprio representado por até 20 minutos. / COLABOROU ERICH DECAT

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Defesa quer desvincular Cláudia de corrupção

 

12/07/2016
Pedro Venceslau
Valmar Hupsel Filho

 

A defesa da jornalista Cláudia Cruz, mulher de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), vai tentar desvincular sua cliente da acusação de corrupção passiva da qual o marido é alvo. Na “resposta à acusação” protocolada no final da noite de ontem na 13.ª Vara Criminal Federal de Curitiba, os advogados argumentam que na offshore em nome de Cláudia na Suíça não passou o dinheiro que o Ministério Público aponta como sendo oriundo de “práticas ilícitas” de Cunha junto à Petrobrás.

Cláudia é denunciada por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. De acordo com o Ministério Público, a jornalista “tinha plena consciência dos crimes que praticava” ao ocultar, dissimular e movimentar mais de US$ 1 milhão “provenientes de crimes praticados por Cunha junto à diretoria Internacional da Petrobrás”.

A defesa da jornalista argumenta que os recursos apontados na denúncia como tendo sido recebidos ilicitamente por Cunha passaram, nessa ordem, pelas contas Orion SP e Netherton Investments, das quais o peemedebista afirma ser usufrutuário, mas não chegaram à Kopek, em nome de Cláudia.

“Os valores repassados pela Netherton à Kopek não são aqueles oriundos da Orion SP, que supostamente têm origem em vantagens ilícitas”, afirmam.

“Ainda que se tenha por verdadeira e comprovada a corrupção passiva na transação envolvendo o campo de exploração de petróleo em Benin, os valores supostamente auferidos por Eduardo Cunha naquele episódio jamais foram transferidos à conta Kopek”.

Para rebater a acusação de evasão de divisas, a defesa anexou parecer do advogado Tadeu De Chiara, professor de Direito Bancário, no qual ele argumenta que parte do valor que Cláudia tinha na conta se referia a uma garantia para o cartão de crédito e que esse dinheiro não estava disponível para gastos.

Segundo a defesa, Cláudia teria disponível um montante inferior ao US$ 100 mil. Pela regra estabelecida pelo Banco Central, apenas valores acima desse limite devem ser declarados.

Os advogados alegam ainda que houve cerceamento de defesa e constrangimento legal, uma vez que não tiveram acesso à íntegra dos documentos produzidos pelas autoridades suíças. A defesa de Cláudia pede ainda a suspensão do processo até que as autoridades do país europeu envie os documentos e a anulação da denúncia de lavagem de dinheiro.

 

O Estado de São Paulo, n. 44828, 12/07/2016. Política, p. A6