Valor econômico, v. 17, n. 4081, 31/08/2016. Política, p. A8

Mudança na lei trabalhista tem poucas chances de avanço

Por: Edna Simão / Fabio Graner / Lucas Marchesini

 

Caso o impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff seja aprovado, o futuro governo Michel Temer deve tentar encarar duas outras reformas polêmicas e há muito cobradas pelo empresariado, além da previdenciária: a trabalhista e a tributária. A ideia é focar nos consensos para não ter fortes embates com o Congresso Nacional.

Segundo uma fonte do alto escalão do governo, a reforma trabalhista tem chance ínfima de avançar. Mesmo assim, o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, pretende encaminhar texto ao Parlamento ainda neste ano. Aliados de Temer acreditam, no entanto, que isso deve ocorrer no decorrer do primeiro semestre de 2017. A reforma tributária também está entre as prioridades do governo Temer, mas ainda não há compromisso com data.

A reforma trabalhista, conforme fontes do governo, será resumida a dois pontos: abrir a possibilidade que acordos coletivos se sobreponham à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e definição do que são serviços especializados e que, portanto, poderão ser terceirizados.

"Nós estamos criando regras simples que possam ter impacto grande e imediato", tem dito Padilha, acrescentando que, a partir da efetivação do presidente Temer no cargo, a ideia é "liquidar" esse assunto em um ano.

O ministro do Trabalho destacou que as mudanças são necessárias para reduzir a insegurança jurídica na relação entre capital e emprego. "Vamos trabalhar na fidelização do contrato de trabalho para que com uma legislação mais clara, reduzam-se os conflitos. Também vamos tratar sobre o princípio da unidade sindical e, especialmente, sobre o fortalecimento da convenção coletiva. É importante definir em que pontos a convenção coletiva poderá deliberar nessa relação entre capital e trabalho e prevalecer sobre a legislação anterior", informou Nogueira ao Valor por meio de sua assessoria de imprensa.

Ele reforçou o discurso de que está descartada a possibilidade de parcelamento do 13º, fatiamento das férias, alteração no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) ou aumento da jornada de trabalho.

O presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, disse os empresários estão aproveitando a vulnerabilidade momentânea para "empurrar goela abaixo uma série de medidas que vão precarizar o trabalho". Nesse sentido, ele citou especificamente as reformas trabalhistas, previdenciárias e a terceirização. "Qualquer medida que tirar direito, vamos dar resposta a isso. Para chegar onde chegamos, muito trabalhador morreu, ficou doente, foram presos", prosseguiu.

No caso da reforma tributária, polêmica por conta dos conflitos federativos que enseja, também deve ficar para o ano que vem, embora já comece a ser pensada. Temer já estaria dando sinais a assessores próximos de que pretende avançar nesse tema, levantado por empresários em encontros com ele nos últimos meses. Seria uma agenda positiva, algo que, se for efetivado, poderia deixar uma marca da gestão Temer para o futuro. No momento, no entanto, a prioridade do Ministério da Fazenda é a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que fixa um teto para o crescimento do gasto público, corrigido anualmente pela inflação. Além disso, técnicos também estão desenvolvidos no fechamento do texto da proposta de reforma da Previdência Social.

Segundo o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, a reforma tributária de Temer será a unificação das alíquotas do ICMS dos Estados e reforma do PIS/Cofins. "Também coisinha pequena [comparando com a reforma trabalhista]. Acabar com a guerra fiscal do ICMS, cuidar de PIS e Cofins e deu. Não vamos pensar em muita mágica", contou Padilha.

Uma fonte reforçou que o problema é definir qual reforma tributária é viável e eficiente para ser encaminhada ao Congresso. Outra avalia que o cenário mais provável é que o governo trabalhe para uma reforma focada no PIS/Cofins, tributos federais cuja legislação é extremamente complexa e altamente sujeita a litígios. A ideia, segundo esse interlocutor presidencial, seria retomar ideias já conhecidas de simplificar a legislação e facilitar a recuperação de créditos dos tributos cobrados nas fases anteriores do processo produtivo ou de serviços utilizados, como energia elétrica. "Mas essa reforma também tem fatores complicadores, porque, para não abrir mão de receitas, alguns setores terão que pagar mais, como o de serviços, o que é polêmico", lembra a fonte.

O problema da fragmentada e complicada legislação do ICMS, em que cada Estado tem uma versão própria, tende a não ser encarado de forma mais contundente pelo governo Temer. De acordo com uma fonte, o caminho mais viável seria aprovar a convalidação de incentivos fiscais concedidos pelos Estados, que tramita no Congresso Nacional, e estabelecer uma vedação mais clara a novos incentivos. Isso "zeraria o jogo" da guerra fiscal, embora mantenha o status quo de 27 diferentes legislações de ICMS, que tornam a vida dos empresários um verdadeiro inferno burocrático.

O empresário Flavio Rocha, presidente da Riachuelo, um dos empresários que já se encontrou com Temer nos últimos meses, avalia que o ideal seria uma reforma tributária mais radical. Ele considera que o governo deveria partir para um sistema de tributação virtual, cobrada sobre a movimentação financeira, no lugar do PIS/Cofins e sua complexa legislação. O tributo na prática seria semelhante à CPMF, mas não seria um tributo adicional ao sistema atual e sim um substituto do PIS/Cofins.

A vantagem, diz Rocha, é que simplificaria o processo tributário e ainda reduziria a litigância. Ele lembra que a CPMF, com todos os seus problemas, deixou de ser cobrada sem legar nenhuma disputa na justiça entre contribuintes e governo.

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