Justiça põe Temer no cadastro de inelegíveis

 

04/08/2016
Silvia Amorim

 

O presidente interino, Michel Temer, figura desde junho deste ano no cadastro nacional de pessoas inelegíveis no país. A inscrição foi feita pela Justiça Eleitoral de São Paulo após Temer ter sido condenado, em maio, por doar mais recursos que o permitido por lei, na eleição de 2014. Como punição, Temer recebeu multa de R$ 80 mil e, em consequência da condenação em segunda instância, foi incluído no rol dos impedidos de disputar a eleição até 2024, por força de um dispositivo da Lei da Ficha Limpa.

Segundo o TRE-SP, o pagamento da multa ainda não foi feito, e o prazo para a quitação termina no dia 19 deste mês. A assessoria de imprensa da Presidência informou ontem que Temer fará o pagamento.

A situação do peemedebista com a Justiça Eleitoral passou a ser alvo de debate nos últimos dias, depois que aliados dele começaram a especular sobre a possibilidade de Temer ser candidato à reeleição em 2018, caso o impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff, seja confirmado. Ele negou que será candidato, mas integrantes de partidos da base ficaram desconfiados.

 

POSSÍVEL RECURSO AO TSE

Advogados especialistas em Direito Eleitoral ouvidos pelo GLOBO explicaram que, embora Temer esteja no cadastro de inelegíveis, nada impede que ele recorra ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para tentar rever sua situação, no momento em que entregar um eventual registro de candidatura em 2018. O resultado de uma ofensiva desse tipo divide opiniões.

— O dispositivo introduzido pela Lei da Ficha Limpa na Lei de Inelegibilidades é claro. Quem for condenado por doação eleitoral acima do limite permitido por lei fica inelegível por oito anos. O único caminho que vejo para ele é mudar a Lei da Ficha Limpa no Congresso — afirmou o professor de Direito Eleitoral da PUC-SP Everson Tobaruela.

O presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP, Silvio Salata, disse que há um caminho jurídico para Temer:

— Não tenho dúvida de que, se houver interesse dele em ser candidato, caberá alguma ação para discutir a aplicação da inelegibilidade nesse caso.

 

DOAÇÃO PARA DOIS DEPUTADOS

A encrenca em que Temer se meteu deve-se a uma doação de R$ 100 mil que ele fez, na eleição passada, a dois deputados do PMDB do Rio Grande do Sul: Alceu Moreira e Darcísio Perondi, que foram reeleitos. A lei limita as doações para campanhas eleitorais por pessoas físicas a 10% dos rendimentos declarados no Imposto de Renda. Segundo a Receita Federal, Temer extrapolou em R$ 16 mil esse limite.

A condenação em segunda instância ocorreu em 3 de maio, dias antes de Temer assumir a Presidência interinamente. Em nenhum momento do processo, o então vice-presidente recorreu da condenação, e o caso está transitado em julgado. O GLOBO tentou falar com o advogado que defendeu Temer, Renato Oliveira Ramos, mas ele não retornou.

A Lei da Ficha Limpa tornou esse tipo de infração eleitoral uma causa de impedimento para disputar cargo eletivo. Ela introduziu na Lei de Inelegibilidades um dispositivo que diz que ficam inelegíveis “os responsáveis por doações eleitorais tidas por ilegais por decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado da Justiça Eleitoral, pelo prazo de 8 anos”.

Para o promotor eleitoral José Carlos Bonilha, autor da ação contra Temer em 2014, o Ministério Público pedirá a impugnação do peemedebista se ele tentar se candidatar:

— O pagamento da multa não afasta a inelegibilidade. E é preciso ser dito que não depende da vontade dele ser ou não candidato. A inelegibilidade é uma consequência legal, e não cabe a ele ou qualquer aliado decidir sobre isso.

 

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Para Janot, interino tem o direito de exercer plenamente a Presidência

 
04/08/2016
André De Souza

 

Em documento enviado ao Supremo Tribunal Federal, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, defendeu que o presidente interino, Michel Temer, exerça plenamente o cargo enquanto o Senado não julgar definitivamente a presidente afastada, Dilma Rousseff. Temer fundiu alguns ministérios e extinguiu outros, o que foi questionado em processo apresentado pelo PDT.

O partido entrou com uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental alegando que, enquanto interino, Temer não poderia tomar tais medidas. Entre outros pontos, Janot disse que proibir Temer de adotar as ações que julgar necessárias, num ambiente de crise, traria maior instabilidade.

Segundo Janot, o vice e os presidentes de Câmara, Senado e STF, quando substituem o presidente, “atuam no pleno exercício do cargo que ocupam transitoriamente e são investidos de todas as competências outorgadas ao substituído”. Para o procurador, não importa o período em que o presidente será substituído.

O PDT argumenta que, até que o Senado termine o julgamento do impeachment e decida formalmente se afastará definitivamente Dilma do cargo, Temer ainda deve trabalhar como um governante interino. Na ação, o partido fala em “usurpação das funções da Presidência da República pelo vice-presidente em exercício”. O PDT pediu uma liminar para suspender qualquer mudança feita por Temer até o julgamento definitivo do impeachment.

Janot discordou, argumentando que Temer pode, se achar necessário, mudar a estrutura administrativa. Ele destacou que a Constituição não prevê limitação jurídica ao exercício da Presidência por substitutos. Lembrou inclusive que, em 2002, quando assumiu interinamente a Presidência, o então presidente do STF, ministro Marco Aurélio Mello, sancionou a lei que criou a TV Justiça.

Em outro ponto, Janot disse que apenas motivos de “bom senso, responsabilidade, prudência e respeito ao titular”, por parte do substituto, podem limitar o exercício de seus poderes. Para ele, tolher Temer em um ambiente de crise seria pior. “Em situações como a de substituição por instauração de processo por crime de responsabilidade, considerando a duração relativamente longa, de até 180 dias, pode haver situações nas quais medidas profundas sejam necessárias ao vice-presidente no exercício da Presidência. Isso é particularmente verdadeiro em ocasiões de crise política ou econômica, por exemplo”.

Em junho, a Advocacia-Geral da União também tinha defendido os plenos poderes de Temer, em documento enviado ao Supremo Tribunal Federal.

 

O globo, n. 30313, 04/08/2016. País, p. 5