Valor econômico, v. 17, n. 4116, 21/10/2016. Política, p. A5

Planalto faz ofensiva para garantir votações

Primeiro teste será o 2º turno da PEC 241 na Câmara

Por: Raymundo Costa / Thiago Resende / Raphael Di Cunto

 

Sob o argumento de que a agenda do Palácio do Planalto não deve ficar submetida à estratégia de defesa do ex-deputado Eduardo Cunha, preso na quarta-feira, o governo federal desencadeou ontem ampla ofensiva para evitar a paralisação das votações de seu interesse no Congresso. De volta da viagem ao Japão, o presidente Michel Temer estabeleceu como prioridade a aprovação da PEC dos gastos na Câmara, já na próxima semana. O objetivo é alcançar mais que os 366 votos do primeiro turno.

A ideia é mostrar que o governo não está parado por expectativa de denúncia de Cunha. Em conversa com o Valor, um auxiliar próximo de Temer resumiu numa pergunta a ação governista: "Você acha razoável que o governo do Brasil seja conduzido pela estratégia de defesa do Eduardo Cunha"? Em vez de ficar na defensiva, o Palácio do Planalto decidiu partir para a ofensiva, numa ação articulada com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e os presidentes e líderes dos partidos da base aliada.

A paralisia do Congresso seria um sinal de fragilidade do governo. "Não temos nada a ver com Eduardo Cunha, temos a ver com a recuperação econômica do Brasil", disse um auxiliar de Temer, à saída do gabinete presidencial.

Temer chegou do Japão às 11h40 e às 14h já estava no Palácio do Planalto no comando das articulações. O presidente exonerou os ministros com mandato para que possam votar, a exemplo do que aconteceu no primeiro turno. Os líderes partidários ainda não sabem avaliar qual o impacto de uma eventual delação premiada de Cunha (PMDB-RJ), a médio prazo, no ritmo de trabalho da Câmara, mas acham que as votações previstas para esta semana serão realizadas. O governo não trabalha com a hipótese de uma negociação rápida entre Cunha e os procuradores de Curitiba

No momento, a avaliação dos líderes é que a agenda não será afetada pelo peso político do mais novo hóspede do juiz Sergio Moro na carceragem da Polícia Federal em Curitiba. Os governistas asseguram que, na terça-feira, a proposta que cria um teto para as despesas públicas - a PEC 241 - será votada, em segundo turno. O Planalto gostaria de acelerar a tramitação da PEC no Senado, para aprová-la até o fim de novembro, mas já trabalha com a hipótese de a votação só ocorrer no início de dezembro. A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado não abre mãe de discutir e votar a proposta, uma escala que o governo cogitava pular.

Segundo avaliação feita ontem por líderes da base de sustentação, passou o "susto inicial" que a prisão de Cunha provocou e contribuiu para que a Câmara adiasse a votação de outro projeto importante para o governo - aquele que retira a obrigatoriedade de a Petrobras participar da exploração de todos os campos do pré-sal. O assunto volta à pauta na segunda-feira. A expectativa de líderes aliados é que as votações ocorram normalmente na próxima semana. "O sentimento da Casa é que esse fato da prisão do ex-deputado não terá qualquer tipo de obstrução ou qualquer tipo de problema para continuar os trabalhos", disse o líder do DEM, Pauderney Avelino (AM).

Para o líder do PSD, Rogério Rosso (DF), o Judiciário e o Legislativo são poderes independentes e, por isso, a prisão de Eduardo Cunha não pode influenciar as atividades da Câmara. "Delação é uma coisa específica do ex-deputado com o Ministério Público. Só posso falar pela Câmara. Temos a certeza de que estamos diante de uma oportunidade de transformar o país".

No PMDB, o tom também é de cautela. Deputados próximos do presidente nacional do partido, Romero Jucá (RR), dizem que ele irá aguardar a conclusão do processo contra Cunha. Assim, o PMDB não vai tomar qualquer posição e deixar que o ex-presidente da Câmara se defenda, pois a prisão foi apenas preventiva - sem condenação.

O deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) também não acredita que a decisão de Moro irá influenciar o funcionamento da Casa. "Não vamos ficar pensando no que pode acontecer. E, sim, no que temos capacidade de fazer e, no momento, é votar as reformas", declarou Lima, que é irmão do ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima. Sobre eventual delação, ele afirmou: "Se tem preocupação, cada um fica com a sua. Tem que aguardar. E trabalhar". Para o deputado, a Câmara terá que acelerar o ritmo de votações para acabar com comentários sobre a possibilidade de paralisação da Casa.

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que a prisão é um fato triste, mas que não influenciará as votações. "Acredito [que a prisão] não atrapalha as votações, pelo que tenho ouvido dos deputados", disse. A Câmara fará sessão na terça-feira para aprovar em segundo turno a PEC dos gastos e deve aprovar o texto com mais de 360 votos, disse, mostrando compromisso com o ajuste fiscal.

Sobre as ameaças feitas por Cunha nos bastidores, de que o citará em possível delação premiada junto com seu sogro, o secretário-executivo do Programa de Programa de Parceria de Investimentos (PPI), Moreira Franco, o presidente da Câmara disse não estar preocupado com os "recados" de seu ex-aliado. "Não recebi nenhum recado e se quiser dar recado pode dar recado. Não tenho nenhum problema. Minha relação com o deputado Eduardo Cunha foi sempre política", disse. Afirmou, ainda, acreditar que a delação não atingiria Temer. "Não acredito que nenhuma delação do deputado Eduardo possa atingir o presidente da República", comentou.

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Agora a missão é reforçar a blindagem

Por: Maria Cristina Fernandes

 

Um dia após a prisão preventiva do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o presidente Michel Temer reuniu os ministros palacianos, além dos titulares da Justiça, Alexandre de Moraes, e da Fazenda, Henrique Meirelles, para discutir a nova conjuntura política. A preocupação do grupo é o eventual impacto da nova fase da Lava-Jato na votação em segundo turno da proposta de emenda constitucional (PEC) que fixa um teto global para os gastos públicos, agendada para terça-feira.

O clima no Palácio do Planalto é de apreensão, mas também de determinação para não permitir que o episódio comprometa a agenda do ajuste fiscal. Como parte da articulação para garantir a votação da PEC dos gastos, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), combinou com Temer que oferecerá um jantar na residência oficial aos cerca de 400 deputados que integram a base aliada na segunda-feira, para garantir um quórum elevado na votação de terça-feira.

Temer, Meirelles e os ministros do núcleo político comparecerão ao jantar. Do evento promovido no Palácio da Alvorada, por ocasião da votação da PEC dos gastos em primeiro turno, participaram pouco mais de 200 deputados.

Em outra frente, ministros com mandato parlamentar serão exonerados para reforçar a articulação. Ontem o ministro das Cidades, Bruno Araújo, do PSDB de Pernambuco, foi exonerado. "Carga total na PEC 241", disse Araújo ao Valor.

Está previsto que o titular da Educação, Mendonça Filho, do DEM, também seja afastado temporariamente da pasta. No primeiro turno, o ministro do Turismo, Marx Beltrão, do PMDB de Alagoas, também voltou ao plenário para votar.

Temer aterrissou em Brasília ontem às 11h30 e foi recepcionado na base aérea por Rodrigo Maia e pelo ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha. Chegou ao Palácio do Planalto por volta das 14h30 e logo se reuniu com o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, ao qual a Polícia Federal está subordinada. Moraes disse aos jornalistas que o assunto da reunião com Temer era o novo plano nacional de segurança pública, que está em gestação no governo.

Por meio do porta-voz, Alexandre Parola, Temer afirmou que tomou conhecimento da prisão de Cunha quando já estava em voo de regresso do Japão ao Brasil, e esclareceu que a decisão de antecipar em 12 horas o retorno ao Brasil havia sido tomada na noite anterior.

Sobre a detenção do pemedebista, Temer disse, também por meio do porta-voz, que a Operação Lava-Jato é de "alçada da Justiça" e o Executivo jamais interferirá nas investigações, o que significa um "amadurecimento democrático". O presidente espera, ainda, que sejam assegurados todos os "direitos e garantias fundamentais" previstos na Constituição Federal ao acusado.

A "agenda de reconstrução nacional" não se confunde com as investigações promovidas pelo Judiciário, completou Parola. "A agenda de reformas e de modernização econômica, social e política responde a uma urgência do povo, o governo Temer seguirá firme na defesa do crescimento econômico e na recuperação do emprego", completou o porta-voz.