Valor econômico, v. 17, n. 4107, 07/10/2016. Política, p. A8

Texto-base da PEC do gasto passa em comissão da Câmara

Pressão da base faz Darcísio Perondi retirar prorrogação da DRU até 2036 do relatório

Por: Fabio Graner, Thiago Resende e Raphael Di Cunto

 

A Proposta de Emenda Constitucional 241, que limita o crescimento do gasto público pela inflação, foi aprovada ontem pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados. Por pressão da base aliada, o relator, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), retirou o artigo que previa a prorrogação da Desvinculação de Receitas da União (DRU) até 2036, que ele mesmo havia acrescentado ao texto original do governo.

O governo começou a sessão já mostrando força. Na primeira votação do dia venceu por 18 a 3. A oposição se esforçava para obstruir e alongar os trabalhos, criticando a PEC e acusando-a de penalizar a saúde e a educação. No final do dia, o clima esquentou mais, houve bate-boca entre o presidente da comissão, deputado Danilo Forte (PSB-CE), e o líder da oposição na comissão, deputado Henrique Fontana (PT-RS). Professores que acompanhavam a reunião e se manifestavam contra a PEC foram retirados da sala por determinação de Forte. No início da noite, o texto-base foi aprovado por 23 votos a 7.

Em seguida, os destaques começaram a ser examinados e todos foram rejeitados, mesmo os propostos por partidos da base. O primeiro a ser derrubado propunha que o Novo Regime Fiscal valesse apenas até 2018.

O desempenho da base na comissão fortalece o cronograma do governo, que quer votar a matéria em primeiro turno no plenário da Câmara na terça-feira, véspera de feriado. Após a aprovação, Perondi disse não esperar surpresa para a votação no plenário. "Trabalhamos para não ter surpresa".

Confirmando o calendário do plenário, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, chamou de "hipócritas" as propostas de abandonar a criação do limite de despesas e, em troca, elevar a tributação sobre alta renda, defendida pelos partidos de oposição a Michel Temer. "Se fizer isso, os mais ricos saem do país. O capital flutua. Precisamos da PEC do teto. Ela tira do cidadão a responsabilidade do equilíbrio das contas públicas."

Enquanto as discussões transcorriam na comissão, a consultoria de orçamento da Casa divulgou cálculo mostrando que a regra proposta pelo relatório para a área da saúde deve levar o piso de gastos públicos do setor para R$ 113,7 bilhões em 2017. A conta divulgada indica que o crescimento do piso com a regra proposta será perto de R$ 10 bilhões, se comparado com a regra atualmente em vigor.

O valor estimado é maior do que o previsto no Orçamento do ano que vem, de R$ 112,4 bilhões. Nesse caso, isso pode significar a necessidade de cortar gastos em outras áreas, já que o volume obrigatório está maior do que o projetado no Orçamento. É importante lembrar, contudo, que essa conta é feita com base em projeções de receitas, sujeitas a revisões e que, recentemente, a arrecadação voltou a frustrar as projeções da equipe econômica.

O relatório de Perondi fez com que a definição do mínimo a ser gasto na saúde no ano que vem seja calculado considerando 15% da Receita Corrente Líquida (RCL) e não 13,7%, como atualmente a Constituição, por meio da "Emenda 86", determina. Se fosse levada em conta a regra atual, o piso do ano que vem seria de R$ 103,9 bilhões.

A sessão de debates foi longa, com o governo e a oposição se alternando nas falas. "Essa PEC desmonta políticas sociais. É a PEC contra os pobres. Assina a pena de morte do programa Bolsa Família. [...] O mínimo que se deve fazer é discutir com seriedade essa PEC", afirmou o deputado Patrus Ananias (PT-MG).

"Estamos preocupados com a situação do país. Queremos um Brasil melhor que recupere 12 milhões de desempregados", disse o deputado Mauro Pereira (PMDB-RS), autor do requerimento que deu prioridade à PEC na sessão de hoje da comissão.

Alessandro Molon (Rede-RJ) criticou a PEC e disse que ela é inconstitucional. "Essa PEC atenta contra a vida, contra direitos fundamentais", disse Molon, que focou especialmente nos impactos que ele acredita que a medida terá sobre a saúde, questionando a exceção aberta para o ano que vem, que elevou o piso do setor como referência para reajuste apenas a partir de 2018. "Por que exceção só para o ano que vem? Será que é para que em 2018, ano de eleições, a população não sinta seus efeitos", afirmou. "A maldade ficará para os próximos governos", acusou.

O deputado Silvio Torres (PSDB-SP), por sua vez, destacou que a situação da economia brasileira é grave e, se nada for feito, ficará ainda pior. "Caminhamos para situação terminal, se não fizermos nada. É um remédio duro, amargo, mas é o adequado para a economia brasileira", afirmou, destacando que os "remédios de curandeiro" aplicados na economia brasileira não deram certo. Ele também destacou que para reduzir o déficit, o governo optou por uma estratégia de controle de gastos, sem subir impostos.

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Erro em declaração de bens excluirá da repatriação

Por: Raphael Di Cunto e Fabio Graner

 

Vencida na maioria de suas teses em torno das mudanças na chamada Lei da Repatriação, a Receita Federal foi atendida pelo deputado Alexandre Baldy (PTN-GO), relator do projeto, sobre a exclusão automática de pessoas e empresas que fizerem declarações incorretas. O parecer anterior previa que, se fosse detectado erro nas informações, como um imóvel declarado por valor menor, a Receita poderia exigir a retificação, mas sem sequer cobrar multa adicional, o que era visto no governo como um estímulo a fraudes. "A condição da foto [saldo] exclui a possibilidade de o contribuinte errar", disse Baldy.

Depois da violenta reação do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, a tese da "foto", ou seja, a cobrança sobre o saldo no exterior em 31 de dezembro de 2014 (ou dos anos anteriores, caso não haja recurso nesta data), se consolidou. A área econômica queria cobrar sobre todo o recurso expatriado, mesmo que já tivesse sido consumido, o chamado filme, mas não deve pressionar aliados contra a mudança, apesar da avaliação dos técnicos de que isso reduzirá a base de arrecadação. A equipe econômica, contudo, não tem uma conta sobre o volume de perdas que a mudança acarretará.

No Palácio do Planalto, o assunto também era dado como resolvido e o tema pacificado. "O texto deve ficar nos termos propostos por Maia", disse uma fonte. O presidente da Câmara pressionou o governo para que não insistisse na tese do filme. Ao marcar a votação da repatriação para segunda-feira, quando estava previsto o início do exame da PEC dos gastos, Maia deixou claro que ele controla a pauta de votações e pode dar dor de cabeça ao governo.

Diante da força do movimento por mudanças na lei, prevalece o pragmatismo de que é melhor então que o assunto seja resolvido o mais rápido possível, para diminuir a instabilidade e acelerar o fluxo de recursos para o combalido caixa do Tesouro.

Mesmo com o governo tirando a pressão, Baldy se mostrou inclinado a atender um pedido da Receita, com quem se reuniu ontem, para que seja considerado os saldos existentes até o último dia de 2010 e não no final de 2011. A decisão, segundo Baldy, dependia de um parecer da consultoria legislativa, que ainda estava analisando o tema sob a ótica do prazo prescricional. "Queremos atender o direito. Se a Receita tiver direito de cobrar até 31 de dezembro de 2010, vamos incluir no relatório", disse.

Um dos maiores temores do governo, que era postergar ainda mais a data de adesão, foi afastado. O relator confirmou o dia 16 de novembro como limite, que é visto no governo como realmente o último dia para que dê tempo de ajudar os governadores ainda este ano. O temor maior era que uma nova data surgisse, empurrando a adesão mais para frente e inviabilizando a possibilidade os repasses.

A força-tarefa da operação Lava-Jato em Curitiba divulgou nota em que manifesta preocupação com o projeto e "com a possibilidade de serem criadas janelas de impunidade para crimes graves". Um dos pontos é, justamente, a cobrança apenas pelo saldo, o que "expressa a injustiça da proposta em desfavor da sociedade, que foi vítima dos crimes".

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Relator da proposta cria um subteto para a despesa

Por: Ribamar Oliveira

 

O relator da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), tornou a proposta ainda mais rigorosa, ao criar uma espécie de subteto para o gasto da União. A PEC original do governo prevê um limite para a despesa, que será igual à do ano anterior corrigida pela inflação. O substitutivo de Perondi manteve essa regra, mas criou outra, que proíbe a aprovação de crédito suplementar ou adicional ao Orçamento aprovado que aumente a despesa primária.

Assim, mesmo se a despesa do Orçamento aprovado ficar abaixo do gasto do ano anterior corrigido pela inflação, ela não poderá ser aumentada. Os créditos suplementares ou adicionais só poderão ser feitos com o cancelamento de outras despesas.

A proposta orçamentária para 2017, por exemplo, foi enviada ao Congresso Nacional no dia 31 de agosto. Depois disso, o governo elevou sua despesa primária em R$ 541 milhões e deverá utilizar uma parcela da receita que vai obter com a regularização de ativos não declarados mantidos no exterior, a chamada "repatriação", para quitar restos a pagar.

Por isso, a despesa total paga em 2016, corrigida por uma inflação de 7,2%, ficará maior do que aquela que está prevista na proposta orçamentária. Depois de aprovado o Orçamento do próximo ano, a despesa não poderá ser aumentada por meio de crédito suplementar ou adicional, mesmo ficando abaixo do limite total permitido pela emenda constitucional.

A razão para isso é que o gasto total de cada ano será definido tendo em vista a meta de resultado primário e a estimativa de receita da União. E não apenas pelo limite máximo da despesa definido pela emenda. Ou seja, o limite total não necessariamente será todo utilizado. O dispositivo colocado por Perondi na PEC evita que os parlamentares ou o próprio governo aumentem a despesa orçamentária de uma forma que seja incompatível com o limite financeiro e com a meta fiscal do ano.

Em 2016, a despesa deverá aumentar porque o governo decidiu quitar uma parcela adicional de restos a pagar com uma receita extraordinária - a da repatriação - que não irá se repetir no próximo ano. Se o governo elevar o gasto de 2017 por causa disso, ele terá que arrumar outra receita extraordinária ou comprometer a meta de resultado primário. Por isso, a área econômica decidiu que não vai aumentar a despesa prevista na proposta orçamentária, de acordo com fontes do governo.

A criação dessa "trava adicional" pelo relator agradou a área econômica, que viu no mecanismo uma forma de reduzir os chamados restos a pagar - aquelas despesas que são jogadas para serem quitadas nos exercícios seguintes. Ao longo dos últimos anos, o governo acumulou uma montanha de restos a pagar, que representam dívidas do governo com o setor privado. Eles são despesas que ainda não foram pagas de serviços e obras realizadas, em andamento ou que já foram autorizados.

As regras de Perondi criam, no entanto, alguns problemas. A aplicação mínima de recursos na área de saúde em 2017 ficou em 15% da Receita Corrente Líquida (RCL) da União, de acordo com o substitutivo do relator. O governo estimou a RCL do próximo ano em R$ 758 bilhões. Se ela ficar acima desse valor, o governo terá que aplicar mais recursos. Neste caso, ele não poderá solicitar a aprovação de um crédito suplementar ao Orçamento, pois a PEC vetou esse mecanismo. Terá que cortar outras despesas para acomodar a elevação dos gastos com saúde, mesmo tendo limite ainda disponível.

Mesmo que a decisão do governo seja de não incluir no Orçamento de 2017 todo o limite disponível da despesa, por causa da excepcionalidade de 2016, a questão voltará a ser debatida quando a proposta orçamentária de 2018 for enviada ao Congresso. Isto porque o gasto daquele ano será dado pelo limite de 2017 corrigido pela inflação. Se todo o limite de despesa for incorporado ao Orçamento de 2018, o gasto dará um salto. O governo poderá, novamente, elaborar uma proposta orçamentária que defina um gasto menor do que o permitido pelo limite total.

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Deputado petista deve relatar reforma política

Por: Raphael Di Cunto

 

O deputado Vicente Cândido (PT-SP) é o favorito para relatar a reforma política na Câmara dos Deputados. A escolha do petista, apurou o Valor, faz parte do acordo do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), com facção da esquerda para, em troca dos votos para comandar a Câmara, dar espaço para a oposição relatar projetos que não fossem de interesse direto do governo.

Com a escolha, Maia também facilita a discussão do projeto com a oposição. Vicente Cândido é um dos principais líderes da corrente majoritária do PT, a Construindo um Novo Brasil (CNB), e participou na linha de frente das conversas com o DEM para eleger Maia presidente da Câmara e derrotar o centrão, aliado do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Maia vai instalar nos próximos dias uma comissão especial para deliberar sobre o tema. O Senado ficou de votar no dia 9 de novembro proposta de emenda à Constituição (PEC) para instituir uma cláusula de barreira, que reduza o número de partidos políticos, e o fim das coligações proporcionais - feitas para a eleição para a Câmara dos Deputados, dos Vereadores e assembleias.

Já a Câmara tratará, em um primeiro momento, do financiamento de campanhas e do sistema eleitoral, assuntos que podem ser deliberados por lei ordinária. Antes rejeitado pela maioria dos partidos - era uma bandeira especialmente do PT-, o voto em lista ganha adesão entre partidos. Lideranças do DEM já começam a defender a proposta, que tem apoios até no PSDB.

Nesse modelo, o eleitor vota num partido, que apresenta uma lista de seus candidatos. As vagas obtidas pela legenda são ocupadas pelos primeiros da lista - o que, dizem os críticos, costuma favorecer os dirigentes ou "donos" dos partidos. Em alguns formatos, há a possibilidade de, além de votar na sigla, é escolhido também um candidato no partido, e os mais votados encabeçam a lista.

"Assim como na última tentativa de reforma política ganhou corpo o distritão [onde os mais votados são eleitos], nessa ganha corpo o voto em lista partidária", disse o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), que acompanhou Cândido em reunião com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para discutir o projeto. "O voto em lista exigirá mudar também a Lei dos Partidos para garantir mais democracia interna, para não ficar um jogo marcado", destacou.

No campo do financiamento eleitoral está a discussão sobre aumentar os recursos públicos destinados à disputa. A maioria dos partidos que participou de reunião na presidência da Câmara na quarta-feira, de PSDB a PT, defendeu que não há como voltar as doações de empresas.

O presidente licenciado do PSD e ministro das Comunicações, Gilberto Kassab, sugeriu que seja criado um fundo a cada dois anos com quatro vezes o valor do fundo partidário - que em 2016 alcançou R$ 861 milhões. O fundo eleitoral seria, portanto, em torno de R$ 3,4 bilhões. "A gente precisa ter transparência e coerência de saber que, sem o financiamento privado, vamos precisar aumentar os recursos", afirmou o líder do PSD na Câmara, Rogério Rosso (DF).