Valor econômico, v. 17, n. 4138, 24/11/2016. Política, p. A12

Partidos tentam usar medidas contra corrupção para delimitar a Lava-Jato

O relator Onyx Lorenzoni: inclusão de pontos que dificultam investigações

Por: Raphael Di Cunto

 

Partidos governistas e de oposição acertaram ontem acordo com o objetivo de aproveitar as "10 Medidas Contra a Corrupção" para aprovar três ações para interferir nas investigações da Operação Lava-Jato e promover uma ofensiva contra Judiciário e Ministério Público (MP): um prazo de apenas um ano para conclusão de inquéritos contra políticos com mandato, a anistia ao caixa dois eleitoral e a possibilidade de processar magistrados e promotores por crime de responsabilidade.

As duas últimas propostas entrariam como emendas no plenário. Já a limitação ao prazo de inquéritos foi incluída pelo próprio relator do projeto, deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), para impedir que investigações contra agentes políticos (detentores de mandato eletivo, ministros de Estado e secretários estaduais) se arrastassem por vários anos.

O texto era tratado nos bastidores como uma contrapartida à exclusão da responsabilidade de juízes e promotores. Integrantes do MP, que propôs as dez medidas com apoio de 2 milhões de assinaturas, reclamaram que o prazo de seis meses, prorrogável por apenas seis, era impraticável para casos mais complexos.

A proposta foi sugerida pelo deputado Esperidião Amin (PP-SC), cujo partido tem 38 deputados investigados desde março de 2015 no Supremo Tribunal Federal (STF) por suposta participação no esquema de corrupção na Petrobras. Para ele, as investigações que se arrastam por anos fragilizam a democracia. "Quem é culpado quer mesmo é que o inquérito demore. Quem é inocente não pode passar metade do mandato sob suspeita", afirmou.

Deputados, contudo, protestaram contra a medida. Rubens Pereira (PCdoB-MA) lembrou que o Código de Processo Penal (CPP) prevê a aplicação imediata. "A consequência direta é o arquivamento de todos os inquéritos com mais de um ano", disse. Carlos Sampaio (PSDB-SP) afirmou que isso levaria ao arquivamento de 50 inquéritos da Lava-Jato se as denúncias não ocorrerem até a publicação da lei. Onyx disse que essa não era a intenção e que, como a redação estava falha, o assunto será discutida pela comissão de reforma do CPP.

Em uma cena pouco comum, a Câmara parou ontem à espera do relatório de Onyx no mesmo dia em que circularam informações de que a Odebrecht concluía sua delação premiada e ameaçava entregar mais de 150 políticos, entre deputados, senadores, e ministros. A comissão que discute o projeto ficou suspensa por três horas aguardando o parecer final, mas, mesmo com quórum elevado e projeto de interesse do governo em pauta, a sessão de plenário não ocorreu.

O presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acertou em almoço com os líderes partidários que o projeto seria votado ainda na noite de ontem, logo após a comissão votar o parecer, em sessão que deveria avançar madrugada adentro. A pressa tinha um objetivo: evitar que os políticos atingidos pela delação de grandes empresas fossem sequer acusados de caixa dois.

A emenda acertada entre líderes de todos os partidos pretendia explicitar na legislação que não sofrerão punições criminais, eleitorais e cíveis aqueles que receberam doações, contabilizadas ou não, de valores, serviços e bens para atividades eleitorais e partidárias realizadas até a data da entrada em vigor do projeto.

O texto seria assinado por todos os partidos em uma emenda que seria aprovada em plenário por votação simbólica, para evitar que os deputados tivessem que colocar seus nomes a favor da anistia. Parte da bancada do PT, contudo, se insurgiu e soltou uma nota dizendo que não concordava com a manobra. Sem o aval dos petistas, partidos como PSDB e DEM recuaram e não havia mais certeza da votação na noite de ontem. Rede e Psol também não concordavam.

Após pressão dos partidos, a punição para o crime de caixa dois eleitoral, que será tipificado com o projeto, será reduzida. A proposta do MP era prisão de dois a cinco anos, com pena agravada entre um e dois terços se houver ato lesivo ao patrimônio público em troca da doação. O agravante foi reduzido para um terço. A multa para os partidos também caiu, de 10% a 40% do fundo partidário para 5% a 20%.

Essa mudança ocorreu após acordo dos partidos com o relator para "enxugar" o parecer. Das oito inovações que Onyx tinha incluído, como executar a prisão após condenação em segunda instância, sobraram apenas duas: o "reportante do bem", uma promessa do relator para entidades de combate à corrupção, e o acordo penal, que permite a acusados admitir a culpa e negociar, mediante reparação do dano e agilizando o processo judicial, ficar em prisão domiciliar.

O parecer, com 100 artigos, ainda não tinha sido votado na comissão até o fechamento desta edição.