Valor econômico, v. 17, n. 4136, 22/11/2016. Brasil, p. A6

Temer manda dizer que Geddel fica no governo

Permanência de ministro na equipe, contudo, corre risco caso surjam fatos novos na Bahia

Por: Andrea Jubé e Bruno Peres

 

O presidente Michel Temer fez ontem gestos ostensivos para mostrar que está empenhado em manter o ministro Geddel Vieira Lima no comando da Secretaria de Governo, responsável pela interlocução com o Congresso Nacional. Acionou o porta-voz da Presidência para anunciar, formalmente, que Geddel continuará no cargo. E levou o ministro, que protagoniza uma crise no primeiro escalão, para o almoço no Palácio da Alvorada com os integrantes do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o Conselhão.

Hoje Geddel comanda reunião com líderes para discutir as votações na Câmara. Nos bastidores, contudo, o clima no Palácio do Planalto é de apreensão, porque a vida do ministro está sendo revirada do avesso na Bahia, onde ele mantém sua base política. Se surgirem fatos novos comprometedores, sua permanência não estaria mais garantida.

Em novo capítulo da crise, ontem a Comissão de Ética Pública da Presidência da República decidiu, à unanimidade, abrir processo para investigar a conduta do ministro, acusado de abuso de autoridade e tráfico de influência pelo ex-ministro da Cultura Marcelo Calero.

Além disso, causaram mal estar no palácio as declarações do secretário-executivo do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), Moreira Franco, em Paris, de que Temer estaria "muito preocupado" com o escândalo envolvendo Geddel. Para auxiliares presidenciais, soou como se Moreira quisesse o lugar do aliado. Horas depois, Geddel informava que Moreira havia lhe telefonado para esclarecer as afirmações e desfazer o mal entendido.

A avaliação no Palácio do Planalto é de que o episódio gera "desconforto", mas ainda insuficiente para obrigar Michel Temer a se desfazer de um de seus braços-direitos, sobretudo numa etapa de votações decisivas para o governo no Congresso Nacional. A leitura é de que existe um "conflito de versões", em que um ex-auxiliar acusa um ministro de sua máxima confiança sem provas abalizadas de todas as alegações. A expectativa é de que a decisão da Comissão de Ética sobre o episódio resulte, no máximo, numa "repreensão" ao ministro, e não passe disso.

Contudo, duas fontes credenciadas do palácio ressalvam que se surgirem fatos novos que comprometam o ministro, sua permanência no cargo pode se tornar insustentável. Neste caso, Temer já teria o discurso pronto, que tem apresentado em entrevistas, como a recente concedida ao programa "Roda Viva". O argumento é de que ele não demite ministros, eles "deixam o governo por conta própria", ao sentirem que sua permanência atrapalha mais do que ajuda o presidente.

Ontem Temer manifestou-se pela primeira vez sobre o escândalo. Por meio do porta-voz, Alexandre Parola, também assegurou a autonomia das decisões do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), pivô da crise. "Todas as decisões sob responsabilidade do Ministério da Cultura são e serão encaminhadas com critérios técnicos, e respeitados todos os marcos legais", disse o porta-voz, citando especificamente o episódio de Salvador.

O prazo para Geddel apresentar sua defesa à Comissão de Ética será de dez dias. A próxima reunião ocorre no dia 14 de dezembro. O presidente da comissão, Mauro Menezes, relatou que Geddel o procurou para se colocar à disposição do colegiado para esclarecer o episódio envolvendo Marcelo Calero.

Na sexta-feira, Marcelo Calero, que deixou o cargo acusando Geddel de ingerência política e tráfico de influência na pasta ao pressionar pela liberação de um empreendimento imobiliário em Salvador, na Bahia, onde possui um apartamento.

Em entrevista no sábado, Calero classificou como "claramente um caso de corrupção" a pressão que diz ter sofrido do titular da Secretaria de Governo para liberar um empreendimento imobiliário em área tombada de Salvador. O caso foi revelado em entrevista do ministro à "Folha de S. Paulo". Geddel, por sua vez, contesta as acusações do ex-colega e afirmou que houve apenas uma conversa sobre o empreendimento e não uma pressão para que o Iphan liberasse a construção.

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Escândalo divide base do governo no Congresso; oposição recorre à PGR

Por: Fabio Murakawa, Vandson Lima e Raphael Di Cunto

 

O escândalo envolvendo o ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, dividiu a base do presidente Michel Temer no Congresso Nacional. Líder do governo no Congresso, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) minimizou o episódio como "fato pontual". E, enquanto o líder do governo na Câmara, André Moura (PSC-SE), dava a questão como "superada", senadores aliados, como Ana Amélia (PP-RS) e Cristovam Buarque (PPS-DF), iam à tribuna pedir a cabeça de Geddel.

Reunidos ontem à tarde no Senado, políticos tucanos se esquivaram de opinar sobre a situação do ministro. Ao mesmo tempo, parlamentares de oposição protocolavam na Procuradoria-Geral da República (PGR) uma representação pedindo o afastamento de Geddel e a investigação sobre possíveis crimes cometidos por ele.

Jucá elogiou a atuação de Geddel, dizendo que ele "presta um grande serviço ao país". E disse ter conversado com o ministro, que manifestou o desejo de ser julgado "rapidamente". "Interessa ao ministro Geddel e ao governo que seja esclarecido", afirmou. "É um fato pontual que não deve, de forma nenhuma, atrapalhar o funcionamento do governo. [...] Não causa fragilidade na base", disse.

Já o líder na Câmara disse que Geddel recebeu solidariedade de vários deputados e líderes de partidos como PP e PSD ao longo do dia. "Para nós é questão superada. O ministro já deu as explicações cabíveis e necessárias para não restar nenhuma dúvida", disse Moura.

Senadores do PSDB e o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, também tucano, evitaram opinar sobre a conveniência da demissão de Geddel - acusado pelo ex-ministro da Cultura, Marcelo Calero, de pressionar o Instituto do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural (Iphan) a autorizar a construção de um edifício onde ele teria um apartamento. Mas, também para os tucanos, isso não prejudica votações importantes, como a da PEC do teto de gastos. "Não traz prejuízo. Existe hoje uma maioria absolutamente consolidada, não apenas no Senado, como na sociedade brasileira, que entende que é preciso conter essa tendência avassaladora de gastos no governo federal", disse o líder do governo, Aloysio Nunes (PSDB-SP).

Aloysio elogiou Geddel, dizendo que ele "trata muito bem da articulação política". "Sou testemunha disso porque convivo diariamente com ele e exerce essa função com maestria. Ele já deu explicações na imprensa e o caso está agora submetido à comissão de ética. Vamos aguardar", concluiu.

Na mesma linha, o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), disse que esse "é um assunto que diz respeito ao Poder Executivo". Aécio recebeu, à tarde, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, em seu gabinete, também questionado por jornalistas. "Não cabe a mim comentar essa questão de outro ministro", disse Moraes.

Mas Ana Amélia e Cristovam Buarque destoaram dos colegas de base e pediram a saída de Geddel. "A denúncia é grave e lamentável. Presidente não pode ter amigos. Tudo tem que ter um limite e uma responsabilidade", disse Ana Amélia. "Esse assunto do Geddel atrapalha muito, porque ameaça a credibilidade do governo", disse Cristovam, na tribuna do Senado. Mas Ana Amélia e Cristovam Buarque destoaram dos colegas de base e pediram a saída de Geddel. "A denúncia é grave e lamentável. Presidente não pode ter amigos. Tudo tem que ter um limite e uma responsabilidade", disse Ana Amélia. "Esse assunto do Geddel atrapalha muito, porque ameaça a credibilidade do governo", disse Cristovam, na tribuna do Senado.