CHEIO DE GRAÇA - Crivella é festejado pela Garota de Ipanema

Fernanda Krakovics

01/11/2016

 

 

A eterna Garota de Ipanema, Helô Pinheiro, ficou satisfeita com a vitória de Marcelo Crivella (PRB) no bairro que a consagrou na canção de Vinicius de Moraes e Tom Jobim. Ipanema foi o único bairro da Zona Sul onde o prefeito eleito teve mais votos do que Marcelo Freixo (PSOL). O placar foi 52% a 47,8%.

— Ipanema foi palco de uma grande e merecida vitória de Crivella. Desejo que Deus o ilumine e que o Rio continue sendo a Cidade Maravilhosa — afirmou, por e-mail, Helô, que atualmente se divide entre Rio e São Paulo.

Ela disse que se sentiu “lisonjeada” ao ser convidada pelo candidato do PRB para um encontro com artistas com o objetivo de discutir propostas culturais para a cidade. Segundo Helô, Crivella fez várias reuniões como essa.

— Sendo Ipanema um reduto cultural, isso pode ter alavancado um maior número de votos — avaliou Helô.

O entusiasmo da Garota de Ipanema, porém, não é compartilhado por outras personalidades do bairro. Carlos Alberto Afonso, dono da Toca do Vinicius, livraria e loja de discos, disse que votou em Freixo, mas não se surpreendeu com a vantagem de Crivella na sua vizinhança. Para ele, o “voto administrativo”, visando a benefícios e investimentos, prevaleceu sobre o “voto cabeça”, ideológico.

— O meu contato pessoal com os vizinhos é rico, diversificado e ótimo. Preservamos nossas amizades respeitando o direito de o outro escolher e votar. Entretanto, em meu círculo mais próximo, identifico, como predominante, o voto pessoal e administrativo e o voto conservador — disse Carlos Alberto. Para moradores do bairro, a aliança de Crivella com Carlos Osorio (PSDB) e Indio da Costa (PSD), bem votados em Ipanema no primeiro turno, pode ter influenciado o resultado.

Um dos fundadores do bloco de carnaval Que Merda é Essa, Floriano Torres promete que a agremiação será um núcleo de resistência, bem-humorado, claro, a Crivella no bairro:

— Vamos fazer uma homenagem a ele no ano que vem. Vai ser ótimo, teremos um bom enredo.

Moradora de Ipanema, Beatriz Oliveira, de 44 anos, disse que votou em Crivella para tentar impedir a vitória de Freixo:

— Não gosto da esquerda. Fui a todas as manifestações do “Fora, Dilma”, do impeachment, sou a favor da Lava-Jato. Eu poderia até votar nulo, mas preferi não arriscar. Não acho que nenhum dos dois são bons, mas votei por coerência.

Ipanema foi o local da cidade com maior percentual de votos brancos e nulos: 24,2%. No município como um todo, esse índice foi de 20%.

Susana Mendes, de 69 anos, foi uma das que anulou o voto em Ipanema. Ela disse que não gostava dos candidatos, mas chegou a pensar em votar em Freixo:

— Eu votei no Brizola e me ferrei, no Lula e me ferrei. Pensei: não vou me ferrar de novo com quase 70 anos.

Já Victor Eduardo Cavalli, que trabalha numa loja de bicicletas na Rua Vinicius de Moraes, disse que votou em branco, o que acabou beneficiando o candidato do PRB:

— Meu candidato era o Osorio. Eu ia votar no Crivella (no segundo turno), mas acabei votando em branco. Eu sabia que o Crivella ia ser o mais votado.

Além dos brancos e nulos, o percentual de abstenção em Ipanema, 35%, também superou a média da cidade, de 26,85%.

Apesar de, desde os 70 anos, não serem mais obrigados a votar, Hugo, de 86, e sua mulher, Regina, de 76, disseram que essa eleição foi a primeira de que preferiram não participar. O casal também não votou no primeiro turno. Médicos aposentados, eles não quiseram dizer o sobrenome.

— Foi por causa das opções (de candidatos) — explicou Regina.

O grande percentual de brancos, nulos e abstenções foi destacado por Claudio Pinheiro, um dos fundadores da Banda de Ipanema:

— Houve um somatório: desencanto com os movimentos populares, os acontecimentos recentes, um descrédito grande. O não voto bateu todos os recordes. Não quero desmerecer a vitória de ninguém, mas a eleição foi decidida por um eleitorado menor.

 

“Não gosto da esquerda. Fui a todas as manifestações do ‘Fora, Dilma’. Poderia até votar nulo, mas preferi não arriscar”

Beatriz Oliveira

Moradora de Ipanema

 

 

O globo, n. 30402, 01/11/2016. País, p. 07.