O Estado de São Paulo, n. 44965, 26/11/2016. Política, p.A4

 

Geddel sai, e Temer agora busca novo articulador

Eliane Cantanhêde, Tânia Monteiro, Carla Araújo e Vera Rosa

 

 

Executivo. Após ministro-chefe da Secretaria de Governo deixar o cargo, presidente nega pressão sobre Calero e diz que substituto será alguém que ‘não esteja metido em nada'. 

O ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, entregou ontem a sua carta de demissão menos de 24 horas após a divulgação do depoimento do ex-ministro da Cultura Marcelo Calero que acusa o presidente Michel Temer de “enquadrá-lo”. A saída de um de seus aliados mais próximos foi a forma encontrada pelo presidente de reduzir o desgaste com o caso, que envolve a autorização para construir um arranhacéu em área de patrimônio histórico em Salvador.

Geddel é o sexto ministro a deixar o cargo em seis meses de governo Temer. O presidente está agora às voltas com a escolha de um novo nome para substituir o aliado, que ocupava uma função chave, a de articulação política com o Congresso, justamente num momento em que o Planalto precisa aprovar a PEC do Teto de Gastos, espinha dorsal da política econômica, e está às vésperas de encaminhar a reforma da Previdência.

“Tem de ser alguém que não esteja metido com nada de nada”, disse ao Estado, num tom próximo à ironia. A opinião do presidente, porém, é de que a saída de Geddel e o envolvimento do seu nome por Calero não irão afetar negativamente as votações no Congresso: “Efeito zero”.

O presidente também lamentou que o que chama de “um episódio menor” tenha gerado tanta tensão política. “Ora vejam, quem me conhece sabe que eu não sou de sair ‘enquadrando’ ninguém. O que eu falei a ele foram coisas absolutamente normais”, disse Temer. “Não sei por que esse rapaz (Calero) reagiu dessa forma.”

Calero disse à polícia ter sido pressionado por Geddel, Temer e também pelo ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, para que o Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (Iphan) alterasse um parecer que embargou a obra do empreendimento imobiliário La Vue na Ladeira da Barra, na capital baiana, onde o agora ex-chefe da Secretaria de Governo disse ter comprado um apartamento.

Temer confirma a versão de Calero sobre as conversas que teve antes do pedido de demissão e diz que, de fato, recomendou que o ex-ministro procurasse a Advocacia Geral da União (AGU). Só rebate que tenha tido “algum tipo de enquadramento”.

O presidente afirmou ainda haver “fortes rumores” de que Calero tenha gravado as conversas, mas disse que não recebeu confirmação. “Se eu perguntar para a Polícia Federal, já vão dizer que é pressão. Veja como são as coisas.” Ele afirmou, porém, torcer para que as conversas tenham sido gravadas “para comprovar que não houve nada demais, foram conversas normais.” Sobre a possibilidade de oposição entrar com um pedido de impeachment, disse considerar “absolutamente normal”: “Eles estão no papel deles”.

Abafa. Ao longo da semana, Geddel tentou abafar a crise e deixou Brasília na quarta-feira à noite, enquanto cresciam denúncias contra ele, inclusive relacionadas a iminente delação de executivos da Odebrecht.

Em sua carta de demissão, enviada por e-mail, ele pede desculpas. “Diante da dimensão das interpretações dadas, peço desculpas aos que estão sendo por elas alcançados, mas o Brasil é maior do que tudo isso.” 

PARA LEMBRAR

Saldo em seis meses 

- Romero Jucá

O senador deixa o Ministério do Planejamento em 23 de maio, após divulgação de conversas dele com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado.

- Fabiano Silveira

Uma semana depois, o titular da Transparência se demite após divulgação de conversa com Machado sobre estratégia de defesa de Renan Calheiros na Lava Jato.

- Henrique Eduardo Alves

Em 18 de junho, o então ministro do Turismo cai após informação de que contas secretas do peemedebista no exterior haviam sido identificadas. 

- Fábio Medina

Em 9 de setembro, o então advogado- geral da União é demitido e atribui a exoneração à suposta insatisfação do Planalto com medidas da AGU contra políticos investigados na Lava Jato, entre eles parlamentares da base de Michel Temer. 

- Marcelo Calero

Em 18 de novembro, pede demissão da Cultura alegando pressão de Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) para aprovar obras de empreendimento em Salvador. 

-Geddel Vieira Lima

Uma semana depois, após ter apoio de Temer e de líderes da base, Geddel pede demissão ao presidente.