O Estado de São Paulo, n. 44968, 29/11/2016. Política, p. A6

Moro veta questões de Cunha que ligam Temer a ex-diretor

 

Mateus Coutinho
Julia Affonso
Ricardo Brandt
Fausto Macedo

 

O juiz Sérgio Moro vetou mais da metade das 41 perguntas da defesa do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB) ao presidente Michel Temer, arrolado como testemunha de defesa em um dos processos a que o peemedebista responde. Das 21 perguntas retiradas pelo juiz, 13 foram consideradas “inapropriadas” pelo magistrado.

Entre as questões indeferidas, Cunha questiona se Temer sabia de pedido de propina ao ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró por deputados do PMDB. “Vossa Excelência foi comunicada pelo sr. Nestor Cerveró sobre uma suposta proposta financeira feita a ele para sua manutenção no cargo?” A questão faz referência a depoimentos de Cerveró nos quais ele relatou ter deixado o cargo na estatal, em 2008, por pressão do PMDB da Câmara.

Na época, segundo Cerveró, os deputados pressionavam o governo para indicar o diretor da Área Internacional da Petrobrás em troca de votos favoráveis à manutenção da CPMF.

Cerveró acrescentou que os políticos teriam exigido o pagamento mensal de US$ 700 mil para apoiar a sua permanência no cargo, mas que não aceitou.

Temer era deputado federal na mesma época.

Em outra pergunta, a defesa de Cunha questiona sobre reuniões de Temer com Cerveró. O encontro, em 2007, já foi relatado por outros delatores e, na ocasião, a assessoria de Temer confirmou ao Estado que o peemedebista se encontrou com o ex-diretor quando estava sendo discutida a substituição do executivo na Diretoria Internacional da Petrobrás – apontada como cota do PMDB na estatal.

O peemedebista alega que disse a Cerveró, no encontro, que “não poderia fazer nada”. Ainda segundo Temer, já havia uma indicação do então presidente do PMDB de Minas Fernando Diniz – morto em 2009 – para nomear Jorge Zelada para o cargo.

Temer, ainda por meio de sua assessoria, disse que na época não havia nenhuma denúncia ou suspeita de irregularidade envolvendo Cerveró.

 

‘Recado’. A tentativa de envolver o presidente no caso, vista como um “recado” do deputado cassado por pessoas ligadas às investigações, foi vetada por Moro sob o argumento de que “não há qualquer notícia do envolvimento do presidente nos crimes que constituem objeto desta ação penal”.

Uma das preocupações do juiz da Lava Jato é a citação a autoridades com prerrogativa de foro privilegiado – caso do presidente da República. A menção a pessoas nessas condições em processo de primeiro grau judicial pode levar à anulação do caso ou provocar o deslocamento dos autos.

Além disso, Moro entendeu que parte das perguntas não tinha “pertinência” com a ação penal na qual Cunha é réu em Curitiba.

Na ação penal, o ex-presidente da Câmara é acusado pela Procuradoria da República de ter recebido, entre 2010 e 2011, propinas relacionadas à aquisição, pela Petrobrás, de um campo de petróleo em Benin. O deputado cassado é acusado de corrupção, lavagem de dinheiro e evasão fraudulenta de divisas pela manutenção de contas secretas na Suíça que teriam recebido propina do esquema na Petrobrás.

A ação já havia sido aberta pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em junho, mas foi enviada a Moro após a cassação do mandato de Cunha.

Procurado ontem para comentar o indeferimento das perguntas por Moro, a defesa de Cunha não foi localizada pela reportagem.

 

Bens da ex-primeira-dama

A 7ª Vara Federal Criminal do Rio bloqueou ontem imóveis em nome da mulher do ex-governador Sérgio Cabral, Adriana Ancelmo, e de seu escritório de advocacia.

 

AS 21 PERGUNTAS BARRADAS

1. No início de 2007, no segundo governo do sr. Luiz Inácio Lula da Silva, houve um movimento na bancada de deputados federais do PMDB visando a sua pacificação e isso incluiu a junção dos grupos antagônicos. Vossa excelência tem conhecimento se isso incluiu o apoio ao candidato do PT à presidência da Câmara com o compromisso de apoiá-lo como candidato no segundo biênio em 2009?

 

2. Vossa Excelência tem conhecimento de acordo para o então líder da bancada, sr. Wilson Santiago, concorrer à Primeira-Secretaria e o sr. Henrique Alves assumir a liderança?

 

3. Vossa Excelência tem conhecimento da nomeação do sr. Geddel Vieira de Lima para o Ministério da Integração Nacional, do sr. Reinhold Stephanes para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do sr. José Gomes Temporão para o Ministério da Saúde?

 

4. Vossa Excelência indicou o nome do sr. Wellington Moreira Franco para a Vice-Presidência do Fundos de Governo e Loterias da Caixa Econômica Federal?

 

5. Vossa Excelência tem conhecimento se na coordenação do Centro-Oeste, coordenada pelo sr. Tadeu Filippelli, couberam as indicações do vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa Econômica Federal e da vice-presidência de Governo do Banco do Brasil?

 

6. Vossa Excelência foi comunicada pelo sr. Nestor Cerveró sobre uma suposta proposta financeira feita a ele para sua manutenção no cargo?

 

7. Caso Vossa Excelência tenha sido comunicada pelo sr. Nestor Cerveró, quem teria feito a proposta e qual foi a vossa reação? Por que não denunciou?

 

8. Quantas vezes Vossa Excelência esteve com o sr. Jorge Zelada?

 

9. Vossa Excelência recebeu o  sr. Jorge Zelada alguma vez na sua residência em São Paulo?

 

10. Caso Vossa Excelência o tenha recebido, quais foram os assuntos tratados?

 

11. Vossa Excelência recebeu alguém para tratar de algum assunto referente à área internacional da Petrobrás?

 

12. Vossa Excelência encaminhou alguém para ser recebido pelo sr. Jorge Zelada na Petrobrás?

 

13. Vossa Excelência encaminhou algum assunto para ser tratado pela Diretoria Internacional da Petrobrás?

 

14. Vossa Excelência tem conhecimento sobre a negociação da Petrobrás para um campo de petróleo em Benin, na costa oeste da África?

 

15. Vossa Excelência conhece o sr. João Augusto Henriques?

 

16. Caso Vossa Excelência conheça, quantas vezes esteve com ele e sobre quais assuntos trataram?

 

17. Vossa Excelência sabe de alguma contribuição de campanha que tenha vindo de algum fornecedor da área internacional da Petrobrás?

 

18. Vossa Excelência tem conhecimento se houve alguma reunião sua com fornecedores da área internacional da Petrobrás com vistas à doação de campanha para as eleições de 2010, no seu escritório político em São Paulo, juntamente com o sr.

João Augusto Henriques?

 

19. Qual a relação de Vossa Excelência com o sr. José Yunes?

 

20. O sr. José Yunes recebeu alguma contribuição de campanha para alguma eleição de Vossa Excelência ou do PMDB? 21. Caso Vossa Excelência tenha recebido, as contribuições foram realizadas de forma oficial ou não declarada?

 

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O Estado de São Paulo, n. 44968, 29/11/2016. Política, p. A6

Ex e atual governador do Tocantins são alvo de ação da PF

 

O governador do Tocantins, Marcelo Miranda (PMDB), e o ex-governador Siqueira Campos (PSDB) foram alvo de condução coercitiva – quando o investigado é levado para depor e liberado – no âmbito da Operação Reis do Gado, deflagrada ontem pela Polícia Federal. A operação investiga um esquema que teria atuado na administração pública do Tocantins e lavado cerca de R$ 200 milhões.

De acordo com a PF, a lavagem de capitais era realizada por meio da dissimulação e ocultação dos lucros ilícitos no patrimônio de membros da família do governador do Estado. Contra Miranda, ainda foram cumpridos mandados de busca e apreensão. Também foi decretada a prisão temporária do secretário estadual de Infraestrutura, Sérgio Leão.

A investigação descobriu que uma das fazendas da família do governador, avaliada em R$ 40 milhões, foi registrada por R$ 20 mil. O delegado regional de combate ao crime organizado, Cleyber Malta, da PF, afirmou que R$ 200 milhões em patrimônio financeiro e de bens da família de Miranda estiveram em nome de terceiros, entre 2005 e 2012. Segundo o delegado, ao final do período, parte dos valores teria voltado para a família, “saindo do nome dos laranjas”.

A família do governador Miranda chegou a ter 30 mil cabeças de gado, segundo a investigação.

“O gado entra como uma forma de lastro financeiro para subsidiar essa lavagem”, destacou Malta.

Os investigados na Reis do Gado responderão pelos crimes de lavagem de dinheiro, peculato, corrupção passiva, fraudes à licitação e organização criminosa.

O nome da operação foi dado em razão de os principais investigados serem grandes pecuaristas no Pará e o gado era a destinação de grande parte do dinheiro desviado. Ao todo foram 108 mandados judiciais expedidos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) – oito de prisão temporária, 24 de condução coercitiva e 76 de busca e apreensão nas cidades de Palmas e Araguaína, no Tocantins, Goiânia, Brasília, Caraguatatuba (SP) e Canaã dos Carajás, Redenção, Santa Maria, São Felix do Xingu e Sapucaia, no Pará.

 

Defesas. A Secretaria Estadual da Comunicação do Tocantins divulgou nota dizendo que o governador Marcelo Miranda “se apresentou espontaneamente à Justiça Federal para prestar esclarecimentos a respeito das investigações” e “facilitou o livre acesso às dependências da sua residência e do Palácio Araguaia, a fim de contribuir com a ação”.

O texto afirmou também que, “até o momento, tanto a Procuradoria-Geral do Estado quanto o escritório de advocacia, que representa Marcelo Miranda, não tiveram acesso à decisão da Justiça”.

A assessoria de Siqueira Campos afirmou que o ex-governador prestou depoimento na condição de testemunha. Em nota, a assessoria disse que Campos “não é investigado na Operação Reis do Gado e reitera prosseguir à disposição da Justiça e da Polícia Federal para prestar qualquer esclarecimento sempre que for solicitado”.

 

Reis do Gado. PF no Tocantins deflagrou operação ontem

 

Lavagem de dinheiro

R$ 200 mi teriam sido lavados em esquema investigado pela Polícia Federal na Operação Reis do Gado, que apura participação do governador do Tocantins, Marcelo Miranda.