STF pede explicação à Câmara sobre situação de Rodrigo Maia

Leticia Fernandes e Manoel Ventura

21/12/2016

 

 

Comissão da Casa admite que deputado pode se reeleger à presidência

 

-BRASÍLIA- No mesmo dia em que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara deu parecer favorável à possibilidade de reeleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ) à presidência da Casa, o Supremo Tribunal Federal (STF) pediu explicações à Câmara sobre a situação de Maia para disputar o cargo.Se oficializar sua candidatura e for reconduzido à presidência, Maia pode ficar com o mandato sub judice. Ontem, o ministro do STF Celso de Mello pediu explicações à Câmara sobre o pedido do Solidariedade (SD) para barrar a recondução de Maia ao cargo, caso o deputado concorra à reeleição. Mello abriu prazo para que as partes se manifestem. A Câmara terá dez dias e, em seguida, vão se pronunciar o governo, via Advocacia-Geral da União, e a Procuradoria-Geral da República. Os prazos não contam durante o recesso, o que na prática leva o trâmite para fevereiro, para depois da eleição da presidência da Casa. A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, no entanto, pode decidir a qualquer momento sobre o recurso. Mello também decidiu levar a decisão sobre o assunto para o plenário.O Solidariedade recorreu ao STF, na semana passada, para questionar a possibilidade de um presidente da Câmara que exerceu mandato-tampão concorrer à reeleição. Maia passou a comandar a Casa após a renúncia do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDBRJ), em julho deste ano. Pelas regras da Câmara, é proibida a reeleição para a presidência, mas a CCJ deu parecer favorável à possibilidade em consulta feita pelo líder do PSD, Rogério Rosso (DF), pré-candidato ao cargo.— Não há vedação expressa para quem exerceu mandatotampão dizendo que ele não pode ser candidato à recondução — disse o relator da consulta à CCJ, Rubens Pereira (PCdoB-MA).Pereira deixou claro que o seu parecer é técnico e não traduz a opinião do PCdoB, que apoiou Maia no segundo turno da eleição à presidência da Câmara, justamente contra Rosso.— Mandato-tampão é uma situação anômala, não prevista na Constituição porque era impossível que ela previsse todos esses pormenores — afirmou, lembrando que a eleição ocorreu num contexto de “grave turbulência política”: — Não é razoável que queiramos que aquilo que serve para regulamentar uma situação normal, ordinária, valha para uma situação excepcional.O relator admitiu, no entanto, que a sua posição fortalece as pretensões de Maia:

— A possibilidade de concorrer por parte do presidente Rodrigo Maia certamente impulsiona ainda mais sua précandidatura.Em contra-ataque ao parecer do relator, outros quatro deputados apresentaram votos em separado à CCJ, todos contra a possibilidade de Maia concorrer: Ronaldo Fonseca (PROSDF), Arnaldo Faria de Sá (PTBSP), Lucas Vergílio (SD-GO) e Expedito Netto (PSD-RO). A comissão só vai se pronunciar sobre o assunto no ano que vem, após a eleição para a presidência da Casa, já que não haverá mais reuniões da CCJ este ano.Autor da consulta, Rosso disse que já esperava um parecer favorável a Maia e criticou a “insistência” do atual presidente em concorrer:— Vai ser uma campanha judicializada, uma eleição de extrema insegurança e atipicidade pela insistência dele. Alguns esperavam dele um gesto de conciliação, até um gesto de grandeza de pacificar a base e toda a Casa, mas infelizmente não aconteceu.Rosso contou que já na primeira semana de janeiro vai começar a percorrer o país para pedir votos. Perguntado sobre como faria isso, ironizou o fato de não usar avião da FAB, como tem direito o presidente da Câmara:

— De carro, né. Não vou ter avião da FAB, não vou ter assessoria.Questionado sobre o parecer da CCJ favorável a ele, Rodrigo Maia desconversou:— Disseram que é bom, mas ainda não li.A movimentação de Maia nos bastidores tem irritado os pré-candidatos do centrão e parte do PSDB. Além disso, a possibilidade de racha na base preocupa o Planalto, que teme prejuízos às votações das matérias econômicas.A votação do projeto de ajuda aos estados endividados, que ocorreu ontem, acabou sendo uma prévia da guerra pelo comando da Câmara. Maia inicialmente ficou acuado pelo fato de o líder do governo, André Moura (PSC-SE), ter trabalhado para esvaziar o plenário, rachando a base. Mas o presidente denunciou a ação de Moura no microfone, o que fez com que os partidos começassem a rever a debandada. Maia também fez um acordo com o PT, que o apoiou na eleição para a Casa, e se reuniu com petistas no fim da votação. Perguntado se o desentendimento com Moura foi uma prévia da disputa pelo comando da Casa, Maia foi irônico:

— Imagina se o Moura vai fazer isso — disse, sorrindo. (Colaborou Cristiane Jungblut)

 

 

O globo, n. 30452, 21/12/2016. País, p. 04.