Para Renan, decisão é ‘retaliação’ do Judiciário

Para Renan, decisão é ‘retaliação’ do Judiciário

 

Ricardo Brito

 

Afastado do comando do Senado no início da noite de ontem pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello, Renan Calheiros (PMDB-AL) vê retaliação e atribuiu, em conversa com interlocutores, que a decisão do ministro teve como motivação o fato de ele estar levando à frente uma série de projetos que envolvem o Poder Judiciário.

Nos diálogos, o peemedebista citou o fato de ele se mostrar a favor do projeto de abuso de autoridade e ter criado uma comissão para investigar os supersalários, que têm magistrados como um dos principais alvos.

Renan considera que a decisão do STF é um forma de ele não “tocar” nessa pauta, conforme relato obtido com um apoiador que o visitou na residência oficial. O peemedebista, entretanto, tem se mostrado frio desde que soube da manifestação.

O senador discute com aliados e com sua assessoria um recurso contra a decisão.

O peemedebista esteve no foco dos protestos de rua de anteontem em todo o País, quando manifestantes pediram “fora, Renan”, e se tornou réu na quinta-feira passada por peculato – a decisão acabou estimulando a Rede Sustentabilidade a pedir ao STF o afastamento de Renan às 11h17 de ontem.

Surpreendidos com a liminar do STF, interlocutores de Renan informaram que ainda não definiram qual o melhor caminho para tentar reverter a decisão de Marco Aurélio.

Renan chegou de Maceió ontem à tarde e foi direto para a residência oficial da presidência do Senado. Ele era esperado por Michel Temer na reunião de anúncio da reforma da Previdência no Palácio do Planalto – o presidente chegou a atrasar o início do encontro por essa razão.

O peemedebista está em contato direto com o advogado-geral do Senado, Alberto Cascais, que também é seu chefe de gabinete.

Homem de confiança de Renan, ele disse apenas que está “estudando saídas”. No radar, entre outros caminhos, um eventual agravo ao plenário do Supremo para que toda a Corte aprecie a liminar, mantendo-a ou reformando-a.

 

Poderes. Por ora, Renan divulgou uma curta nota em que diz que só vai se manifestar após conhecer oficialmente o teor da liminar concedida por Marco Aurélio, mas a tendência é tratar o assunto como uma decisão que afronta um Poder da República.

A nota dá a senha disso.

“O senador consultará seus advogados acerca das medidas adequadas em face da decisão contra o Senado Federal. O senador Renan Calheiros lembra que o Senado nunca foi ouvido na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental e o julgamento não se concluiu”, disse a manifestação.

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Viana sozinho não vai atrasar PEC do Teto

 

Vera Magalhães

 

Quando pediu vista do julgamento da ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) impetrada pela Rede Sustentabilidade, que questionava se um réu em ação penal pode ocupar um cargo que o coloque na linha sucessória da Presidência da República, o ministro Dias Toffoli argumentou que não havia um caso concreto que justificasse a ação.

Agora há: na semana passada, o próprio STF tornou Renan Calheiros réu. A liminar concedida pelo relator, Marco Aurélio Mello, parte desse princípio — e leva em conta a maioria que já estava formada quando Toffoli adiou o desfecho do julgamento — para afastar o presidente do Senado do cargo.

Assim, por caminhos diversos, Renan vai repetindo o destino de Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Ambos são investigados em múltiplas frentes da Lava Jato. E ambos, em algum momento, acharam que poderiam usar seus postos de comando para atuar em benefício próprio, perseguir adversários e embaraçar investigações. A novidade institucional é essa: não podem.

Ao confrontar o Judiciário e o Ministério Público Federal de maneira tão explícita, contrária até a seu estilo — mais melífluo e menos “figadal” que o de Cunha — Renan ficou exposto. Virou o principal alvo dos protestos em todo o País no domingo, à frente até dos deputados. E entrou num cabo de guerra com o Judiciário, que agora se manifesta.

Não que a liminar concedida por Marco Aurélio seja uma retaliação. Mas parece evidente que a pressão popular e a forma autoritária com que Renan insistia em avançar com uma pauta claramente retaliatória, alheio a apelos do próprio presidente Michel Temer e da presidente do STF, Cármen Lúcia, por uma discussão mais alentada, contribuíram para que o ministro tomasse essa decisão.

Diante disso, caso o afastamento de Renan seja confirmado pelo pleno do Supremo, que só se reúne amanhã, o governo se verá diante da circunstância de ter de aprovar a proposta de emenda constitucional que fixa o teto de gastos federais com o petista Jorge Viana (AC) na presidência.

Isso põe a proposta em risco? Não, no entendimento da maioria dos senadores consultados ontem e do Palácio do Planalto, numa primeira análise. O calendário já está fixado e a oposição no Senado é francamente minoritária. Assim como Renan não conseguiu sozinho impor a urgência do pacote de dez medidas de combate (sic) à corrupção, Viana sozinho não conseguirá atrasar a PEC do Teto.