Procuradoria vai à Justiça para anular novas regras de bagagem

Danielle Nogueira 

10/03/2017

 

 

Para Ministério Público Federal, norma fere direito do consumidor

O Ministério Público Federal em São Paulo entrou na Justiça com pedido de liminar para anular as novas regras da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) que autorizam as companhias aéreas a cobrarem pelo despacho de bagagens. A nova norma entra em vigor no próximo dia 14. Na ação, o MPF destaca que a cobrança fere os direitos do consumidor e levará à piora dos serviços mais baratos prestados pelas empresas. O pedido de liminar foi divulgado ontem e distribuído para a 22ª Vara Cível Federal de São Paulo.

Hoje, os passageiros têm o direito de despachar malas com até 23kg em voos nacionais e dois volumes de 32kg cada em viagens internacionais sem pagar taxa extra. Também podem levar bagagem de mão que não ultrapasse 5kg. A nova resolução da Anac elimina a franquia mínima de bagagem despachada. Ou seja, as empresas poderão cobrar por elas. No que diz respeito à bagagem de mão, o peso permitido passará a ser de 10kg.

Na avaliação do MPF, a Anac propôs a mudança sem analisar a estrutura do mercado brasileiro nem avaliar o impacto da medida sobre os passageiros com menor poder aquisitivo. “Ao apostar na concorrência como fator de ajuste dos preços, a agência reguladora ignorou o fato de o Brasil dispor de um número restrito de empresas, o que torna o setor pouco competitivo”, diz o MPF em nota. Procurada, a Anac não se manifestou.

‘OBJETIVO É AMPLIAR LUCRO’

Na ação, o procurador Luiz Costa afirma que o MPF fez uma perícia e que a conclusão desta é que “o objetivo das empresas não é subsidiar os consumidores de menor poder aquisitivo a partir da cobrança mais elevada para a diversificação dos serviços, mas sim ampliar lucros por meio da degradação da qualidade dos pacotes mais baratos, tornando os pacotes mais completos mais caros”.

O MPF diz ainda que a nova norma contraria o Código Civil, que garante a inclusão da bagagem despachada no valor da passagem, e o Código de Defesa do Consumidor, que veda a chamada venda casada e a cobrança de taxas manifestamente excessivas. O procurador cita até a Constituição, afirmando que a resolução da Anac provoca o retrocesso de direitos já adquiridos pelos consumidores.

Costa destaca também a preocupação com a cobrança extra considerando-se os longos trechos percorridos não só em voos internacionais, mas também em domésticos, dada a dimensão do território brasileiro.

— É possível que o juiz compre o argumento do Ministério Público, mas acho pouco provável. Essa tese da defesa do consumidor pobre não deve colar. Além disso, as regras da Anac são bastante claras e estamos a poucos dias da entrada de vigência — avalia Guilherme Amaral, especialista em Direito Aeronáutico do ASBZ Advogados. O fim da franquia de bagagem é apenas uma das várias medidas que constam da nova resolução da Anac. Elas valem para passagens emitidas a partir da próxima terçafeira, ou seja, para quem vai viajar no fim do ano e já comprou o bilhete, nada muda.

O principal argumento da Anac, ao propor a nova regra, é que hoje o custo do transporte da mala está embutido no preço da passagem. Quem despacha e quem não despacha paga a mesma coisa. A ideia é que, com a permissão para cobrança pelo despacho da mala, as tarifas para quem só leva bagagem de mão caiam.

Ontem, a Azul anunciou que vai oferecer tarifas menores para quem não despachar mala. O novo perfil de tarifa será implementado gradativamente em todos os voos da empresa, a partir de 14 de março. A aérea também manterá a franquia de 23kg nos voos domésticos, sem cobrança extra.

Se o passageiro comprar uma passagem sem possibilidade de despacho de mala, poderá mudar de ideia a qualquer momento. Caso faça isso, pagará R$ 30 por volume de até 23kg. Caso ultrapasse essa cota, será mantida a atual cobrança por quilo excedente. Nos voos para EUA e Europa, os clientes terão direito ao despacho de duas ou três malas de 23kg, dependendo da classe. Na América do Sul, poderão levar uma bagagem com este peso, sem custo extra.

Nas últimas semanas, outras aéreas divulgaram as novas políticas que vão adotar nos próximos meses. A Latam afirmou que será feita cobrança de R$ 50 por mala despachada em voos domésticos, mas não revelou a partir de quando a cobrança vai valer. A Avianca informou que ainda vai estudar como procederá. Já a Gol prometeu criar tarifas mais baixas para quem viajar apenas com bagagem de mão e cobrar valor ainda não definido por mala despachada.

 

O globo, n. 30531, 10/03/2017. Economia, p. 23