Governo deve reverter desoneração da folha

Claudia Safatle, Fabio Graner e Cristano Romero

29/03/2017

 

 

Com corte de cerca de R$ 32 bilhões no Orçamento deste ano, o governo fez uma composição de aumento de receitas para cobrir o "rombo" de R$ 58,2 bilhões divulgado na semana passada. Serão em torno de R$ 8,6 bilhões de precatórios não sacados; mais entre R$ 8,5 bilhões e R$ 10 bilhões em dinheiro novo da devolução de três hidrelétricas da Cemig para a União e entre R$ 5 bilhões a R$ 8 bilhões a título de reoneração da contribuição previdenciária sobre a folha de pagamento das empresas, além do fim da isenção do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para cooperativas de crédito, o que deve agregar mais R$ 1 bilhão à conta.

A reversão das desonerações feitas pelo governo anterior sobre a folha foi a principal medida de aumento de tributos do conjunto de ações para reduzir o rombo de R$ 58,2 bilhões e garantir o cumprimento da meta de déficit primário das contas federais em R$ 139 bilhões este ano. Outras possibilidades foram cogitadas, como elevação da Cide e do PIS/Cofins sobre combustíveis e do IOF, mas não passaram pelo crivo político do Planalto.

O presidente Michel Temer não foi convencido da necessidade de aumentar tributos e resistiu às propostas reiteradas de elevação de impostos apresentadas pela área técnica, avaliando ser possível melhorar as contas sem usar desse mecanismo. A realidade é que a pressão política de setores empresariais e da sociedade civil, que vinha em uma escalada desde a semana passada, pesou. Assim, a área econômica teve que se contentar com uma medida que tentará ser vendida não como aumento de tributos, mas como fim de um benefício fiscal com pouco retorno social.

A reoneração da folha de pagamentos deve ser feita por medida provisória para poder vigorar já no segundo semestre. Com isso, o governo deve arrecadar cerca de R$ 8 bilhões, metade do custo de R$ 16 bilhões estimado para este ano. Uma vez editada, a MP precisa ser aprovada pelo Congresso. A "noventena" - período entre a elevação do imposto e o início da efetiva cobrança -, porém, já é contada desde a edição da MP. Se for rejeitada, será outro problema, porque o governo terá que conseguir R$ 8 bilhões para cumprir a meta.

Mesmo com a reversão parcial da desoneração promovida pelo ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy, em 2015, cerca de 56 mil empresas ainda se beneficiam dela. Sancionada em setembro de 2015, a mudança elevou as alíquotas da contribuição patronal sobre o faturamento, que anteriormente variavam de 1% a 2%, para 2% a 4,5%, dependendo do setor. Naquele momento, o governo também tornou a desoneração facultativa. A reversão parcial também reduziu um pouco a despesa do Tesouro com a compensação à Previdência, que chegou a ser de R$ 25 bilhões em 2015. No ano passado, caiu para R$ 18 bilhões.

Entre os setores que ainda contam com alíquota de 2,5% sobre o faturamento estão têxtil, plásticos, comércio varejista, autopeças, material elétrico e móveis. Já as alíquotas mais altas incidem sobre as empresas de tecnologia da informação, de suporte técnico de informática e de construção civil.

No caso dos precatórios, o governo calcula que tem potencial de arrecadar R$ 8,6 bilhões. Mas esse número tinha risco de ficar um pouco menor, caso a AGU visse algum problema para recuperar tudo neste ano. Mesmo assim, o número não deve ser muito menor.

Os R$ 10 bilhões relativos às usinas a serem devolvidas pela Cemig o governo esperava ser concretizado até o fim da noite de ontem. A inclusão da receita dependia de decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de permitir à União leiloar duas usinas que eram da Cemig ainda este ano. Uma decisão já tinha sido a favor e faltava apenas mais uma. Na semana passada, o STF já havia decidido a devolução de uma delas, com valor de R$ 3,5 bilhões, mas que já tinha parte do valor, R$ 2 bilhões, incluído no Orçamento.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4224, 29/03/2017. Brasil, p. A5.