Mandatários - Todos os ex-presidentes pós-ditadura são citados

Carolina Brígido e Eduardo Bresciani 

12/04/2017

 

 

Relator da Lava-Jato no STF encaminha 201 petições para que instâncias inferiores decidam se abrem ou não investigação

-BRASÍLIA- A delação da Odebrecht alcançou os cinco ex-presidentes da República vivos: Dilma Rousseff (PT), Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Fernando Collor (PTC) e José Sarney (PMDB). Apenas Collor tem direito ao foro especial no Supremo Tribunal Federal (STF), onde foi aberto mais um inquérito contra ele. Como os outros não ocupam cargo público, o relator da Lava-Jato no STF, ministro Edson Fachin, determinou o envio de indícios contra os quatro a outras instâncias do Judiciário. A delação também atingiu 12 governadores — entre eles, o do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão.

Ao todo, Fachin enviou 201 petições a outras instâncias do Judiciário. A decisão de abertura ou não de inquérito nestes casos dependerá da avaliação do tribunal designado.

Dos governadores citados pelos ex-executivos da Odebrecht, nove poderão ser investigados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que é o foro indicado para processar ocupantes do cargo. Além de Pezão, estão nessa lista Geraldo Alckmin, de São Paulo; Paulo Hartung, do Espírito Santo; Fernando Pimentel, de Minas Gerais; Beto Richa, do Paraná; Flávio Dino, do Maranhão; Marconi Perillo, de Goiás; Raimundo Colombo, de Santa Catarina; Marcelo Miranda, de Tocantins.

Outros três governadores citados já estão na lista de inquéritos abertos no STF por Fachin: Renan Calheiros Filho, de Alagoas; e Tião Viana, do Acre; Robinson Faria, do Rio Grande do Norte. Como os três são investigados em inquéritos que também têm parlamentares, ganharam, por tabela, o direito de serem processados na mais alta corte do país. Os ex-governadores do Rio Anthony Garotinho, Rosinha Garotinho e Sérgio Cabral também foram alvo de petições enviados a instâncias inferiores, por serem citados pelos ex-executivos da Odebrecht. José Roberto Arruda, que governou o Distrito Federal, está na mesma situação.

MAIS DE UMA PETIÇÃO POR POLÍTICO

Os juízes que receberão o material decidirão se abrem ou não inquéritos para apurar os indícios apontados pelos delatores. Há seis petições sobre Lula encaminhadas à Justiça Federal em São Paulo e no Paraná, além do STJ. Dilma é personagem de duas petições, uma delas com fatos atrelados à suposta irregularidade do ex-ministro Edinho Silva, que hoje é prefeito, e tem direito ao foro no Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região. Em outra, encaminhada ao STF e à Justiça Federal do Paraná, Dilma é citada ao lado Antônio Palocci Filho, Guido Mantega e Luiz Inácio Lula da Silva. A petição sobre Fernando Henrique foi enviada para a Justiça Federal em São Paulo.

Não havia sido divulgado até o fechamento desta edição o teor das petições — portanto, não se sabe quais indícios foram mencionados contra os ex-presidentes ou os governadores. Diante do nome de Lula existe uma menção à Angola, que remete à suposta atuação de Lula junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) com o objetivo de garantir a liberação de financiamentos para a realização de obras de engenharia no país africano. Em outra, seu filho Luís Cláudio também é mencionado. Em uma das petições, Lula é citado junto ao exministro e ex-governador da Bahia Jaques Wagner e com referência à medida provisória 703, que alterava regras para acordos de leniência.

Ontem, um dia depois do depoimento de Marcelo Odebrecht, que afirmou ao juiz Sérgio Moro que Lula teria recebido R$ 13 milhões em espécie da empresa, o ex-presidente chamou de “canalhas” autores de vazamentos “mentirosos” contra ele. Em entrevista à Rádio Meio Norte, do Piauí, Lula disse ainda que o povo está com saudades dele na Presidência e que “quanto mais é provocado, mais tem vontade” de voltar a concorrer em 2018.

SARNEY: SUSPEITAS NA VALEC

No caso de José Sarney há acusações sobre o envolvimento em irregularidades na Valec, estatal da área de ferrovias do Ministério dos Transportes. Segundo delatores, havia desvio de 4% do valor do contrato da Ferrovia Norte-Sul para o pagamento de propina. Sarney ficava com 1% e Valdemar Costa Neto, principal dirigente do PR, com os outros 3%.

No caso do ex-presidente, ele seria representado no esquema por Ulisses Assada, então diretor de Engenharia da estatal. Fachin aceitou pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e repassou as informações relativas ao expresidente e demais investigados que não tem foro para a Justiça Federal de Goiás, onde já há inquérito aberto sobre o tema. Permaneceu no Supremo apenas Valdemar Costa Neto, que tem a sua conduta vinculada à do deputado federal Milton Monti (PR-SP), que teria cobrado da Odebrecht o pagamento de propina.

Na lista de petições enviadas a outras instâncias constam também indícios contra o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que está preso desde outubro em decorrência de investigações da Lava-Jato. A petição foi enviada à Justiça Federal no Paraná. Há também indícios contra o presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Jorge Picciani (PMDB), que estará nas mãos do TRF da 2ª Região; contra o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) do Rio de Janeiro Jonas Lopes de Carvalho; e contra o ex-prefeito Eduardo Paes, que teve petição enviada à Justiça Federal do Rio. Há também uma petição com indícios contra o ex-prefeito de Manaus, Arthur Virgílio.

Além disso, foi enviada à Justiça em São Paulo uma petição contra o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT). Em outras petições, há indícios contra os ex-ministros Aloizio Mercadante, Geddel Vieira Lima, Guido Mantega, Antonio Palocci. O ex-deputado José Genoino (PT), condenado na Lava-Jato, também foi citado na delação da Odebrecht e deverá ser investigado na Justiça Federal de São Paulo.

 

O globo, n. 30564, 12/04/2017. País, p. 9