Entidade aponta risco na adesão ao Criança Feliz

André Ítalo Rocha

18/03/2017

 

 

Segundo avaliação da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), maior parte das despesas do programa do governo federal ficaria com as prefeituras

 

 

A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) tem alertado as prefeituras para o que consideram riscos na adesão ao programa federal Criança Feliz, criado pelo presidente Michel Temer no ano passado e que tem a primeira-dama Marcela como madrinha. A avaliação é de que, como a maior parte das despesas fica com as prefeituras, o governo estaria tentando “se escorar” nos prefeitos para bancar a iniciativa.

“E em vez de consultar os municípios para saber se eles têm condição financeira de participar, o governo acaba estimulando a adesão, para fazer propaganda do programa”, diz o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski.

Lançado em outubro, o Criança Feliz tem como objetivo oferecer acompanhamento médico, pedagógico e psicológico a crianças de até três anos de famílias cadastradas no Bolsa Família. Os municípios que aderirem receberão recursos do governo federal. Pela Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2017, a União vai desembolsar R$ 328 milhões para o programa, com repasses de até R$ 5 mil mensais a municípios de até 20 mil habitantes, de até R$ 7,5 mil mensais para cidades de até 50 mil habitantes, e de até R$ 10 mil mensais para os lugares com população superior a 50 mil.

A confederação, no entanto, considera que a quantia é insuficiente. No caso dos maiores municípios, em simulação feita por técnicos da CNM, a prefeitura poderá ter que bancar até 82% dos custos do programa, por terem de contratar mais pessoal e lidarem com localidades mais distantes. Mesmo nos municípios de menor porte, a participação da prefeitura nas despesas pode ir até 64%. “É uma irresponsabilidade a que os municípios estão sendo induzidos”, afirma Ziulkoski. Já aderiram ao Criança Feliz 2,5 mil municípios, ou quase a metade do total.

Outro problema apontado pelo estudo da CNM é a insegurança jurídica. Argumenta-se que, como iniciativa foi criada por meio de um decreto, não há uma lei que a regulamente, o que dará à União a liberdade de congelar os repasses.

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Pasta rejeita críticas de confederação

18/03/2017

 

 

O Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, responsável pelo Criança Feliz, informou que desconhece as estimativas feitas pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) sobre o programa, mas rebateu as críticas. Segundo a pasta, o montante previsto pela União para o projeto, de R$ 328 milhões, poderá ser incrementado por meio de crédito adicional. Garantiu também que haverá reajustes nos valores repassados pelo governo às prefeituras.

O governo também rejeita a avaliação de que o programa oferece insegurança jurídica, argumentando que, embora o Criança Feliz tenha sido criado por meio de decreto, o programa está em consonância com a Lei do Marco Legal da Primeira infância, de março de 2016, que estabelece princípios e diretrizes para a formulação e a implementação de políticas públicas para a primeira infância.

Sobre o alerta da CNM de que pode haver processos trabalhistas, já que, segundo o estudo da entidade, “não há orientação para a forma de contratação dos profissionais”, o ministério destacou que os municípios são entes autônomos e que, na hora de contratar, devem estar atentos às normas de cunho nacional e local. “Além disso, vale lembrar que o programa é de livre adesão tanto por parte do Estado, quanto pelos municípios”, diz a pasta.

O presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, diz que considera o programa importante como medida de assistência a crianças em situação de vulnerabilidade, mas que tem tentado apontar os problemas para que a gestão dos municípios não seja comprometida. Ele relatou que já tentou marcou duas audiências com a presença do ministro Osmar Terra e da primeira-dama Marcela Temer para discutir o programa e buscar melhorias, mas até o momento não obteve sucesso.

 

PARA LEMBRAR

Programa visa marca social

O programa Criança Feliz é uma das estratégias do governo Michel Temer para consolidar marcas na agenda social e tentar reverter os baixos índices de popularidade do presidente.

O lançamento do Criança Feliz ocorreu no dia 5 de outubro, celebrado com um discurso da embaixadora do programa, a primeira-dama Marcela Temer, em que ela destacou a necessidade dos cuidados com a primeira infância.

O modelo do programa foi inspirado no Primeira Infância Melhor, implementado pelo atual ministro do Desenvolvimento Social e Agrário, Osmar Terra, no Rio Grande do Sul, quando ele era secretário de governo do Estado, há mais de dez anos.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45077, 18/03/2017. Política, p. A11.