Padilha deu endereços para entregar propina, diz delator

Rafael Moraes Moura e Beatriz Bulla

25/03/2017

 

 

Depoimento. José de Carvalho Filho, ex-executivo da Odebrecht, afirmou ao TSE que o escritório de Yunes foi um dos locais indicados para o pagamento de R$ 4 mi ao PMDB

 

 

Em depoimento ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ex-executivo da Odebrecht José de Carvalho Filho afirmou que o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha (PMDB), lhe passou todos os endereços para o pagamento de R$ 4 milhões destinados ao PMDB durante a campanha eleitoral de 2014.

Um dos locais indicados por Padilha foi o escritório de José Yunes, amigo e ex-assessor de Michel Temer (PMDB), informou Carvalho Filho ao ministro Herman Benjamin, relator no TSE da ação que apura se a chapa Dilma Rousseff-Michel Temer cometeu abuso de poder político e econômico para se reeleger.

O pagamento teria sido feito em 4 de setembro de 2014. “Todos os endereços, esses e os outros que eu não lembro, me foram dados pelo Eliseu Padilha”, disse Carvalho Filho. Segundo o ex-executivo da Odebrecht, a distribuição dos recursos foi determinada pelo executivo Marcelo Odebrecht.

“Procurei depois o Eliseu Padilha, no escritório dele, comentei o fato, ele já sabia, evidente, e solicitei dele os endereços que eles poderiam receber e quem fez essa operação foi (o setor de) Operações Estruturadas.

A sistemática era: eu chegava expor até ele e ele me fornecia o endereço, eu transmitia ao sistema de Operações Estruturadas a sra. Maria Lúcia (ex-secretária da Odebrecht) que, uns dias depois, me entregava uma senha. Eu pessoalmente entregava essa senha, entreguei essa senha ao sr. Eliseu Padilha”, afirmou José de Carvalho Filho.

“E, a partir dali, eu não tinha como nem sabia como as coisas eram operacionalizadas. Então, esclarecendo que tive com ele (Padilha) quatro ou cinco vezes para pegar esse endereço e voltei novamente para pegar essas senhas”, completou o ex-executivo da Odebrecht. De acordo com Carvalho Filho, os valores seriam repassados ao PMDB via Eliseu Padilha.

Discussão. Carvalho Filho também afirmou ter recebido na época uma “ligação extemporânea” do então deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), comentando que não havia recebido R$ 500 mil.

“Tivemos uma discussão acalorada ao telefone. Achei estranho e comuniquei ao Cláudio (Melo, ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht): ‘Cláudio, o fato foi esse e vamos esclarecer junto ao Eliseu (Padilha).

Logo depois fomos ao Eliseu e esclarecemos. Ele achou muito estranho este fato e disse: ‘Olha, se o endereço que eu dei e se fosse realmente entregue, o sr. Yunes é uma pessoa de mais ou menos 70 anos, é de minha confiança, dificilmente não teria registrado isso”. Isso causou um constrangimento a mim. (…) O mal-estar permaneceu e a empresa tomou, deliberou fazer outro pagamento de R$ 500 mil no valor, aquele que deu origem ao processo em discussão”, afirmou o ex-executivo.

Carvalho Filho disse não ter controle da planilha de distribuição de recursos. “A minha ação é entregar, tomar o endereço do sr. Padilha e entregar à sra. Lúcia, e a Sra. Lúcia me dava uma senha que eu repassava.”

Sobre o lobista Lúcio Funaro, apontado por investigadores da Lava Jato como operador de Eduardo Cunha, Carvalho Filho respondeu: “Nunca vi o Lúcio Funaro, nunca estive com o Lúcio Funaro e não sei quem é”.

Procurada, a assessoria de Padilha disse que o ministro não vai se pronunciar sobre o vazamento. Em depoimento ao Ministério Público Federal (MPF), José Yunes confirma que um envelope foi entregue em seu escritório, mas que ele não sabia qual era o conteúdo. Na ocasião, se declarou “mula involuntária” de Padilha.

A Odebrecht informou ontem, por meio de nota, que não se manifesta “sobre o teor de eventuais depoimentos de pessoas físicas, mas reafirma seu compromisso de colaborar com a Justiça”.

Depoimentos. No dia 14, o ministro Herman Benjamin negou pedido apresentado pela defesa de Dilma Rousseff para que Padilha e Yunes prestassem depoimento na Justiça Eleitoral.

“Não houve referência, no conjunto probatório até aqui produzido, de fatos concernentes à atuação de Eliseu Padilha ou José Yunes que tenham correlação direta com o objeto desta causa, isto é, o financiamento da chapa Dilma-Temer em 2014”, escreveu Benjamin em sua decisão

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45084, 25/03/2017. Política, p. A4.