Título: Juros caem para 10,5%
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 19/01/2012, Economia, p. 10

BC indica que, daqui por diante, o ritmo da redução da taxa básica dependerá da disposição do Palácio do Planalto de cortar gastos. A estimativa é de que o arrocho no Orçamento fique entre R$ 60 bilhões e R$ 70 bilhões

Diante do cenário internacional incerto e de uma inflação menos corrosiva comparada à de 2011, o Banco Central seguiu à risca o esperado pelo governo e pelo mercado e cortou a taxa básica de juros (Selic) em 0,5 ponto percentual, a quarta vez na gestão de Alexandre Tombini. Com o movimento, o indicador passou de 11% para 10,50% ao ano. No comunicado em que justificou a redução, o BC reforçou seu conservadorismo ao não se comprometer com indicações sobre o futuro da Selic. Tanto que repetiu exatamente as palavras do texto pós-reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de novembro do ano passado.

No entender dos especialistas, o recado foi claro: há espaço para a continuidade do alívio monetário, com pelo menos mais duas baixas de 0,25 ponto, com a Selic cravando 10%. Mas para se chegar perto dos 9% desejados pela presidente Dilma Rousseff, o Palácio do Planalto terá de fazer a sua parte e promover um amplo e efetivo arrocho fiscal.

A promessa de um aperto nos gastos vem sendo ratificada diariamente pelo governo. Os sinais são de que a tesoura atingirá uma quantia entre R$ 60 bilhões e R$ 70 bilhões. A expectativa é de que ajuste no Orçamento seja apresentado até o início do próximo mês. O que incomoda o BC, porém, é a existência de uma ala governista, da qual faz parte o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, que pede cortes menos expressivos e o não cumprimento da meta cheia da economia para o pagamento de juros da dívida (superavit primário), de 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Assim, o governo conseguiria retomar os investimentos públicos, contidos em 2011, para garantir crescimento econômico de pelo menos 4% neste ano.

Para a diretoria do BC, o superavit primário de 3,1% do PIB, realizado com base em uma efetiva redução das despesas e não por meio do aumento das receitas, ajudará a levar a inflação para o centro da meta, de 4,5%, ao longo dos próximos meses. Sem esse esforço governamental, dificilmente o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) conseguirá fechar 2012 abaixo de 5%, mesmo com o agravamento da crise na Europa, que já está no quadro traçado pelo BC para vir derrubando os juros desde agosto do ano passado. "Por enquanto, a presidente Dilma está tendendo mais para o lado do BC, que tem todo o respaldo do ministro da Fazenda, Guido Mantega", disse um assessor do Planalto.

Na avaliação de Carlos Kawall, economista-chefe do Banco Safra, o comunicado divulgado pelo BC não trouxe indicativos de que o ciclo de afrouxamento monetário será encerrado em março, como cogita parte do mercado financeiro. "O BC manteve seu grau de liberdade para seguir o comportamento da atividade e, assim, tomar as próximas decisões", afirmou. "Não houve nenhuma mudança significativa que gerasse uma sinalização mais contundente", argumentou.

Atividade Segundo Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco WestLB, o cenário internacional incerto e a perspectiva de baixo crescimento global, somados a uma inflação doméstica cadente, deixaram o BC confortável para promover pelo menos mais um corte na taxa básica. Ele ressaltou ainda que não vê perigos para o Copom ao longo deste primeiro semestre. "O teste importante no front inflacionário ocorrerá na segunda metade do ano e dependerá da retomada do nível da atividade", disse. Salomão Quadros, economista da Fundação Getulio Vargas (FGV), endossou esse discurso. "Internamente, os preços podem subir um pouco agora, mas depois vão se acomodar. E, mesmo que subam, não há risco de disseminação de altas", avaliou.

Porém, mesmo com o novo corte na Selic, o Brasil continua a amargar a liderança no ranking das maiores taxas reais (descontada a inflação) de juros do mundo: 4,9% ao ano, segundo cálculos da Cruzeiro do Sul Corretora. Para superar a segunda nação da lista, a Hungria, os brasileiros têm de derrubar a Selic ao mesmo para a metade – os húngaros ostentam juro real de 2,8% ao ano. Para o consumidor ávido por crédito, na prática, a diferença será pequena. Segundo a Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), com a queda de 0,5 ponto definida pelo BC, a taxa média das operações de empréstimos e financiamentos ficou mísero 0,04 ponto percentual menor ao mês. Na compra de uma geladeira de R$ 1,5 mil financiada em 12 vezes, a parcela ficará somente R$ 0,39 mais barata.

Caixa e BB aliviam clientes Tão longo o Banco Central anunciou a decisão de reduzir a taxa básica de juros (Selic) de 11% para 10,50% ao ano, os bancos públicos trataram de anunciar corte nos encargos cobrados dos clientes. Segundo a Caixa Econômica Federal, as taxas das linhas de crédito ficarão até 28,3 pontos percentuais ao ano menores para os consumidores e até um ponto ao ano para empresas. No Banco do Brasil, os juros cobrados nos financiamentos de veículos baixaram de 1,36% para 1,32% ao mês. No cheque especial, a taxa recuou de 8,41% para 8,37% mensais.