Valor econômico, v. 17, n. 4244, 28/04/2017. Política, p. A8

Planalto mapeia apoios para mudança da CLT no Senado

 

Vandson Lima
Fabio Murakawa
Marcelo Ribeiro

 

O governo trabalha para confirmar no Senado o projeto de reforma trabalhista aprovado na Câmara dos Deputados há dois dias. O plano ideal, segundo líderes da base governista, passa por uma aprovação rápida - com todo o trâmite durando cerca de três semanas - e a manutenção do texto sem alterações, o que permitirá seu envio direto para a sanção presidencial. O Palácio do Planalto, no entanto, já acendeu o sinal de alerta para dificuldades, sendo a possível influência negativa do líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), a maior delas.

Por um lado, o fato de o relator na Câmara ter sido o tucano Rogério Marinho (PSDB-RN) ajuda o governo. O parecer por ele produzido foi elogiado por senadores do seu partido e será por eles defendido sem mudanças. Por outro, é a resistência no próprio PMDB do presidente Michel Temer, em diversas frentes, que preocupa.

Responsável pela negociação com o Congresso, o ministro da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy (PSDB-BA), foi lembrado ontem por líderes aliados no Senado que a reforma trabalhista tramita, obrigatoriamente, por pelo menos duas comissões do Senado: a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Caberá a seus respectivos presidentes designar relatores para a matéria, que poderão propor alterações ao texto.

Se a CAE não é vista como problema - afinal, é comandada por Tasso Jereissati (PSDB-CE), um aliado insuspeito -, a CCJ tem à frente Edison Lobão (PMDB-MA), cuja nomeação ao cargo tem todas as digitais de Renan. O líder comprou briga dentro do PMDB para fazer de Lobão o presidente do colegiado, o mais importante do Senado.

O pior cenário possível para o governo seria Lobão nomear o próprio Renan relator da reforma. O senador é suplente da CCJ. Como se trata de uma comissão com um número muito grande de propostas na fila, o presidente da CCJ é livre para escolher qualquer integrante, titular ou não, para relatar uma matéria. E ninguém, nem o colegiado, tem poder regimental para questionar a escolha. Por isso, senadores da base aconselharam Imbassahy a "cercar" Lobão, contemplá-lo e evitar tal risco.

Há ainda a possibilidade de a reforma ter de passar pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS), o que é visto como potencialmente outro problema para o calendário desejado pelo governo. Marta Suplicy (PMDB-SP) é a presidente do colegiado. Ao Valor, ela afirmou que é "natural" que a reforma trabalhista tramite pela comissão, que inclusive já tem se adiantado e realizado sessões de debates sobre o tema. Mas sem pressa. "A proposta é boa, mas pode melhorar. É isso que o Senado vai fazer. Nós não vamos atropelar, vamos fazer no tempo possível, com os senadores discutindo todos os pontos", avisou.

Marta lembra que questões como o fracionamento de férias e a regularização do trabalho intermitente não constavam no projeto original e foram inseridas na Câmara. Os dois dispositivos eram alvos de propostas que estavam em discussão no Senado. "Vamos ter que ver como conciliar isso".

Sobre a escolha de um relator para a matéria, a senadora disse que optará por "uma pessoa ponderada e flexível", mas que tenha como prioridade "pensar no trabalhador". "Os avanços para os empresários foram conquistados [no texto da Câmara]. Agora é preciso pensar no trabalhador," disse.

Fontes do Palácio do Planalto, porém, afirmam que o texto entregue por Marinho está "redondo" e não há espaço para novas concessões, já que o relator acatou sugestões de senadores e do próprio presidente, além de ter escutado a equipe ministerial.

O Valor apurou que, após o resultado, Temer afirmou a aliados que o texto de Marinho já tinha sido negociado "à exaustão".

"Como o relator contemplou várias sugestões, o presidente acredita que o texto esteja redondo para ser votado sem alterações no Senado", disse um auxiliar palaciano.

Aliados do governo no Congresso afirmaram, sob condição de anonimato, que não há nenhuma perspectiva de veto no Planalto ao texto aprovado na Câmara.

Por ora, ainda não preocupa governistas um possível afastamento temporário do presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE). Ele sofreu um desmaio na madrugada de ontem e está internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do hospital Santa Lúcia, em Brasília. Após exames, foram afastadas as hipóteses de Acidente Vascular Cerebral (AVC) e encefalite viral. A expectativa de aliados é que ele retorne às atividades do Senado na próxima semana.

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Placar da votação é visto com cautela

 

Andrea Jubé
Marcelo Ribeiro
Cristiano Zaia

 

O Palácio do Planalto celebrou, com cautela, o placar de 296 votos que garantiu a aprovação da reforma trabalhista na Câmara. A avaliação é que a votação expressiva é apenas um ponto de partida para redobrar o trabalho pela aprovação da reforma da Previdência.

Foram contabilizadas 86 dissidências, que de um lado, mostram um número alto de insatisfeitos na base aliada. Em contrapartida, agora o governo sabe exatamente onde se localizam os focos de insatisfação e poderá atuar para debelá-los. Entre os recursos para isso, na semana que vem o governo começa a liberar emendas parlamentares relativas a 2016.

Nas palavras de um ministro com gabinete no Palácio, com a aprovação da reforma trabalhista, "o jogo está zerado". Segundo este auxiliar presidencial, os 296 votos creditados à reforma da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não revelam que a reforma previdenciária "tem os mesmos 296 votos". Contudo, permitiu ao governo atualizar o mapa da base aliada, de modo que os estrategistas da votação sabem exatamente onde atuar.

Na próxima semana, o ministro da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy, começa a chamar os deputados da base aliada para pagar emendas parlamentares relativas a restos a pagar de 2016, que estavam represados. "Não podíamos gastar toda a munição já desde março", exemplifica um assessor do presidente Temer.

"Os votos contrários à reforma trabalhista são sinais ótimos, mostram onde vamos trabalhar", diz o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), fiel escudeiro do Planalto e coordenador do governo na comissão especial da reforma previdenciária. Ele afirma que a votação na comissão está mantida para a próxima semana.

Ontem o presidente Michel Temer fez reuniões reservadas com ministros e alguns deputados da base aliada para trocar impressões sobre o resultado da votação. Ele pediu aos ministros que não deixem Brasília até a conclusão da votação das reformas nas duas Casas.

O ministro da Agricultura, Blairo Maggi - que é senador licenciado pelo PP do Mato Grosso - terá de adiar e abreviar uma viagem internacional que fará em maio para ficar em Brasília ajudando o governo na votação das reformas.

Inicialmente, Maggi partiria dia 7 de maio para uma viagem à Ásia e Europa com a intenção de reconquistar a confiança de países importadores de carne brasileira, diante dos efeitos da Operação Carne Fraca. O embarque de Maggi foi remarcado para 12 de maio. Já a volta está mantida para 24 de maio.

"O presidente Temer pediu para ficarmos em Brasília para ajudar com as reformas", disse o ministro. O ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, também cancelou ontem viagens que faria nos próximos dias.

Líderes consultados pelo Valor afirmaram que o elevado índice de traições entre aliados incomodou o Planalto, que já teria ordenado, segundo eles, uma mudança de postura em relação aos dissidentes. A nova recomendação é que, para negociar votos, "a estratégia conciliadora perca espaço para uma abordagem mais agressiva".

Em outra frente, mais do que oferecer cargos em segundo e terceiro escalões, o governo pretende lembrar aos partidos que registraram mais dissidências na votação da reforma trabalhista que eles já possuem cargos e que, se continuarem traindo, podem perdê-los, afirmaram líderes de partidos da base.

"Após muito diálogo e concessões para aliados, o diagnóstico é preocupante. Chegou a hora de separar o joio do trigo para poder negociar com quem não vai recuar depois", afirmou um dos principais líderes do Congresso ao Valor PRO.

Um dos nomes mais importantes do PSDB do Senado afirmou ao Valor, sob condição de anonimato, que, entre os deputados tucanos devem haver pelo menos 20 votos contra a reforma da Previdência. Além disso, o senador do PSDB afirmou que vários parlamentares não têm escondido seu desejo de votar logo a previdência para mitigar as pressões populares que vem sofrendo em locais públicos.

Paralelamente, os líderes devem repassar informações, esclarecimentos e sanar dúvidas sobre o texto do relator Arthur Maia (PPS-BA) para os integrantes de suas bancadas, sob o argumento de "que nenhum aliado do governo poderá se respaldar em problemas de comunicação para justificar suas traições".

Considerado um dos principais aliados de Temer no Congresso e palpiteiro de mão cheia quando o quesito é projeção de votações importantes, o deputado Beto Mansur (PRB-SP) minimizou as dissidências e atribuiu a vitória expressiva porém ainda longe do quorum qualificado à ausência de mais de 20 parlamentares da base de apoio ao governo no Congresso.

"Muitos deputados que vão votar conosco na Previdência estavam viajando. Alguns que eu conversei disseram que não apoiariam a trabalhista, mas que pretendem aprovar a previdenciária".

A oposição, por sua vez, pretende derrubar a reforma da Previdência "comendo pelas beiradas", afirmou o líder da minoria na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE). Para evitar que o governo consiga os 308 votos necessários para emplacar a reforma da Previdência, a oposição pretende fazer manifestações nas ruas para pressionar os parlamentares.

"A ofensiva da oposição será ir para as ruas. "Paralelamente, iremos conversar com os dissidentes. Nós queremos ter pelo menos 250 votos contrários", completou o petista.

De acordo com ele, o PSB, que registrou 16 traições em 30 votos, e o Solidariedade, que teve 8 dissidências em 13 votos, estão no radar dos opositores. "Pelo menos 2/3 do PSB votarão conosco contra a Previdência".

Na avaliação do líder da minoria, os deputados da base de apoio ao governo no Congresso que estão votando contra a pauta do governo estão percebendo que "o preço de aprovar as reformas é alto demais".

"Votar com Temer na reforma da Previdência é o abraço dos afogados, porque o governo já está afundado quando o assunto é opinião pública. Temer está encerrando a carreira política e não precisa mais de votos. Já os deputados precisam de votos em 2018 para continuar no Congresso", disse Guimarães.

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Com resistência da base, governo conta votos

 

Raphael Di Cunto

 

O governo trabalha para obter na comissão da reforma da Previdência na Câmara dos Deputados, na quarta-feira, o apoio de 3/5 dos integrantes. A meta é fazer entre 22 e 25 votos, dentre os 37 participantes, como demonstração de força para aprovar o texto em plenário - percentual necessário para atingir os 308 votos exigidos por propostas de emendas à Constituição (PEC).

"É um simbolismo importante", afirma o coordenador do governo na comissão, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS). A meta é mais fácil de atingir, reconhecem os governistas, porque os integrantes da comissão contrários podem ser substituídos pelos partidos a qualquer momento. Mas mesmo integrantes da base estão reticentes.

O PR, um dos partidos que mais preocupa o Palácio, tem três titulares na comissão. Mas só duas das cadeiras titulares estão preenchidas. Segundo integrantes da legenda, até há parlamentares dispostos a votar na proposta em plenário, mas não estão encontrando quem aceite o desgaste de ir para a comissão.

Entre os suplentes, e que votariam na ausência dos titulares, Wellington Roberto (PB) não foge das polêmicas - foi da tropa de choque do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) -, mas já pediu para deixar o posto. O governo pressiona o líder da bancada, Aelton Freitas (MG), a votar no lugar.

No PSDB, um dos três titulares votará contra. "Não estou convencido do projeto, a tendência é votar não", disse o deputado Eduardo Barboza (PSDB-MG). O partido pressiona o governo a elevar o acúmulo de pensões e aposentadoria até o teto do INSS (R$ 5,5 mil), hoje de dois salários mínimos, e garantir aposentadoria integral por invalidez em acidentes fora do trabalho.

O tucano afirma que sua posição também reflete o sentimento da bancada. "Num assunto desses, para votar a favor, só com respaldo da maioria", disse. Em reunião na terça-feira, 24 dos deputados do PSDB declararam que votariam contra, três a favor e três apoiariam se o partido fechasse questão.

Já os outros dois tucanos na comissão votarão a favor. "Não é algo que faço com gosto, mas é uma necessidade para o país", afirmou o deputado Giuseppe Vecci, ex-secretário de Planejamento de Goiás. Outros partidos da base estão com os integrantes da comissão fechados a favor da reforma: PMDB, PP, DEM e PSD.

O PSB, com um ministério, mas que fechou questão contra as reformas, está representado na comissão por um dos deputados da ala contrária. As contas do governo não consideram duas siglas da base, SDD e PTB. A avaliação é que o desgaste de obrigar o PTB a tirar o deputado Arnaldo Faria de Sá (SP) seria maior que perder um voto. Há hoje pelo menos 15 votos contra a reforma na comissão.

Não há, porém, chance de o parecer do deputado Arthur Maia (PPS-BA) não ser aprovado pela comissão. A votação na comissão, adiada de terça-feira para quarta-feira, dia 4, é por maioria simples dos presentes. Mas esses parlamentares têm exigido do governo que a proposta seja realmente votada em plenário, para não ficarem sozinhos com o desgaste.