Janot pede impedimento de Gilmar em caso de Eike 
 Rafael Moraes Moura, Breno Pires e Beatriz Bulla
09/05/2017
 
 
Supremo. Mulher de ministro é sócia de escritório que representa o empresário; procurador-geral da República pede que decisões relativas ao caso sejam anuladas

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ontem que o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), seja declarado impedido de atuar nos casos relacionados ao empresário Eike Batista. Janot também quer que as decisões do ministro no processo percam a validade, o que levaria à anulação da soltura de Eike, determinada pelo ministro em abril.

O motivo do pedido é a atuação da mulher de Gilmar, Guiomar, no Escritório de Advocacia Sérgio Bermudes, “que prestaria serviços a Eike Fuhrken Batista, beneficiado pela decisão do magistrado”.

Para o procurador, Gilmar incidiu em hipótese de “impedimento ou, no mínimo de suspeição” ao julgar o habeas corpus de Eike. “Por tal motivo, suscita- se a presente arguição contra o ministro Gilmar Ferreira Mendes, a fim de que se reconheça a sua incompatibilidade para funcionar no processo em questão, bem como para que se declare a nulidade dos atos decisórios por ele praticados”, pediu Janot.

O procurador-geral destaca também que Guiomar Mendes é responsável pela filial do escritório de advocacia em Brasília, figurando como sócia e tendo participação nos lucros, obtidos “mediante o recebimento de honorários dos respectivos clientes, um dos quais é exatamente Eike Fuhrken Batista”.

No pedido, Janot requer ainda que o ministro preste depoimento. Além disso, também requereu que a mulher dele, Guiomar, o advogado Sérgio Bermudes e o próprio Eike sejam ouvidos como testemunhas no caso.

Análise. É a primeira vez em quatro anos que o procuradorgeral apresenta uma arguição de impedimento contra um ministro do Supremo. Caberá agora à presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, definir quando ocaso será levado ao plenário para ser decidido pelos integrantes do STF.

No dia 28 de abril, Gilmar concedeu habeas corpus pedido pela defesa de Eike para suspender os efeitos da prisão preventiva e soltá-lo. O empresário estava preso em Bangu, no Rio, desde janeiro, pela Operação Eficiência, um desdobramento da Calicute, que levou à prisão o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB) e sua mulher, Adriana Ancelmo.

“Diante disso, o Ministério Público procedeu a uma apuração preliminar que confirmou os fatos. A situação evidencia o comprometimento da parcialidade do relator”, afirma Janot.

A decisão liminar do ministro, que cita “constrangimento ilegal” ao empresário, foi dada na mesma semana em que a Segunda Turma do Supremo decidiu revogar duas prisões da Lava Jato e libertar o pecuarista José Carlos Bumlai e o ex-tesoureiro do PP João Cláudio Genu, ambos condenados em primeira instância pelo juiz Sérgio Moro.

Nos dois casos, Gilmar deu voto a favor da defesa.

O ministro ainda desempatou o julgamento, na Segunda Turma, do pedido que libertou o ex-ministro José Dirceu. O voto foi alvo de protestos nas redes sociais e motivou um abaixo- assinado na internet contra o ministro.

Regimento. Para justificar o pedido de suspeição, Janot cita dois artigos do Código de Processo Civil que tratam da suspeição de magistrados. Em um deles, a lei traz a previsão de impedimento do juiz quando “figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório.”

Cônjuge. Procurador destaca que mulher de Gilmar, Guiomar, figura como sócia de escritório

PARA LEMBRAR

Operação Eficiência

Em 26 de janeiro o juiz Marcelo Bretas decreta a prisão preventiva de Eike Batista. Segundo investigações, ele pagou propina ao ex-governador Sérgio Cabral. Eike é detido quatro dias depois.

Habeas corpus

Em 28 de abril, o ministro Gilmar  Mendes, do Supremo Tribunal Federal, concedeu habeas corpus e mandou soltar Eike.

Fiança

Bretas determinou a Eike pagamento de R$ 52 milhões para ter o benefício da prisão domiciliar. Defesa do empresário afirmou que decisão é “inexequível” e implica nova prisão e o descumprimento de ordem do STF.

Impedimento

Ontem, a PGR pediu que Gilmar seja declarado impedido de atuar no caso; a isenção do ministro é questionada porque sua mulher integra escritório “que prestaria serviços” a Eike.

 

O Estado de São Paulo, n. 45129, 09/05/2017. Política, p. A4