STF manda soltar Dirceu e impõe derrota à LAva-Jato

Rafael Moraes Moura, Breno Pires e Beatriz Bulla

03/05/2017

 

 

Justiça. Por 3 votos a 2, ministros determinam libertação do quarto preso na operação ou em seus desdobramentos em uma semana; Gilmar Mendes desempata julgamento

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem revogar a prisão preventiva do ex-ministro José Dirceu, preso desde agosto de 2015 na Operação Lava Jato. O resultado do julgamento, por 3 votos a 2, marcou uma nova derrota para o ministro Edson Fachin, relator da operação na Corte, e para a investigação conduzida pela força-tarefa em Curitiba.

A decisão sobre Dirceu é a quarta prisão de alvos da Lava Jato ou de seus desdobramentos revogada por ministros da Corte em uma semana. Além de nova derrota para a Lava Jato, o julgamento de ontem evidenciou uma espécie de disputa velada que vem sendo travada entre os procuradores, o juiz Sérgio Moro, e alguns ministros sobre o entendimento em relação a prisões preventivas.

Para investigadores, o sinal foi claro de que outros presos devem ser soltos.

Ontem pela manhã, antes de o habeas corpus de Dirceu ser julgado no Supremo, a Procuradoria da República no Paraná apresentou uma nova denúncia contra o ex-ministro por lavagem de dinheiro . A acusação formal, a terceira contra o petista, foi antecipada para que coincidisse com a apreciação do recurso no Supremo.

O ministro Gilmar Mendes, que foi favorável à liberdade de Dirceu, criticou a “manobra” e acusou os procuradores de tentar pressionar o Supremo.

A decisão de soltar Dirceu, segundo investigadores, também pode influenciar futuras tratativas para delações premiadas de alvos da Lava Jato. Estão presos em Curitiba o ex-ministro Antonio Palocci, o deputado cassado Eduardo Cunha, o ex-diretor da Petrobrás Renato Duque, o operador Adir Assad e o ex-tesoureiro do PT João Vaccari. Parte deles, de algum forma, já deu sinais de que podem negociar um acordo. Ontem, a defesa de Palocci já entrou com um novo pedido de liberdade ao Supremo.

Restrições. Pela decisão do STF sobre Dirceu, o juiz federal Sérgio Moro, da 13.ª Vara Criminal em Curitiba, deverá determinar quais medidas cautelares serão impostas ao ex-ministro em substituição à prisão.

Além de Gilmar, que desempatou o julgamento, votaram pela soltura do petista os ministros Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski. O relator da Lava Jato, Edson Fachin, e o decano do STF, ministro Celso de Mello, votaram pela manutenção da prisão.

Na semana passada, a 2.ª Turma do STF decidiu soltar o pecuarista José Carlos Bumlai e o ex-tesoureiro do PP João Cláudio Genu.

Na ocasião, Fachin também foi vencido. “Este é um caso complexo e triste da nossa própria história. Não podemos nos ater à aparente vilania dos envolvidos para decidir acerca da prisão processual”, disse Gilmar.

A favor da manutenção da prisão, Fachin alegou que a medida “encontra-se plenamente justificada pela lei e pela jurisprudência desta Corte”. Fachin afirmou que Dirceu praticou crimes investigados pela Lava Jato durante o julgamento do mensalão, no qual foi condenado. “Mais que isso, o paciente não teria sido dissuadido sequer pela condenação”, disse o relator da Lava Jato. / COLABORARAM FÁBIO SERAPIÃO e FAUSTO MACEDO

O EX-MINISTRO NA LAVA JATO

● O Ministério Público Federal apresentou nova denúncia contra José Dirceu, que já tem duas condenações no âmbito da operação

Setembro de 2015

1ª denúncia

O ex-ministro é acusado de receber propinas em cinco projetos da Engevix com a Petrobrás. O valor pago pela empreiteira teria chegado a R$ 57 milhões

Maio de 2016

1ª condenação

PENA: 20 anos e 10 meses de prisão CRIMES: corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa

Junho de 2016

2ª denúncia

Dirceu é acusado pelo recebimento de R$ 2,1 milhões em propinas para favorecer a contratação da empresa Apolo Tubulars pela Petrobrás

Março de 2017

2ª condenação

PENA: 11 anos e 3 meses de prisão CRIMES: corrupção e lavagem de dinheiro

Maio de 2017

3ª denúncia

O ex-ministro foi denunciado ontem pelo recebimento de propinas da Engevix e da UTC durante e depois do julgamento do mensalão, no qual foi condenado

VALOR RECEBIDO POR DIRCEU

R$ 2,4 milhões

DE 2011 A 2014

Segundo a denúncia, parte da propina foi usada para custear assessoria de imprensa e de imagem durante o julgamento do mensalão; serviços incluíram a emissão de relatórios sobre a imagem de Dirceu perante a sociedade, o gerenciamento de entrevistas, a elaboração de artigos e até a organização de um livro assinado pelo ex-ministro

TOTAL PAGO PELA UTC

R$ 1,5 milhão

Beneficiada com contratos da Pretrobrás, a UTC firmou, entre fevereiro de 2013 e outubro de 2014, aditivos contratuais fictícios com a JD Assessoria, empresa de José Dirceu, para lhe repassar pelo menos R$ 1,5 milhão em propinas

TOTAL PAGO PELA ENGEVIX

R$ 900 mil

A Engevix, com a finalidade de ocultar a origem criminosa de recursos desviados da Petrobrás, encobriu pagamentos por serviços de assessoria de comunicação prestados a Dirceu. O ex-ministro contratou, em 2009, a empresa Entrelinhas Comunicação Ltda. para prestar serviço de assessoria de imprensa. Como não conseguiu arcar com as despesas da contratação, a Engevix quitou a dívida

Outros denunciados

Luiz Eduardo de Oliveira e Silva

IRMÃO DE JOSÉ DIRCEU

João Vaccari Neto

EX-TESOUREIRO DO PT

Gerson Almada

EX-EXECUTIVO DA ENGEVIX

Walmir Pinheiro Santana

EX-EXECUTIVO DA UTC

 

O Estado de São Paulo, n. 45123, 03/05/2017. Política, p. A4