Investigado, ministro relata caso de empreiteiras no TCU

Fábio Fabrini

08/05/2017

 

 

Lava Jato. Citado como beneficiário de propinas, Vital do Rêgo responde a dois inquéritos no STF e conduz ao menos cinco processos de interesse de Odebrecht e OAS

Investigado na Operação Lava Jato por suposto recebimento de “vantagens indevidas” da OAS e da Odebrecht, o ministro Vital do Rêgo continua a conduzir processos de interesse das empreiteiras no Tribunal de Contas da União (TCU).

Em ao menos cinco casos, que avaliam irregularidades em contratos das empresas com a Petrobrás e outros órgãos públicos, Vital atua como relator, com poder para determinar os rumos das auditorias e elaborar os votos que orientam os julgamentos. A situação vem sendo questionada pelos próprios auditores e procuradores da corte de contas.

O ministro responde a dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF) por ter sido citado por empreiteiros e delatores da Lava Jato como beneficiário de propinas quando exercia mandato de senador pelo PMDB da Paraíba. Ele nega as acusações.

Uma das investigações, aberta no ano passado, apura a suspeita de que o então congressista cobrava “pedágio” de construtoras para protegê-las na CPI Mista da Petrobrás, que ele presidia em 2014, antes de ser indicado para a corte de contas.

A acusação foi feita pelo ex-presidente da OAS José Adelmário Pinheiro, o Léo Pinheiro.

Em depoimento, Léo Pinheiro disse ter pago, como contrapartida, R$ 1,5 milhão em caixa 2 a Vital em sua campanha para o governo da Paraíba, em 2014.

O empresário entregou notas fiscais dos supostos repasses.

O ex-presidente da Andrade Gutierrez Otávio Marques de Azevedo também disse ter tratado de pagamentos com Vital.

No mês passado, o relator da Lava Jato no Supremo, ministro Edson Fachin, autorizou novo inquérito contra Vital, com base em depoimentos de delatores da Odebrecht. Ele foi citado como um dos beneficiários de R$ 10 milhões em vantagens indevidas, supostamente solicitadas pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, que também fez acordo de colaboração.

O ex-senador, segundo o delator, recebeu R$ 350 mil.

Processos. No TCU, Vital figura como relator de tomada de contas especial que apura superfaturamento em contrato de US$ 825 milhões firmado entre a Petrobrás e a Odebrecht em 2010, com o objetivo de executar serviços em refinarias e outras unidades da estatal localizadas em nove países.

O ministro também é o responsável por outro processo, que fiscaliza as obras de modernização e adequação da Refinaria do Vale da Paraíba (Revap), em São José dos Campos (SP).

A Odebrecht integrou o consórcio responsável pelo empreendimento, de R$ 804 milhões. Os dois contratos são citados na delação da empreiteira como objetos de corrupção.

Vital também é relator de outros três processos em que a OAS é parte interessada. Eles apuram possíveis irregularidades em obras no Aeroporto de Congonhas e trechos do Arco Metropolitano do Rio.

Embora figure como responsável por esses cinco casos, desde setembro do ano passado o ministro já se declarou impedido, em plenário, em ao menos outros três julgamentos de interesse da OAS. Esses casos não estavam sob relatoria dele.

Para entidades que representam auditores e procuradores do TCU, a situação do ministro denota conflito de interesses, uma vez que ele é investigado por receber pagamentos ilegais de empreiteiras que ele está apto a julgar. Advogados de cinco construtoras, entre elas a Andrade Gutierrez e a Engevix, chegaram a arguir a suspeição e o impedimento de Vital numa auditoria sobre o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), com o argumento de que sua imparcialidade estaria em xeque.

O plenário julgou o caso no mês passado e considerou as alegações improcedentes, seguindo voto do relator, Aroldo Cedraz. Os ministros acolheram os argumentos de Vital, entre eles o de que não fora levado aos autos “qualquer elemento concreto capaz de demonstrar” seu interesse no julgamento do caso, que não envolve OAS e Odebrecht. Cedraz é pai de Tiago Cedraz, advogado investigado na Lava Jato.

Reações. Em nota de dezembro do ano passado, a Associação Nacional do Ministério Público de Contas (Ampcon) pediu que o ministro se afaste não só dos casos relacionados à OAS e à Odebrecht, mas de todos os que dizem respeito à Petrobrás.

A Associação da Auditoria de Controle Externo do TCU (AUD-TCU) também pediu que Vital e outros ministros investigados deixem de julgar processos da Petrobrás, da Eletrobrás e das empreiteiras, até que os inquéritos sejam concluídos.

A presidente da AUD-TCU, Lucieni Pereira, diz que os ministros da corte atuam como juízes e têm as mesmas prerrogativas e impedimentos dos integrantes do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Para ela, também são aplicáveis a eles os preceitos éticos da magistratura, que impõem conduta que contribua para “fundar a confiança” da sociedade nos julgamentos.

Investigação. Vital do Rêgo é suspeito de cobrar ‘pedágio’ para proteger empresas em CPI

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Suíça nega repatriação a ex-diretores da Petrobrás

Jamil Chade

08/05/2017

 

 

A Justiça suíça negou repatriação de dinheiro bloqueado de ex-diretores da Petrobrás investigados pela força-tarefa da Operação Lava Jato no país europeu ao Brasil. Na quinta-feira passada, os procuradores revelaram que ao menos três ex-gerentes da estatal repatriaram propinas por meio do programa do governo brasileiro.

Nos documentos obtidos pelo Estado há indicação apenas de que os suspeitos seriam funcionários de alto escalão da estatal, que, por anos, mantiveram empresas offshore para camuflar a identidade dos beneficiários dos recursos depositados.

No total, a Suíça já congelou cerca de mil contas bancárias relacionadas com a operação, no valor aproximado de US$ 1 bilhão.

Pelo menos 60 processos criminais foram abertos pelo Ministério Público.

Batizada de Asfixia, a 40.ª etapa da Lava Jato prendeu três ex-gerentes da área de Gás e Energia da Petrobrás, suspeitos de receber cerca de R$ 100 milhões em propinas de empreiteiras que mantinham contratos com a petrolífera. “O argumento evocado pelo recorrente era o de suspender parcialmente o sequestro (de seus ativos) para lhe permitir fazer parte do programa de anistia fiscal no Brasil”, apontou o Tribunal Superior da Suíça. Em apenas dois parágrafos, a autoridade local rejeitou o argumento.

Justificativa. De acordo com advogados em Genebra, o programa de repatriação de recursos do governo brasileiro foi um argumento usado por diversos donos de contas bloqueadas.

Eles alegavam que nem todo o dinheiro depositado era de origem criminosa e que, portanto, deveriam ter o direito de se beneficiar do programa de repatriação do governo do Brasil.

Por meio da iniciativa, a Suíça foi o país que mais enviou dinheiro ao Brasil de contas secretas, cerca de US$ 3,5 bilhões, segundo o Banco Central.

Os primeiros bloqueios de contas ligadas a ex-diretores da Petrobrás são de outubro de 2015. Em junho do ano seguinte, as defesas deram início a recursos para repatriar dinheiro.

De acordo com o tribunal suíço, as alegações “não continham a motivação mínima” necessária para convencer os juízes a liberar o dinheiro. “Sobretudo porque não existiam explicações detalhadas”, indicou.

Em março deste ano, há registro da rejeição de um recurso para desbloquear contas. “Uma relação bancária na Suíça foi identificada e um procedimento penal foi aberto por lavagem de dinheiro”, dizem os documentos do tribunal. “Não se exclui que esses recursos tenham uma ligação com as atividades criminais investigadas no Brasil”, completou a corte suíça, negando reivindicação do suspeito de usar o programa de repatriação de recursos.

 

O Estado de São Paulo, n. 45128, 08/05/2017. Política, p. A4