À Polícia Federal, Joesley confirma teor da delação

Fabio Serapião, Andreza Matais e Alexa Salomão

17/06/2017

 

 

Empresário presta novo depoimento no inquérito no qual o presidente Michel Temer é investigado; peemedebista recebe ex-presidente do Supremo e avalia reforçar sua defesa

O empresário Joesley Batista, principal acionista do Grupo J&F, prestou um novo depoimento à Polícia Federal na manhã de ontem no inquérito em que o presidente Michel Temer é investigado pelos crimes de corrupção passiva, obstrução de Justiça e organização criminosa. Ele reafirmou aos investigadores da Operação Patmos as declarações prestadas no âmbito do seu acordo de delação.

O depoimento de Joesley e outros prestados nos últimos dias pelo corretor Lúcio Bolonha Funaro, pelo ex-assessor de Temer e ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) – também alvo do inquérito – e pelo diretor jurídico da J&F, Francisco de Assis, serão usados na denúncia a ser oferecida pelo procurador-geral Rodrigo Janot contra o presidente.

Em entrevista à revista Época que passou a circular neste fim de semana (mais informações na página ao lado), Joesley acusa Temer de ser o “chefe da Orcrim (organização criminosa)”.

Temer dedicou os dias que antecedem sua viagem à Rússia e à Noruega, a partir de segunda- feira, para reforçar sua estratégia jurídica. Anteontem, ele recebeu, no Palácio do Jaburu, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Carlos Velloso e o ministro da Justiça, Torquato Jardim.

Velloso, segundo auxiliares do presidente, poderá “auxiliar” na sua defesa, conduzida formalmente pelo advogado Antonio Cláudio Mariz de Oliveira. “Conversamos sobre temas variados, mas prefiro não comentar. Até porque ele (Temer) pode querer me contratar para figurar como advogado, embora eu considere que ele está muito bem servido com o doutor Mariz”, disse Velloso ao Estado.

Após o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo, aumentar o prazo para encerrar o inquérito, a PF deve concluir a investigação no início da próxima semana. Com a investigação conclusa, Janot terá mais cinco dias para oferecer a denúncia. A expectativa entre procuradores é de que ele use todo o tempo disponível e protocole a acusação formal no STF até a sexta-feira, dia 23.

Oitiva. Joesley foi chamado novamente pela PF para esclarecer os fatos relacionados ao presidente e Loures. Na oitiva, o empresário também foi questionado sobre os repasses para o deputado cassado e ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

O delator reiterou aos delegados da PF que gravou Temer e que após a conversa repassou valores a seu ex-assessor para ter privilégios no governo. Loures foi filmado pela PF levando uma mala com R$ 500 mil entregue por um executivo da JBS, que integra a holding J&F. Sobre os pagamentos a Cunha e Funaro, o delator disse que os repasses tinham como finalidade manter o silêncio dos dois.

Ouvido pela Polícia Federal anteontem, o corretor confirmou ter atuado como operador financeiro do PMDB da Câmara, grupo político de Temer.

Em meio a negociação de um acordo de colaboração premiada, Funaro prestou dois depoimentos no inquérito aberto no Supremo. Ele contratou recentemente o advogado Antonio Figueiredo Basto, especialista em delação, e já teria entregue uma proposta à PGR. No material encaminhado aos procuradores da Lava Jato, Temer figura como principal alvo.

Segundo apurou o Estado, Funaro respondeu nos depoimentos a perguntas sobre doações de campanha e sobre o ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB-BA). Em relatório, a Polícia Federal concluiu que Geddel atuava com Funaro e Cunha para facilitar a liberação de empréstimos da Caixa Econômica Federal em troca de propina. Geddel também foi apontado por Joesley como porta-voz de Temer.

Funaro está preso no Presídio da Papuda, em Brasília. É acusado, junto com Geddel, de envolvimento em esquema de intermediação do FI-FGTS, fundo mantido com recursos do trabalhador e gerido pela Caixa.

Em nota, a assessoria da Presidência da República disse que Temer só tem conhecimento de doações legais ao partido.

O advogado de Geddel, Gamil Föppel, qualificou de “inservíveis as especulações sobre o depoimento de Funaro”. Ele disse que Geddel “jamais praticou qualquer ilegalidade” e “permanece absolutamente convicto de que ninguém poderá, comprovadamente, enredá-lo em qualquer contexto de ilicitude – ao menos, sem que se valha de inverdades e de sofismas”.

A assessoria do Grupo J&F afirmou, também em nota, que “o mecanismo de colaboração com a Justiça está permitindo que o Brasil mude para melhor”.

Temer ficará cinco dias no exterior durante a viagem a Moscou e Oslo. Durante esse período o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), vai assumir a cadeira presidencial.

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Recibos de offshore foram apreendidos com coronel

17/06/2017

 

 

A Polícia Federal encontrou 17 recibos relacionados a uma offshore na casa do coronel aposentado João Baptista Lima Filho, amigo do presidente Michel Temer e alvo da Operação Patmos. Os investigadores vão agora apurar a origem dos documentos.

Os recibos foram recolhidos na residência de Lima Filho, durante busca e apreensão, em São Paulo. A operação foi realizada em maio deste ano – a Patmos, que tornou Temer investigado por corrupção passiva, obstrução de Justiça e organização criminosa, foi deflagrada no dia 18 de maio.

Lima Filho passou a ser investigado após a delação de Joesley Batista, acionista do Grupo J&F, apontá-lo como responsável por receber parte dos valores de propina supostamente destinada a Temer. Os recibos são relacionados a offshore Langley Trade Co. S.A.

Na Receita Federal, a Langley está registrada como empresa domiciliada em Montevidéu, Uruguai. No banco de dados do Panamá Papers, do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, que teve participação de repórteres do Estado, o endereço está atrelado a uma série de offshores em paraísos fiscais.

Encontros. No acordo de colaboração dos executivos da J&F, o contador Florisvaldo Caetano de Oliveira, apontado pela JBS como responsável por entregar dinheiro a políticos, relatou ao menos dois encontros com Lima Filho.

O primeiro, segundo Oliveira, teve como objetivo conhecer o destinatário, chamado de “coronel”, e combinar a forma de entrega dos valores. No segundo encontro, o contador afirmou ter entregue R$ 1 milhão em espécie para Lima Filho.

Outro delator, o diretor de Relações Institucionais da J&F, Ricardo Saud, entregou uma série de documentos à Procuradoria- Geral da República mostrando que o endereço citado por Oliveira era o da empresa Argeplan Arquitetura e Engenharia, cujo dono é o amigo de Temer.

A Argeplan integra um consórcio que ganhou concorrência em 2012 para executar serviços na Usina de Angra 3. As obras são investigadas na Lava Jato.

O Estado procurou Lima Filho na Argeplan por telefone, mas foi informado de que a empresa não operou e não haveria ninguém para responder. / F.S.

 

O Estado de São Paulo, n. 45168, 17/06/2017. Política, p. A4