‘Sempre pela garagem, viu?’, diz Temer a Joesley

André Borges, Carla Araújo, Julia Affonso, Luiz Vassallo e Fabio Serapião
28/06/2017
 
 
PRESIDENTE ACUSADO / PF revela trechos de áudio antes inaudíveis entre presidente e dono da JBS; ‘Gravação transpira irregularidades’, rebate perito da defesa

Perícia do Instituto Nacional de Criminalística (INC), ligado à Polícia Federal, recuperou trechos da conversa entre o presidente Michel Temer e Joesley Batista, dono da JBS, na noite de 7 de março, no Palácio do Jaburu. Em um desses trechos, até então inaudíveis, Temer faz uma recomendação ao empresário: “Sempre pela garagem, viu?”.

A frase consta da perícia da PF após um “pente-fino” sobre o arquivo gravado em um pen drive que foi entregue como parte da delação de Joesley. Naquela noite, Joesley e Temer se reuniram por cerca de 40 minutos.

Na metade do encontro, de acordo com o trecho recuperado, o executivo diz ao presidente: “Eu, eu prefiro combinar assim, ó: se for alguma coisa que eu precisar, tal, então eu falo com Rodrigo, se for algum assunto desse tipo aí...”.

Rodrigo a quem Joesley se referia era o ex-assessor especial do presidente e ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR). Temer e seu aliado foram denunciados pelo procurador- geral da República, Rodrigo Janot, por corrupção passiva.

Loures está preso. A gravação feita por Joesley é um dos pilares da denúncia de Janot contra Temer.

O advogado do presidente, Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, afirmou que vai contestar o uso das gravações como prova, uma vez que diferentes laudos apontam que houve interferências.

“O mesmo laudo que fundamentou a peça acusatória e afirma não haver edição comprova a existência de 180 paralisações.

Três outros peritos confirmam haver adulteração”, disse Mariz de Oliveira. “Contestamos, portanto, a autenticidade da gravação.

Dessa forma, o áudio não pode ser considerado como prova de responsabilidade penal.” Mariz de Oliveira afirmou que, mesmo que fique provada a legitimidade da gravação, “ela não poderá ser considerada como prova de culpa”. “Seu conteúdo não demonstra nenhuma prática de crime por parte do presidente, assim, repele-se veementemente a acusação de corrupção”, afirmou. “Ademais, saliente- se: a utilização de uma gravação por um dos interlocutores é prova ilícita, salvo tenha sido feita para a defesa de quem a gravou, o que não é o caso.”

Perito. O perito Ricardo Molina, contratado pela defesa de Temer, partiu para o contra-ataque. Ele desqualificou o trabalho da PF e disse que o áudio “continua a ser imprestável”. Segundo Molina, o laudo é “cheio de evasivas, nunca é conclusivo nem categórico”. “Essa gravação transpira irregularidade”, declarou o perito, afirmando que 6 minutos e 18 segundos da gravação, equivalentes a 23% da conversa, foram suprimidos.

“Em nenhum momento, a PF provou que a gravação é autêntica.” A perícia da PF, no entanto, afirma que a análise do áudio “afastou a ocorrência de qualquer forma de adulteração, atestando, assim, a legitimidade plena da prova para a instrução criminal”.

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STF decide hoje sobre revisão de acordos

Rafael Moraes Moura  Breno Pires

28/06/2017

 

 

Superada a discussão sobre a relatoria do caso JBS, mantida com o ministro Edson Fachin, o julgamento no STF sobre os acordos de delação premiada deverá se concentrar hoje na discussão sobre a possibilidade de revisão das cláusulas de colaborações já homologadas. Entre os ministros que já votaram, Ricardo Lewandowski foi o único a se manifestar favorável à possibilidade de revisão.

O julgamento será retomado com o voto de Gilmar Mendes, dois dias depois de o procurador- geral da República, Rodrigo Janot, apresentar denúncia contra Michel Temer. Gilmar fez duras críticas à atuação do Ministério Público na semana passada, quando começou a discussão sobre os limites de atuação do magistrado nos acordos de delação.

“A Procuradoria pode muito.

Mas pode tudo? É isso que a lei autoriza?”, questionou Gilmar.

“Me parece que nós temos de esclarecer o que se pode fazer, sob pena de ficarmos em platitudes.” No STF, a expectativa é de que Gilmar faça um voto longo e contundente. Ele já reconheceu que o caso da JBS é “ainda mais delicado”, por causa da concessão de imunidade penal aos delatores.

Como informou o Estado no sábado, integrantes da Corte dizem acreditar que o STF vai impedir a revisão de acordos.

 

O Estado de São Paulo, n. 45179, 28/06/2017. Política, p. A7