Reservas em dólar custam 2% do PIB ao Brasil

Assis Moreira

01/09/2017

 

 

Um estudo encomendado pelo banco do Brics alerta para riscos e custos para os emergentes com a acumulação de reservas internacionais em dólar. Calcula que o Brasil teve custo anual equivalente a cerca de 2% do PIB com a detenção de títulos do Tesouro americano em 2014. Entre os outros membros do grupo, esse custo variou entre 0,7% e 2,5%.

O documento, preparado por consultores externos foi submetido pela instituição, chamada oficialmente de Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), como uma contribuição para a cúpula dos líderes dos cinco grandes emergentes, de domingo a terça-feira em Xiamen. O banco ressalva que as opiniões não devem ser entendidas como sua posição oficial.

Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul constituem mais de 40% da população global e seu peso econômico combinado em 2015 equivalia a 30,1% do Produto Interno Bruto (PIB) em termos de Paridade de Poder de Compra (PPC), comparado a 18,2%, para os EUA, e 19,1%, no caso da Europa.

Intitulado “O Papel do Brics na Economia Mundial e Desenvolvimento Internacional”, o estudo, coordenado pelo economista indiano Sanjay G. Reddy, professor da New School University, de Nova York, prevê que nos próximos cinco anos os países do Brics como um todo deverão continuar a ser o principal motor do crescimento econômico mundial. A expansão do PIB per capita desses países poderá ser quase o dobro da taxa da economia global, e reflete sobretudo a atividade da China e Índia, algo que o estudo não diz.

Para os autores, o Brics emerge como novo centro de gravidade do sistema econômico internacional e, levando-se em conta a maior importância de relações econômicas entre os cinco membros e outros emergentes, cria-se uma oportunidade para o grupo insistir em nova arrumação da governança global, “mais propícia ao crescimento e ao desenvolvimento”.

Segundo o estudo, medidas para reforçar o uso de moedas alternativas de reserva são possíveis pelo maior vínculo econômico entre os emergentes. Aponta a necessidade de iniciativas para incluir “pool” de reserva para se defenderem em casos de choques externos, novos bancos multilaterais de desenvolvimento e novos princípios para a governança da dívida soberana, entre outros.

A China e a Rússia têm sido especialmente ativos no Brics na defesa do uso das respectivas moedas no comércio com outros emergentes, algo recebido sem entusiasmo pelos parceiros até agora.

Para o estudo, três características do sistema monetário internacional atual – papel central de fato para o dólar americano como moeda principal de liquidação e reservas internacionais, flexibilidade e escolha nas políticas cambiais nacionais e medidas de abertura comercial e de contas de capital – criam riscos e custos consideráveis, particularmente para os emergentes, cujas moedas não são amplamente aceitas como reservas.

Estima que isso incentiva desequilíbrios internacionais que exacerbam ciclos financeiros e encorajam desigualdade e distorções no processo de crescimento. E acha que o sistema dá responsabilidades e influência desproporcionais às autoridades monetárias durante períodos de instabilidade financeira.

Destaca que o fato de o financiamento internacional do comércio e o desenvolvimento econômico se apoiarem principalmente no dólar americano deixa companhias e governos dos emergentes expostos a desajustes monetários e a riscos associados à evolução nos mercados de crédito e financeiros dos EUA. Ilustra com a vulnerabilidade provocada pelo choque da alta de juros de 1979 na economia dos EUA e em 2008 pela crise financeira iniciada também no mercado americano.

O documento encomendado pelo banco do Brics calcula que 64% das reservas internacionais oficiais são em dólar americano. E aponta ” uma custosa acumulação de reservas que reflete uma preferência ampla e desproporcional por investidores em ativos denominados na moeda americana”. Afirma que isso beneficia alguns, em particular a economia dos EUA, mas também contribui para o desenvolvimento de desequilíbrios e desigualdades.

Pelo cenário-base do estudo, a economia mundial deve se recuperar da baixa expansão nos próximos cinco anos. Entre 2018 e 2022, projeta taxa de crescimento global de 2,4% ante 1,7% até agora. Já o Brics poderá ter crescimento combinado de 4,7%.

Os cinco grandes emergentes deverão representar cerca de 50% do aumento da renda mundial nos próximos cinco anos em termos de PPC. Por sua vez, os países desenvolvidos vão contribuir com apenas 24% da expansão econômica global.

Um cenário alternativo pode dar um papel ainda mais relevante para o grupo do Brics, no caso de crescimento apoiado em investimentos. A participação do Brics no comércio internacional quase triplicou nos últimos 20 anos, evidentemente emrazão da China. As importações e exportações dos cinco emergentes devem continuar em alta, mesmo com uma desaceleração no comércio global.

A fatia dos EUA na produção mundial em termos de PPC é projetada para declinar entre 2017-2030, de 18,2% para 15%. Na Europa e em outros desenvolvidos, a queda será de 3,8 pontos percentuais. Em contraste, a fatia do Brics poderá crescer de 30,4% para 37,7% no mesmo período, segundo o estudo.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4332, 01/09/2017. Especial, p. A12.