Artimanhas contra Temer. Pode, Cármen Lúcia?

Fábio P. Doyle

03/07/2017

 

 

É, como dizia o poeta, uma “dança que cansa” este clima de crise, de denúncias, de corrupção, de delações suspeitas premiadas em excesso, de escamoteação da verdade, do direito, da ética, da justiça, da esperança de todos nós, povo. O que fazer? Tocar o bonde, como nos bons tempos em que eles “subiam Bahia e desciam Floresta”. O bonde, esta semana, como nas anteriores e nas que virão, vai andar nos trilhos de Michel Temer, o presidente, e de Rodrigo Janot e Edson Fachin, o procurador-geral e o ministro relator no STF da Operação Lava-Jato.

Temer, o vice que assumiu depois do desmoronamento da barragem de rejeitos de Dilma Rousseff, pode ter cometido deslizes, digamos assim, pois menos agressivo, no correr de sua longa e vitoriosa (quem chega a presidente é perdedor?) vida pública. Afinal, político e empresário praticarem malfeitos era a praxe, até Sérgio Moro surgir no meio do caminho para sustar a manada corrupta. Deslizes que deveriam ter sido punidos à época. Mas nem ele, nem todos os iguais em deslizes o foram, pois Moro, repito, veio depois.

No percurso do tal bonde da sorte, aconteceu de Temer virar presidente, com a missão de salvar o Brasil dos efeitos do desmoronamento dilmítico e lulítico. Ele percebeu a chance que a história, o destino, a sorte lhe estavam proporcionando. Reuniu a melhor equipe da área econômica, no que seguiu a trilha aberta pelo incorruptível mineiro Itamar Franco — pai do real, moeda que ele ousou lançar e sobrevive até hoje — e passou a cuidar da economia como meta principal. Com Henrique Meirelles, vem conseguindo realizar o que planejou: entrar para a história como o presidente que, como Itamar, salvou a economia e retirou o país do mar de lama e de rejeitos deteriorados em que se afogava. A inflação caiu de mais de 10 — para menos de quatro, o desemprego estacionou, o PIB cresceu, a esperança de dias melhores voltou. Aí surgem os enciumados, os que foram depostos, os FHCs da vida que pretendem derrubar para assumir como salvadores da pátria quase falida. Entra em cena Janot, o procurador-geral. Nos primeiros tempos do mandato, foi muito bem. Parecia querer ajudar Temer a limpar a administração e a salvar as finanças, a economia. Todos nós o aplaudíamos. O sucesso, no entanto, parece lhe ter subido à cabeça. Gostou da notoriedade, da cobertura da mídia, dos aplausos, das homenagens. Gostou e passou a abusar. Virou prócer. Faz pose de gênio, chega todos os dias ao STF com ares de herói de guerra, sorrindo, ajeitando a gravata, distribuindo aceno aos fotógrafos e cinegrafistas.

Foi o seu pecado. Por se julgar infalível, com poder absoluto sobre tudo e sobre todos, acolheu a delação com fita gravada, apesar das 294 interrupções suspeitas, de Joesley Batista, da JBS. Gravação feita sem conhecimento dos gravados, o presidente e um senador, que o consideravam amigo. O que levou o ministro Gilmar Mendes, em sessão no STF, a comentar: “Quem faz esse tipo de gravação criminosa é capaz de tudo, até de colocar pacotes de cocaína no carro de um amigo para denunciá-lo à polícia como traficante”.

Janot concedeu a Joesley e família, com a aprovação do ministro Fachin, absolvição plena e total por todos os crimes por ele cometidos. Decisão que, infringindo o princípio da razoabilidade, provocou revolta geral. O Juiz Sérgio Moro, pioneiro, na Lava-Jato, da colaboração premiada, tem sido cuidadoso ao conceder benefícios aos delatores.

Janot ignorou o compromisso de isenção, de rigor ético na análise dos processos que lhe cabe instruir como representante do Ministério Público. É notória sua prevenção, sua antipatia, por alguns dos que lhe incumbia investigar. O principal deles é o presidente da República. Janot, sabe-se lá a razão, não gosta dele. E procura, de todas as formas, atingi-lo. Não apenas nos limites dos autos, mas em declarações que, como membro do Poder Judiciário, não deveria fazer, em entrevistas que não deveria dar. Pesquisa indícios, chamados por Temer de “ilações”, para transformá-los em denúncias formais. Todos os dias, com a ajuda de uma rede de comunicação escancaradamente dedicadada a derrubar o governo, a PGR divulga um malfeito, um suposto delito que atribui ao presidente, a seus ministros, ao seu governo.

Agora, exagerou na antipatia perseguidora. No relatório que mandou ao STF, foi agressivo, duro, desrespeitoso, não apenas com Michel Temer, pessoa, mas com a instituição presidencial. Até um jornalista, um dos 10 ou 12 “soldadinhos” monocórdios e disciplinados na batalha global contra o presidente, ousou comentar na TV das 10 da noite: “Isso, esse desrespeito, nunca aconteceu no país”.

Mas o PGR não ficou só nisso. Fatiou o processo que monta contra Temer em três ou quatro denúncias separadas. Por quê? Para dificultar o trabalho da defesa, retalhando as votações, uma de cada vez, que a denúncia exige para sua aprovação ou arquivamento pela Câmara dos Deputados. Em poucas palavras: o ilustre sr. procurador-geral busca, com manhas e artimanhas, fazer sangrar o presidente Temer para derrubá-lo.

Seria correto, válido, ético agir desse modo? Os ministros do STF isentos, justos, como a sua presidente Cármen Lúcia e outros poucos, não percebem, como todos nós, como toda a imprensa independente, a artimanha praticada, nem cuidam de coibi-la?

(...)

 

 

FÁBIO P. DOYLE

Jornalista e membro da Academia Mineira de Letras

 

 

Correio braziliense, n. 19760, 03/07/2017. Opinião, p. 9.