Correio braziliense, n. 19762, 05/07/2017. Política, p. 2

 

Relator com cara de imprevisível 

Paulo de Tarso Lyra 

05/07/2017

 

 

REPÚBLICA EM TRANSE » Planalto fica preocupado com a escolha de Sergio Zveiter (PMDB-RJ) para a relatoria do processo de corrupção passiva contra Temer na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Defesa deve ser protocolada hoje pelo advogado e lida amanhã

O deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ) foi designado ontem relator do processo por corrupção passiva contra o presidente Michel Temer na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Filiado ao PMDB desde 2016, ele foi eleito pelo PSD e é considerado independente. Isso desagradou ao governo, que o vê como alguém imprevisível. “Eu não tenho medo de pressão. A única pressão que, de vez em quando, me assusta é quando vou ao médico. Mas, graças a Deus, me alimento bem, faço exercícios. Está tudo em ordem”, brincou Zveiter.

O Planalto esperava um nome mais fácil de administrar. Embora filiado ao PMDB, Zveiter não possui um alinhamento automático com o governo. “De todos os nomes que estavam sendo cogitados, Zveiter é o melhor deles, o que dá a chance de que seja feito um relatório mais imparcial”, admitiu o deputado Julio Delgado (PSB-MG). A oposição reclama que o governo quer garantir o apoio com base em liberação de emendas e oferta de cargos.

Um interlocutor do governo amenizou as preocupações com Zveiter. “Ele é independente e tem um conhecimento jurídico consolidado. Esperamos que faça um relatório técnico, porque o discurso político já foi feito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot”, reclamou um aliado governista.

“Foi levado em conta o fato de ser advogado, com profundo conhecimento jurídico, posições independentes de oposição e governo e ter sido presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Rio de Janeiro por dois mandatos”, destacou o presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG). Ele fez suspense ao longo das últimas semanas, aumentando a ansiedade do Planalto e da oposição. Para tentar angariar a simpatia do peemedebista mineiro, o governo nomeou Julio Cesar Andrade, ligado a Pacheco, para a presidência de Furnas. Ainda assim, o presidente da CCJ não cedeu.

Zveiter não quis adiantar se aceitará a demanda da oposição de ouvir, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e o empresário Joesley Batista. Ele afirmou que vai se reunir, a partir de agora, com o presidente da CCJ, a quem caberá definir o rito de tramitação do processo na Comissão.

O relator assegurou que não existe nenhum problema em ser filiado ao mesmo partido do presidente Temer. O parlamentar foi eleito pelo PSD, mas mudou para o PMDB nessa legislatura. “Eu tenho independência para julgar esse processo. Outros nomes também teriam, mas acredito que o fato de eu ter sido presidente da OAB do Rio por duas vezes me credencia para o cargo.” Zveiter afirmou, ainda, que a intenção é cumprir os prazos estabelecidos tanto por Pacheco quanto pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que pretendem concluir o processo na Casa antes do recesso parlamentar, que começa em 18 de julho.

O trabalho será longo, já que levantamentos feitos pelos próprios governistas mostram que o Planalto ainda não tem os votos necessários para barrar a investigação. A estimativa é de que na CCJ os governistas tenham 27 dos 66 votos, e, na Câmara, pouco menos de 70 votos dos 172 necessários para enterrar o pedido de investigação feito por Janot.

O advogado Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, do presidente Michel Temer, vai protocolar hoje a defesa do presidente no processo por corrupção passiva. A expectativa é que a peça seja lida amanhã, quando se abre o prazo de cinco sessões para a apresentação do relatório de Zveiter. “Eu estou aqui para acompanhar o debate do rito, a definição de como vai acompanhar a tramitação do processo”, afirmou um dos advogados de defesa de Temer Gustavo Guedes.

Guedes não acredita que a prisão do ex-ministro Geddel Vieira Lima, na última segunda-feira, possa contaminar a análise do caso. Ele lembrou que, durante o julgamento do Tribunal Superior Eleitoral no processo de cassação da chapa Dilma-Temer, os advogados conseguiram evitar que fatos novos — no caso, as delações dos ex-executivos da Odebrecht — pudessem influenciar o julgamento.

Para Carlos Marun (PMDB-MS), vice-líder do partido, a pergunta que precisa ser feita não é se a prisão de Geddel poderá influenciar o julgamento do caso Temer na Câmara, mas sim se a prisão foi decretada com esse objetivo. “Só vão ficar com medo desse episódio aqueles que temem flechas e bambus ou quem têm medo de ser preso. Eu não tenho medo de uma coisa nem outra”, resumiu Marun.

O calendário acertado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e os demais líderes da base prevê a votação do relatório de Zveiter até a semana que vem e a votação no plenário até 17 de julho, último dia previsto antes do recesso parlamentar.

Maia esteve ontem com a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia. Ele foi avisar que seguirá o rito definido pelo artigo 217 do Regimento Interno da Câmara para a tramitação da denúncia do presidente Michel Temer por corrupção passiva. Maia disse que tomou a iniciativa de procurar a ministra porque sempre há risco de um dos lados envolvidos judicializar a questão. O deputado afirmou, ainda, que “o único ponto que acho que é mais frágil” é o debate da denúncia, que prevê duas manifestações a favor e duas contrárias. “Acho que temos que ampliar um pouco isso, mas vou discutir com lideres da base”, declarou.