O Estado de São Paulo, n. 45255, 12/09/2017. Política, p.A9

 

 

 

Supremo deverá manter Janot à frente de caso JBS

COLABORAÇÃO SOB SUSPEITA / No cargo até o dia 17, procurador-geral sofre desgaste após novos áudios de Joesley Batista e encontro com advogado do empresário

Por: Rafael Moraes Moura / Breno Pires / Beatriz Bulla

 

Rafael Moraes Moura

Breno Pires

Beatriz Bulla / BRASÍLIA

 

Apesar do desgaste do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o Supremo Tribunal Federal não deverá afastá-lo das investigações contra o presidente Michel Temer no caso JBS. A tendência da Corte é manter Janot – que está na sua última semana na chefia do Ministério Público Federal – na apuração, apesar da surpresa causada no STF com os acontecimentos envolvendo áudios de delatores e o encontro do procuradorgeral com um advogado do empresário Joesley Batista.

O Estado apurou que a maioria dos integrantes do Supremo indica que deve acompanhar a posição do ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato na Corte, de não declarar Janot suspeito no caso – no entanto, três dos 11 membros do tribunal entenderiam que o procurador-geral deve ser afastado nesse processo. Também existe a tendência de o Supremo não anular as provas obtidas no acordo de colaboração do Grupo J&F, que controla a JBS, ao menos neste primeiro momento.

No mês passado, Fachin rejeitou o pedido de suspeição do procurador-geral da República formulado pela defesa do presidente. À época, o ministro afirmou que Janot goza de “independência funcional” para elaborar acusações e considerou que um eventual fatiamento de denúncias contra Temer “não indica parcialidade”.

Diante de um recurso apresentado pela defesa do presidente, Fachin decidiu submeter o tema ao plenário da Corte. A presidência do STF colocou o item como o primeiro da pauta de julgamentos de amanhã.

Além disso, Fachin apresentou uma questão de ordem que trata de dois pedidos da defesa de Temer: a suspensão prévia de uma eventual segunda denúncia e questionamentos sobre a validade das provas.

Uma eventual suspensão da nova denúncia contra Temer é considerada um tema mais delicado e complexo, visto por integrantes do tribunal como uma potencial intervenção do STF na prerrogativa de a Procuradoria-Geral da República apresentar uma acusação formal contra o presidente.

 

‘Vexame’. Uma das vozes mais críticas à atuação do procurador-geral, o ministro Gilmar Mendes considera que Janot submeteu o STF “ao maior vexame de sua história” no episódio da homologação da delação do Grupo J&F. “Tudo indica que o STF homologou uma fraude engendrada por (Ricardo) Saud, Joesley, (Marcello) Miller e Janot e sua equipe”, disse o ministro Gilmar Mendes ao Estado.

“A Procuradoria pretendeu fazer do STF um órgão de homologação dos seus malfeitos. A primeira coisa que a gente tem de restabelecer é uma relação de confiança, temos de voltar a reconhecer que a Procuradoria é composta não por delinquentes, mas por pessoas sérias”, afirmou Gilmar.

 

Ex-procurador. A defesa de Temer afirma que Janot tinha ciência de uma negociação informal entre os colaboradores e o então procurador da República Marcello Miller sobre o acordo de delação premiada, antes do início das tratativas oficiais para firmar a delação e de o Supremo autorizar que o presidente da República fosse investigado, o que seria ilegal.

“O procurador-geral da República previamente sabia da intenção dos alcaguetes e os aconselhou, por si e por seus assessores, sobre como agir, inclusive sobre a clandestina gravação do sr. presidente da República por Joesley Batista no Palácio do Jaburu”, diz o advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira. Para a defesa de Temer, os conteúdos noticiados levam à “completa invalidade da prova produzida no bojo das delações”.

 

‘Independência funcional’. Primeiro pedido de suspeição de Janot foi negado pelo STF

 

Minoria

3

ministros, entre os 11 integrantes do STF, entendem que Janot deveria ser afastado no processo.

 

 

 

 

 

PGR é cliente; advogado foi pela 1ª vez a bar

BRASÍLIA / Procurador-geral e defensor de Joesley Batista se encontraram em distribuidora de bebidas
Por: Lígia Formenti / Andreza Matais

 

Lígia Formenti

Andreza Matais / BRASÍLIA

 

O advogado Pierpaolo Bottini nunca havia sido visto na loja que no sábado serviu de palco de encontro com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Encravada em um pequeno centro comercial do Lago Sul, área nobre de Brasília, a distribuidora de bebidas é frequentada por moradores da região. Um perfil bem diferente de Bottini, que vive em São Paulo.

Defensor do empresário do Grupo J&F Joesley Batista, Bottini foi fotografado em uma mesa com Janot um dia depois de o procurador pedir a prisão de seu cliente. A imagem foi veiculada pelo site O Antagonista. Ambos afirmaram que o encontro ocorreu por acaso e que, durante a conversa, assuntos profissionais foram deixados de lado.

Proprietário há seis anos da distribuidora, batizada de Lago Sul, o empresário Cesar Danna afirmou ao Estado ter presenciado a cena. Janot teria chegado antes e se instalado em uma mesa que, naquele dia, estava nos fundos da pequena loja. Segundo Danna, antes de Bottini se sentar à mesa, Janot conversou com outra pessoa, que deixou o local em seguida. Sobre o encontro com advogado, Danna resumiu: “Foi bem rápido”.

O empresário disse que no sábado foi a primeira vez que viu o advogado de Joesley na sua distribuidora. “Eu nunca tinha visto, foi a primeira vez”, afirmou. “Muito político passa por lá, muitos advogados. Lago Sul é onde mora a maioria dos políticos, profissionais liberais. Tem sempre alguém”, disse.

Ao contrário de Bottini, Janot é cliente conhecido da distribuidora. Danna contou ao Estado que ele é visto com frequência na loja. No sábado, teria chegado por volta de meio-dia.

A distribuidora tem quatro mesas à disposição dos clientes, que geralmente ficam à espera de encomendas. Os interessados se servem por conta própria. Não há garçom. A distribuição das mesas também varia. Quando o clima permite, elas ficam do lado de fora. Mas, se o cliente quiser deixá-la nos fundos, para fugir do barulho ou garantir privacidade, a mudança é feita sem problemas. A mesa de Bottini e Janot estava instalada nos fundos da loja. No dia seguinte, não estava mais lá. No local eram vistas apenas algumas caixas e garrafas.

 

Privacidade. Danna disse não se queixar do movimento. Ele contou que são vários os políticos e empresários que vão até o local. Questionado, afirmou que a privacidade dos clientes faz parte do negócio e, por isso, não pode citar nomes, mas emendou dizendo que Janot é sempre reconhecido pelos demais compradores. “Ele às vezes fica em pé, não precisa nem sentar. Muitos o cumprimentam, fazem elogios.”

O empresário atribui o sucesso da loja à localização e à variedade e qualidade das bebidas. A comida não é o forte. Quem busca algo para acompanhar a bebida recorre a um espetinho, vendido nos fins de semana por um conhecido que há anos usa o local. O forte são os espetos de carne, mas também estão disponíveis os de frango. Danna disse que parte dos clientes, atraída pelo sabor da comida, não chega nem a comer no local. Eles pedem e levam para viagem.

 

Frequentador

“Ele (Janot) às vezes fica em pé, não precisa nem sentar. Muitos o cumprimentam, fazem elogios.”

Cesar Danna

PROPRIETÁRIO DA DISTRIBUIDORA DE BEBIDAS LAGO SUL