Correio braziliense, n. 19891, 07/11/2017. Opinião, p. 11

 

A cor da inteligência

Cristovam Buarque 

07/11/2017

 

 

A cada quatro anos, nós de Brasília nos dedicávamos a escolher um novo governador entre candidatos “azuis” ou “vermelhos”. Em 2018, essa simplificação será impossível, devido aos efeitos da Lava-Jato, ao fracasso dos últimos governos, por razões de gestão e de moralidade pública. Com diferentes ênfases, todos esses governos foram perdulários e coniventes, deixando um rastro de falência nas contas públicas, em busca de votos e financiamento para campanhas. Nesse quadro, é melhor definir, em primeiro lugar, o futuro que desejamos para o DF para, em seguida, escolher o candidato e, só então, atentar para a cor da sigla que ele representa.

Desejamos um governo que nos tire das páginas de denúncias policiais e nos coloque de volta nas páginas das boas práticas de política pública, onde estivemos no passado. Para o eleitor, o importante do próximo governador não é a cor da sua sigla, mas a ficha corrida que ele tem, além da competência para transformar em realidade as propostas de campanha. O fundamental é que o próximo governo, com o passado “azul”, “vermelho”, ou “cor do futuro”, tenha compromissos com o futuro do DF.

Primeiro, governe republicanamente nas relações com os deputados da Câmara Legislativa e com os servidores do GDF. Os deputados devem participar, fiscalizando e orientando, mas não serem donos do DF. Os servidores devem estar satisfeitos para servirem bem ao público, mas não serem donos do Tesouro ao ponto de estrangular as finanças do governo, inviabilizando o cumprimento das necessidades de outros gastos e investimentos. As obras devem atender ao interesse do público, e não das empreiteiras e de pressões externas, como no nefasto caso do estádio Mané Garrincha. O próximo governo deve ter comprometimento ético com a austeridade e compromisso político de atender às necessidades da população, mostrando competência para fazer mais e melhor, gastando menos.

Segundo, colocando o interesse do público de hoje e do futuro à frente dos interesses do governador, de seu partido, de parlamentares, de empreiteiros e de servidores, o próximo governo deverá entender que seu serviço não poderá ser realizado sem o Estado, mas não só pelo Estado; deve adotar uma administração cuja gestão, além da eficiência e do foco em resultados, permita maior cooperação público-privada, estabelecendo parcerias com vistas ao interesse do público.

Terceiro, o próximo governador deve olhar as técnicas de gestão que o futuro começa a sugerir, fazendo do Distrito Federal uma unidade com moderna do ponto de vista gerencial. As novas tecnologias da informação permitem não apenas melhorar a administração, tornando-a mais eficaz e proporcionando melhores resultados, visando à qualidade e à eficiência, servindo melhor ao povo.

Quarto, o próximo governador tem que ser o condutor do desenvolvimento para o futuro.  Para isso, deverá ser o formulador de um desenvolvimento sustentável, empregador e solidário, entre pessoas e gerações. Não basta termos um futuro para alguns privilegiados, vivendo ao lado de necessitados, nem um bom presente para nós de hoje, sabendo que nossos filhos e netos terão que migrar para outras regiões ou para outros países em busca de alternativas.

O desenvolvimento para o futuro deverá criar as condições para realizar a vocação do DF como o “Vale do Silício” do Brasil. Temos as bases educacionais, universidades e muitos jovens empreendendo em startups. Para garantir o futuro, esse desenvolvimento deverá ser comprometido com o meio ambiente e ter a necessária convivibilidade entre os brasilienses, sua cidade e sua natureza.

Falta menos de um ano para as eleições e desta vez a cidade precisa ser inteligente desde já, escolhendo o futuro sem as ilusões das cores azul ou vermelha que nos orientavam, iludindo nossas escolhas, já que sabíamos em quem votar pela cor da sigla, e erramos.

(...)

CRISTOVAM BUARQUE

Senador pelo PPS-DF e professor emérito da Universidade de Brasília (UnB)