Correio braziliense, n. 19951, 07/01/2018. Política, p. 4

 

Busca por menos holofotes

Bernardo Bittar e Simone Kafruni

07/01/2018

 

 

ELEIÇÕES » Justiça trabalha para evitar que o julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se torne ato político. Um dos temores é de que as manifestações de grupos favoráveis e contrários gerem violência e destruição

Enquanto militantes e integrantes do PT se mobilizam em apoio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Justiça busca maneiras de evitar que o julgamento se torne um comício. Em 24 de janeiro, a 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região julgará, em segunda instância, o recurso da defesa do ex-presidente no caso do apartamento do Guarujá. Lula foi condenado, em julho de 2017, a nove anos e seis meses de prisão, pelo juiz Sérgio Moro. O petista também é acusado de outros crimes e o futuro da candidatura à Presidência da República está nas mãos da Justiça.

O julgamento será conduzido pelo relator da Lava-Jato na segunda instância, o desembargador João Pedro Gebran Neto, e pelos desembargadores Leandro Paulsen e Victor Luiz dos Santos Laus. A pressão é grande porque, segundo a Lei da Ficha Limpa, candidatos condenados por um órgão colegiado não podem concorrer às eleições e Lula - líder nas pesquisas de intenção de voto - quer voltar ao Palácio do Planalto. Além disso, o PT promete grande mobilização popular. Eventos de apoio foram marcados em todas as unidades da Federação para o próximo dia 13 e eles darão um termômetro de como serão os eventos programados para Porto Alegre a partir do dia 22.

Para evitar transtornos, o tribunal mudou o horário rotineiro dos julgamentos e começará a análise às 8h30. A estratégia de segurança será semelhante à que foi usada em Curitiba, quando Lula prestou depoimento ao juiz Sérgio Moro. Um perímetro de segurança, de cerca de 2km, será feito em volta do fórum para evitar aglomerações e o expediente será reduzido aos funcionários que participarão exclusivamente do julgamento. Todas as corporações, estaduais, municipais e da União foram acionadas para evitar tumultos.

A defesa do ex-presidente solicitou que ele seja ouvido na sessão. A tendência é de que a Justiça não deixe, já que a presença dele é permitida, mas sem direito a manifestação. A intenção é estender a briga até os limites jurídicos, com apelações e efeitos suspensivos. O advogado Cristiano Zanin Martins diz que a estratégia será provar o reconhecimento da nulidade do processo e o cerceamento da defesa por Moro, a quem acusa de ter negado a realização de provas periciais. Zanin diz que a condenação de Lula se baseou no depoimento de Léo Pinheiro, empreiteiro e ex-presidente da OAS e corréu na ação. “A Procuradoria-Geral da República negou à defesa o acesso aos depoimentos sob o fundamento de que as negociações não foram concluídas por falta de comprovação”, afirma.

Placar

Mesmo condenado, Lula poderá entrar com recursos, por isso, o placar é importante. Uma votação unânime, de 3 a 0, impõe um caráter maior de culpabilidade. Para Igor Pinheiro, especialista em direito eleitoral, Lula pode conseguir uma cautelar para suspender os efeitos da condenação. “Isso só será resolvido lá na frente, no Supremo Tribunal Federal (STF). Quando os prazos eleitorais se aproximarem, poderá usar o expediente conhecido como periculum in mora (perigo da demora)”, avalia.

Frase

“Quando os prazos eleitorais se aproximarem, poderá usar o expediente conhecido como periculum in mora (perigo da demora)”

Igor Pinheiro, professor de direito eleitoral

Pendências na Justiça

Veja um resumo das principais acusações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva:

» Tríplex no Guarujá (SP)

Segundo denúncia do Ministério Público Federal (MPF), a construtora OAS destinou um apartamento de três andares no bairro nobre do Guarujá (SP), na beira da praia, à família de Lula. O prédio foi construído por um sindicato, do qual a ex-primeira-dama Marisa Letícia era cotista, que quebrou. A massa falida do edifício foi comprada pela empreiteira, que concluiu as obras e colocou as unidades à venda. O MPF acredita que o apartamento, avaliado em R$ 2,76 milhões, seria dado a Lula pela OAS.

» Acervo presidencial

Investigações apontam que OAS pagou R$ 1,3 milhão à empresa que guardou os presentes que Lula recebeu enquanto presidente da República, entre 2002 e 2010. O acervo presidencial chegou a ser avaliado e a propriedade dele, questionada. O pedido do pagamento teria sido feito pelo presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, e pelo próprio petista.

» Recebimento de Propina

Lula teria recebido R$ 3,7 milhões em propina da OAS “de maneira dissimulada”, segundo o MPF. Só que, em vez de dinheiro, a construtora daria ao presidente o tríplex e o pagamento dos caixotes com o acervo presidencial.

» Influência

Durante os mandatos como presidente, Lula teria usado a influência do cargo para manter na Petrobras os executivos acusados pela Lava-Jato de atuar no cartel que fraudava os contratos da estatal. O MPF afirma que a manutenção de Paulo Roberto Costa, Pedro Barusco e Renato Duque na empresa tinha o intuito de favorecer a OAS e a Odebrecht.

» Benefícios

Consórcios em que a OAS tinha participação conseguiram firmar diversos contratos para a realização de obras, entre elas, a da Refinaria Presidente Getúlio Vargas, em Curitiba, e a da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.