O globo, n. 30701, 27/08/2017. País, p. 8.

 

Por mentira, MPF quer tirar de Delcídio benefícios da delação

Vinicius Sassine

27/08/2017

 

 

A procuradores, testemunhas contestam versão de ex-senador

 

 

A Procuradoria da República no Distrito Federal deve apontar uma mentira do senador cassado Delcídio Amaral (MS) em sua delação premiada e pedir à Justiça que o delator perca benefícios atrelados à colaboração. O Ministério Público Federal (MPF) ainda analisa se pedirá que o corte se dê em relação a todas ou a apenas algumas das vantagens obtidas pelo ex-parlamentar, que era filiado ao PT.

 

Com a delação, Delcídio conseguiu se livrar da prisão preventiva, e passou a cumprir uma espécie de regime semiaberto domiciliar. Além disso, o acordo estabeleceu uma condenação à pena máxima de 15 anos de prisão, “com a suspensão dos demais feitos e procedimentos criminais na fase em que se encontrem quando atingido esse limite”. O MPF também se comprometeu a não pedir medidas cautelares de prisão do senador cassado. O acordo pode ser rescindido “se o colaborador sonegar a verdade ou mentir em relação a fatos em apuração”.

 

 apontamento deve aparecer nas alegações finais do MPF para ação penal em curso na Justiça Federal em Brasília, em que são réus o ex-senador, o ex-presidente Lula, o banqueiro André Esteves, o pecuarista José Carlos Bumlai, o filho dele Maurício Bumlai, além de Diogo Ferreira, ex-assessor de Delcídio, e o advogado Edson Ribeiro Filho. O grupo é suspeito de ter tentado comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, por meio de repasses à família dele. Conforme a delação do ex-senador, o dinheiro foi buscado junto aos Bumlai, com a bênção de Lula.

No curso do processo, o MPF pediu, e a Justiça autorizou, o depoimento de duas novas testemunhas, consideradas peças-chave para confirmar que Delcídio mentiu. Elas participaram da entrega de dinheiro destinado ao senador cassado, mas, ao serem ouvidas, negaram qualquer relação com os Bumlai e disseram que os R$ 50 mil repassados foram, na verdade, um empréstimo solicitado por Delcídio.

 

CORONEL DA PM: REPASSE

A versão do delator na colaboração premiada é que três repasses de R$ 50 mil cada à família Cerveró foram providenciados por Maurício Bumlai e efetivados por Diogo, seu ex-assessor. Diogo também assinou acordo de delação. Ele contou que viajou três vezes a São Paulo para fazer a transação do dinheiro. Nas duas primeiras, de fato, os valores teriam sido providenciados pelo filho de Bumlai. O terceiro repasse, segundo Diogo, no entanto, teria sido orientado pelo coronel da reserva da Polícia Militar (PM) Ângelo Paccelli Rabello e efetivado por Alexandre de Assis. São estes dois últimos que foram ouvidos como testemunhas no curso do processo na Justiça em Brasília.

Ângelo contou que trabalhou por quase oito anos no gabinete do ex-senador. Após deixar a função, fez uma visita ao gabinete do parlamentar no Senado durante a qual Delcídio relatou que vivia uma “situação de emergência” e que precisava de dinheiro para “atender a um amigo com problema de saúde”.

O coronel indicou Alexandre para fazer o empréstimo de R$ 50 mil, ainda conforme o relato à Justiça. “Em nenhum momento o senador disse para quem era (o dinheiro), tratou somente que era uma emergência de um amigo”, disse. Alexandre confirmou o repasse, a partir de um saque do valor em sua conta corrente. Disse ter feito o empréstimo a pedido do coronel e, segundo ele, ainda não recebeu o dinheiro de volta.

A colaboração do ex-parlamentar já foi colocada em xeque por MPF e Polícia Federal (PF), com sugestões de arquivamento de investigações sobre Lula, a ex-presidente Dilma Rousseff e o senador Aécio Neves (PSDB-MG) iniciadas a partir da delação do senador cassado. A Procuradoria Geral da República denunciou Lula e Delcídio por tentativa de obstrução à Justiça na Lava-Jato. O senador cassado entregou documentos que incriminam o ex-presidente na trama para barrar a operação, segundo a denúncia.

Em resposta ao GLOBO, o advogado de Delcídio, Antonio Figueiredo Basto, afirmou:

— Vamos aguardar o que o juiz diz. Vamos resolver muito bem esse processo. Estamos muito bem documentados