O Estado de São Paulo, n. 45313, 09/11/2017. Política, p.A6

 

 

 

 

Assembleia pode soltar deputado, indica TRF-1

Com 3 votos, 2ª Seção da corte segue STF e forma maioria para dar aval a Casa estadual para devolver mandato; julgamento foi suspenso

Por: Breno Pires / Rafael Moraes Moura

 

Breno Pires

Rafael Moraes Moura / BRASÍLIA

 

O Tribunal Regional Federal da 1.ª Região (TRF-1) formou maioria de votos ontem para manter uma decisão da Assembleia Legislativa de Mato Grosso de mandar soltar e devolver o mandato de um deputado preso sob suspeita de obstrução da Justiça. O caso pode criar jurisprudência para que outras cortes avaliem que Casas Legislativas têm a mesma prerrogativa do Congresso de revisar medidas cautelares – como recolhimento noturno, afastamento de cargo e uso de tornozeleira – determinadas pela Justiça contra parlamentares.

O julgamento reflete um “efeito cascata” da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), do mês passado, sobre medidas cautelares contra parlamentares da Câmara e do Senado. Na ocasião, por seis votos a cinco, os ministros concluíram que restrições a deputados federais e senadores pelo Judiciário só podem ser aplicadas após autorização do Legislativo. A decisão beneficiou o senador Aécio Neves (PSDB-MG), que estava afastado do mandato e proibido de sair de casa à noite, por ordem da Primeira Turma da Corte.

A análise do caso do deputado estadual Gilmar Fabris (PSD), que foi preso em setembro, é a primeira na qual o Judiciário se manifesta a respeito da possibilidade de Assembleias revisarem decisões de afastamento e prisão de parlamentares. Em julgamento na 2.ª Seção do TRF-1, a ação está sob relatoria do desembargador federal Ney Bello. A sessão foi interrompida por um pedido de vista da desembargadora federal Monica Sifuentes.

De um total de cinco votos possíveis, três foram por validar a decisão dos deputados de Mato Grosso – de Ney Bello, do desembargador Olindo Menezes e da juíza federal convocada Rogeria Debelli. O Legislativo matogrossense apresentou justamente como argumento a decisão do plenário do Supremo na ação direta de inconstitucionalidade na qual a Corte deu permissão ao Congresso para revisar medidas cautelares aplicadas pela Justiça contra parlamentares.

O Ministério Público Federal recorreu da decisão da Assembleia e pediu a volta de Fabris à prisão. Ainda não há data para a retomada do julgamento.

 

Delação. Fabris foi preso preventivamente por determinação do ministro Luiz Fux, do Supremo, na Operação Molebolge, da Polícia Federal. Citado na delação premiada do ex-governador de Mato Grosso Silval Barbosa, o deputado teria, de acordo com a Procuradoria-Geral da República, tomado conhecimento da operação e deixado a residência antes da chegada dos agentes da PF à sua casa para o cumprimento de um mandado de busca e apreensão.

O relator, Ney Bello, lamentou o fato de a Assembleia ter tomado a decisão antes de um pronunciamento do Judiciário sobre o caso. Ele havia rejeitado conceder a soltura, que tinha sido solicitada pelo próprio Legislativo estadual ao TRF-1. Na visão de Ney Bello, a decisão do Supremo não trazia uma clareza completa e o tema precisava ser discutido em colegiado no tribunal regional.

No entanto, o relator concluiu que a decisão do Supremo sobre parlamentares federais deve ser estendida também aos deputados estaduais. “Voto por declarar a perda de objeto do pedido da Assembleia Legislativa, porque o deputado já voltou à atividade, e por negar o pedido de recaptura e reencarceramento feito pelo STF, considerando que esse é posicionamento do STF”, disse. “Há um custo político disso. A Assembleia que assuma este custo”, afirmou Ney Bello. Para o advogado José Eduardo Alckmin, que representa Fabris, a situação nos Estados deve ser considerada a mesma em relação a parlamentares federais.

 

Caso. O deputado estadual Gilmar Fabris (PSD) foi preso preventivamente em setembro

 

Relator

“Voto por negar o pedido de recaptura e reencarceramento feito pelo STF, considerando que esse é posicionamento do STF. Há um custo político disso. A Assembleia que assuma este custo.”

Ney Bello

DESEMBARGADOR DO TRF-1

 

PONTOS-CHAVE

Decisão do STF beneficiou Aécio Neves

Ministro

Em 3 de outubro, o ministro Edson Fachin rejeita mandado de segurança da defesa de Aécio Neves contra seu afastamento das funções parlamentares.

 

Supremo

No dia 11, o plenário do STF decide que cabe ao Judiciário aplicar medidas cautelares a parlamentares, mas a decisão deve passar pela análise do Legislativo.

 

Senado

Com a definição do STF, no dia 17, a maioria dos senadores decide derrubar as medidas cautelares contra Aécio impostas pela Primeira Turma.

 

 

 

 

 

Com delações, País se viu no ‘espelho’ e ‘não gostou’, diz Wesley

Em depoimento à CPI Mista da JBS, sócio do grupo afirma que delator que fala a ‘verdade’ é ‘perseguido’ e ‘punido’
Por: Renan Truffi / Fábio Serapião

 

Renan Truffi

Fábio Serapião / BRASÍLIA

 

O sócio da JBS Wesley Batista disse ontem que colaboradores da Justiça estão sendo “punidos” e “perseguidos” por dizerem a “verdade”. Detido por suposta prática do crime de “insider trading” – uso de informação privilegiada para lucrar no mercado financeiro –, Wesley afirmou que as delações premiadas fizeram o País se “olhar no espelho”, mas o resultado foi que não se gostou do que viu.

“Estamos vivendo um imenso retrocesso daquilo que esperávamos ser um profundo processo de transformação do País. O que vejo são colaboradores sendo punidos pela verdade que disseram. As delações fizeram o País se olhar no espelho. Como não gostou do que viu, o resultado tem sido colaboradores presos e delatados soltos”, disse o empresário.

As declarações foram dadas em sessão no Senado da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPI) da JBS, instaurada por deputados governistas em reação às afirmações feitas nas delações pelos empresários da JBS, que implicavam, entre outros políticos, o presidente Michel Temer.

Ao firmarem o acordo de colaboração, em maio, os irmãos Batista negociaram o perdão judicial como contrapartida. Em setembro, no entanto, após suspeitas de irregularidades na delação, a própria ProcuradoriaGeral da República pediu a anulação do benefício. No mesmo mês, eles foram presos preventivamente sob suspeita de terem lucrado com informações privilegiadas ao executar operações no mercado financeiro nos dias que antecederam a delação.

À CPI, Wesley afirmou ainda que não se arrepende de ter colaborado com a Justiça, mas disse ter descoberto que o processo é “imprevisível”. “Se tornar colaborador não é fácil, é solitário, dá medo e causa muita apreensão. Hoje, na condição em que me encontro, descobri que é um processo imprevisível e inseguro para quem decidiu colaborar. Mas continuo acreditando na Justiça”, disse o empresário. Em seguida, passou a usar o direito de ficar em silêncio a cada pergunta feita.

 

Ameaça. O senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), presidente da CPI Mista, reagiu à estratégia do empresário de ficar em silêncio. O parlamentar afirmou ontem que vai pedir o cancelamento dos acordos de colaboração premiada de Wesley Batista, Ricardo Saud e Francisco de Assis e Silva, do Grupo J&F.

“Estamos diante de depoente que tem obrigação de dizer a verdade, sob pena de contrato de colaboração ser rescindido. Esse silêncio pode lhe trazer prejuízos ainda maior”, afirmou o senador.

Em resposta, o advogado de Wesley, Ticiano Figueiredo, disse que os acordos não foram rescindidos e é necessária uma autorização da Procuradoria para que o empresário fale à CPI. “Desde que haja autorização da PGR, ele estará à disposição para esclarecer qualquer um, inclusive Vossas Excelências.”