Correio braziliense, n. 20029, 23/03/2018. Política, p. 3

 

A estratégia até o registro

Paulo de Tarso Lyra e Rodolfo Costa

23/03/2018

 

 

JUSTIÇA » Enquanto adversários criticam resultado favorável a Lula no STF, petistas traçam planos para manter a candidatura até agosto. Nos bastidores, integrantes do partido falam que o ex-presidente será impedido de disputar as eleições pela Lei da Ficha Limpa

A sobrevida dada a Luiz Inácio Lula da Silva pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) poderá ser de seis meses e não apenas de duas semanas, na visão de petistas, aliados e juristas que acompanham o processo do ex-presidente. Embora a concessão da liminar para evitar a prisão valha apenas até a retomada do julgamento, no próximo dia 4 de abril, interlocutores do petista acham que ele conseguirá arrastar a situação até o registro da candidatura, em 15 de agosto, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Acabará, contudo, caindo na inelegibilidade provocada pela Lei da Ficha Limpa. Mas, até lá, manterá o discurso político, passando o bastão para outro petista, como o ex-prefeito Fernando Haddad. “É este discurso que precisamos manter. Ele não aconteceu nem na primeira instância, nem na segunda. Vai acontecer agora no STF, obviamente amparado em questões jurídicas para justificar posições”, apostou o deputado Carlos Zarattini (PT-SP).

O governo não fugiu do debate sobre a saga de Lula para evitar a prisão. O ministro-chefe da Secretaria de Governo, Carlos Marun, evitou entrar no mérito de se um condenado em segunda instância pode ou não ser preso, mas sustentou que o petista é inelegível. Sendo assim, ele avalia que a inelegibilidade fará com que o PT inicie a corrida eleitoral com uma força menor. “Pelo menos inicialmente, a força da candidatura do Partido dos Trabalhadores será menor do que seria no caso de o representante do partido ser o ex-presidente Lula”, disse.

Sem Lula nas eleições, ele avalia que alguns votos que poderiam ir para o petista serão distribuídos entre candidatos da esquerda e da direita. “É possível que alguns desses votos que, hoje, sinalizam e se dirigem ao ex-presidente sejam distribuídos para outros candidatos. Alguns, até de forma surpreendente, migrando até para a direita”, ponderou ele.

O PSDB também se apressou em deixar claro que o resultado de ontem não é um atestado de inocência do ex-presidente. “O STF apenas adiou o prazo para que ele comece a cumprir a sua pena. O que é de se lamentar é que alguém que já ocupou a Presidência da República por duas vezes cause, por sua própria culpa, constrangimentos para o país e para as instituições”, criticou o líder do PSDB na Câmara, Nilson Leitão (MT). “Ter um ex-presidente condenado à prisão envergonha o Brasil. Os melhores ex-chefes de Estado são aqueles que não aparecem no noticiário todos os dias, principalmente no policial”, atacou o tucano.

No momento, tudo o que o PT quer é comemorar a vitória momentânea. E enxerga na própria movimentação dos ministros do STF um sinal de que o habeas corpus será concedido na semana após o feriado da Páscoa. A percepção é de que a votação por 7 a 4 para reconhecer a análise do pedido da defesa foi, na visão dos juristas, “melhor do que o esperado”.

Mas o jogo arrastado quase pôs tudo a perder. O adiantado da hora impediria a análise do mérito. Foi aí que o advogado José Roberto Batochio tirou um coelho da cartola e pediu a concessão de uma liminar para impedir a prisão de Lula na próxima semana, após o término da análise dos embargos pelos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Jornada

Confundiu novamente o jogo, mas conseguiu a obtenção da liminar por um placar mais apertado — 6 a 5. Justamente o placar esperado quando o mérito voltar a ser analisado, daqui a duas semanas. Juristas afirmam que, além do adiamento, Batochio também vingou o PT ao tornar inócua, ao menos por enquanto, qualquer ação dos desembargadores gaúchos ou do juiz Sérgio Moro.

A jornada política petista ainda é longa. Se pode ter adiado o risco da prisão, são quase nulas as chances de Lula ser candidato. É verdade que ele poderá se inscrever no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e, caso tenha a candidatura impugnada, pedir uma liminar ao STF para concorrer sub judice, o que não é simples. Mas o PT não discute, ao menos abertamente, outros planos. Está descartada uma aliança com Ciro Gomes (PDT), Jaques Wagner tem problemas com a Lava-Jato e o partido torce o nariz para o ex-prefeito Fernando Haddad. Existem movimentos para apoiar o ex-ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias. “São especulações gerais ainda”, desconversou um interlocutor da legenda.