O Estado de São Paulo, n. 45388, 23/01/2018. Política, p. A8.

 

Cármen barra posse e expõe divisão jurídica no governo

Carla Araújo/ Felipe Frazão

23/01/2018

 

 

Presidente do STF suspende nomeação de Cristiane Brasil na pasta do Trabalho e evidencia divergências entre AGU e a Casa Civil

 

 

Ao suspender temporariamente a posse da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) como ministra do Trabalho, a presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, expôs uma divisão na equipe jurídica do governo Michel Temer. A ministra barrou na madrugada de ontem a cerimônia de posse de Cristiane, que o Planalto planejava fazer horas depois, e evidenciou a divergência entre a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil.

Quando a Justiça Federal de primeira instância deu a primeira liminar contra a posse e anulou sua nomeação, a AGU anunciou que tomaria a dianteira da defesa e pretendia recorrer direto ao STF. Grace, porém, estava em férias. Avançou então a tese de Gustavo Rocha, que estava substituindo o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, também em férias.

Rocha defendia que os recursos fossem ajuizados, primeiro, no Tribunal Regional Federal da 2.ª Região, depois no STJ e, em último caso, no STF. Nos bastidores, governistas calculavam que tanto Cármen Lúcia quanto a ministra Laurita Vaz, presidente do STJ, não autorizariam a posse de Cristiane Brasil. Com Rocha ganhando espaço na defesa, Grace decidiu antecipar o seu retorno ao trabalho. Os recursos do governo, formalmente representados pela AGU, não foram acatados, até a decisão de sábado do ministro Humberto Martins, precedida por uma reunião com Rocha. Depois da audiência, ocorrida na sexta-feira, ele levou a ao Planalto a sinalização de que havia chance de vitória. No sábado, Temer, Rocha, Grace e o ministro da Justiça, Torquato Jardim, se reuniram para tratar do caso.

Por enquanto, a ordem de Temer é que a ministra Grace Mendonça, da AGU, e o subchefe da Casa Civil, Gustavo Rocha, aguardem o prazo de 48 horas dado pela presidente do STF para voltar a analisar o caso. Ele despachou com ambos ontem.

 

Prazos. Cármen Lúcia quer ouvir antes a Procuradoria-Geral da República e ter acesso à íntegra da decisão do vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Humberto Martins, que havia autorizado a posse de Cristiane no sábado. Cármen ainda deu prazo de 15 dias para as partes se manifestarem.

A posse de Cristiane como ministra se arrasta desde o início do ano. Formalmente nomeada por Temer em 4 de janeiro, a posse estava marcada para o dia 9. A deputada, no entanto, foi alvo de ações populares protocoladas por um grupo de advogados do Rio que questionavam a escolha, já que a parlamentar fora condenada em processo trabalhista. Foram esses advogados que ingressaram com a reclamação, acatada liminarmente por Cármen Lúcia, de que o STJ teria usurpado competência do STF ao liberar a posse.

O Planalto reiterou que o governo não pretende recuar na indicação de Cristiane. “O governo tem absoluta convicção de que o direito está a seu favor, o que lhe faz prosseguir na disputa judicial”, disse o ministro Eliseu Padilha ao Estadão/Broadcast. O ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, afirmou que a indicação de um nome alternativo pelo PTB poderia solucionar o caso, mas não está no horizonte do governo. “Seria mais fácil (se PTB indicasse outro nome), mas esse não é o caminho do governo”, disse.

 

Desgaste. A estratégia a ser adotada no caso de Cristiane Brasil não foi a única divergência entre Grace Mendonça e Gustavo Rocha. Outro atrito ocorreu em outubro, quando a Justiça suspendeu o leilão de áreas do pré-sal. Na ocasião, Rocha foi até o Tribunal Regional Federal da 1.ª Região para acompanhar o caso. Oficialmente, esse trabalho era de responsabilidade de Grace. Ambos “disputaram” quem informava antes o presidente sobre o caso.

Apesar de ter sido indicada por Padilha, Grace despacha de um prédio fora da Esplanada dos Ministérios e não tem a vivência palaciana de Rocha, que, como ex-advogado do MDB, ajudou na defesa de familiares do presidente, além de ter aconselhado informalmente na defesa criminal do emedebista. Rocha, em nota, negou “qualquer divergência” com a AGU. A AGU não respondeu./ COLABORARAM TÂNIA MONTEIRO e AMANDA PUPO

 

NOMEAÇÃO EM SUSPENSE

 

PLANALTO DEVE ESPERAR PRAZO DE 48 HORAS PARA ANÁLISE

Suspensão

Após a suspensão temporária da posse da ministra, Planalto reitera que não vai recuar.

Sem alternativa

Marun afirmou que indicação de outro nome pelo PTB não está no horizonte do governo.

Íntegra

Cármen Lúcia quer ouvir a PGR e ter acesso à íntegra da decisão do vice-presidente do STJ.

Aguardo

Ordem de Temer é aguardar prazo de 48 horas dado por Cármen Lúcia para voltar ao caso.

Manifestação

A presidente do Supremo ainda deu prazo de 15 dias para as partes se manifestarem.

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Moro cobra PF sobre algemas e corrente em Cabral

Fabio Serapião/ Constança Rezende/ Luiz Vassallo/ Julia Affonso
 
23/01/2018

 

 

Juíza e força-tarefa da Lava Jato no Rio também pedem apuração do caso; chefe da escolta diz que medida foi ‘necessária’

 

 

O juiz federal Sérgio Moro intimou ontem a Polícia Federal a esclarecer o uso de algemas e correntes nas mãos e nos pés do ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB) na sexta-feira, em Curitiba. Investigação, “em caráter de urgência”, sobre o caso também foi pedida ao Ministério Público Federal no Rio e à PF pela 7.ª Vara Federal Criminal do Rio, em ofício assinado pela juíza Caroline Vieira, substituta do juiz Marcelo Bretas, que está de férias.

A força-tarefa da Lava Jato no Rio também encaminhou aos procuradores do Ministério Público Federal no Paraná ofício em que requer a apuração do caso. No documento, assinado por dez procuradores do Rio, eles afirmam que o ex-governador não é um preso “com histórico de violência física”.

O policial federal Jorge Chastalo Filho, chefe da escolta que conduziu Cabral ao Instituto Médico-Legal de Curitiba, afirmou à PF que o uso de algemas nas mãos e nos pés do ex-governador foi “necessário e coerente”. O ex-governador foi transferido da cadeia de Benfica, no Rio, onde estava preso, para o Complexo Médico-Penal de Pinhais, na região metropolitana da capital paranaense, por ordem judicial. As informações foram repassadas a Moro.

Segundo o chefe da escolta, uma equipe de policiais havia informado naquele dia que, no IML, “havia grande número de pessoas, entre profissionais da imprensa, funcionários, outros presos e populares” e, por isso, havia “necessidade de atenção máxima”. “Foram realizados os procedimentos cautelares necessários, corriqueiros e previamente estabelecidos por este núcleo de operações para condução de preso condenado quando o destino da escolta é local em que não temos o controle de acesso de outras pessoas”, relatou o policial.

 

Súmula. Em 2008, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante 11, batizada de “súmula das algemas”, medida que autoriza o uso do equipamento “exclusivamente em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros”. Moro recomendou que “a escolta seja novamente orientada” sobre a súmula, “evitando-se o uso conjunto de algemas em pés e mãos salvo casos de maior necessidade”.

Em nota, a defesa do ex-governador do Rio disse estar “indignada e estarrecida com tamanho espetáculo e crueldade”. “Sérgio Cabral está proibido de falar, com pés e mãos algemados. Esqueceram apenas de colocar o capuz e a corda”, afirmou a defesa.

 

'Segurança'

“Este núcleo não procura humilhar qualquer preso. Pautamos nossa atuação em dados técnicos visando sempre à segurança do preso, da equipe e terceiros.”

Jorge Chastalo Filho

CHEFE DA ESCOLTA DA PF