O Estado de São Paulo, n. 45389, 24/01/2018. Política, p. A4.

 

TRF julga recurso de Lula contra sentença de Moro

24/01/2018

 

 

8ª Turma da Corte em Porto Alegre analisa hoje apelação contra condenação por corrupção e lavagem de dinheiro; se decisão for mantida, petista pode ficar inelegível e ter prisão decretada

 

 

O Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) abre hoje, a partir de 8h30, em Porto Alegre, a sessão que vai julgar o recurso da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra a condenação a 9 anos e 6 meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no processo envolvendo o triplex do Guarujá, no litoral paulista. A decisão imposta pelo juiz Sérgio Moro, em julho do ano passado, considerou que havia provas de que o imóvel era parte da propina destinada ao petista pela empreiteira OAS. Foi a primeira vez que um ex-presidente da República sofreu condenação por crime comum no Brasil.

As repercussões criminal e política da decisão da 8.ª Turma do TRF-4 geram grande expectativa e mobilizaram grupos pró e contra o petista, que prometem atos na capital gaúcha e em diversas cidades do País. Se a sentença de Moro for confirmada na segunda instância da Justiça, Lula – que lidera as pesquisas de intenção de voto – poderá ficar inelegível e ter a prisão decretada.

O Ministério Público Federal vai pedir o aumento da pena do ex-presidente, enquanto os advogados do petista vão argumentar que a acusação não foi comprovada e ele é inocente. Em caso de confirmação da sentença, a defesa alegará que os crimes estão prescritos e que Moro não é o juiz natural do caso.

Na véspera do julgamento, Lula foi a Porto Alegre em um voo fretado e participou de um ato com militantes do PT e de movimentos sociais. O ex-presidente, como parte da estratégia do PT de intensificar o enfrentamento político, adotou tom de comício e voltou a criticar o mercado, a imprensa, os adversários e o governo Michel Temer. Entre os pré-candidatos à Presidência, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), foi o mais enfático ao comentar o julgamento do TRF-4: “Vamos enfrentar e derrotar o PT, seja quem for o candidato”, afirmou o tucano. Na Suíça, Temer preferiu ressaltar que a análise do Tribunal é uma demonstração da “normalidade institucional” do País.

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Inelegibilidade tem de ser confirmada por cortes superiores

Rafael Moraes Moura/ Amanda Pupo

24/01/2018

 

 

Caso Lula seja condenado em 2ª instância, caberá ao TSE decidir sobre registro da candidatura; defesa poderá ir ao STF

 

 

Após ser julgado no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva dependerá de um aval do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para viabilizar uma eventual candidatura à Presidência da República. Mesmo que seja condenado hoje na segunda instância, caberá à Corte Eleitoral declarar ou não Lula inelegível ao decidir sobre o registro do ex-presidente até o dia 17 de setembro.

A Lei da Ficha Limpa define que serão considerados inelegíveis políticos com decisão de órgão judicial colegiado – como é o caso da 8.ª Turma do TRF-4 – por crimes contra a administração pública e de lavagem ou ocultação de bens, por exemplo.

Mesmo assim, condenados podem requerer o registro de candidatura porque compete à Justiça Eleitoral impugnar ou não o pedido. A discussão pode, eventualmente, chegar ao Supremo Tribunal Federal, a quem caberia dar a palavra final sobre as pretensões do petista de disputar novamente a Presidência.

O Estado ouviu três ministros do TSE, cinco advogados eleitorais e quatro especialistas do meio acadêmico para traçar as possibilidades jurídicas de Lula, que já foi condenado pelo juiz Sérgio Moro por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no processo do triplex do Guarujá.

O consenso é o de que o ineditismo da situação – um ex-presidente da República tentando reassumir o cargo, mesmo na mira da Lei da Ficha Limpa –, a jurisprudência volátil do TSE e as trocas na composição da Corte Eleitoral (três ministros serão substituídos nos próximos meses) lançam incertezas sobre o destino político do petista na arena jurídica.

“Uma condenação do TRF-4 não o deixa automaticamente inelegível, mas cria uma barreira que Lula vai ter de transpor na Justiça Eleitoral. Quem tem competência para reconhecer a inelegibilidade é a Justiça Eleitoral”, disse a procuradora regional da República e professora da FGV Direito Rio Silvana Batini.

O placar do julgamento pelos três desembargadores da 8.ª Turma do TRF-4 traz implicações diretas na próxima etapa jurídica, de acordo com a advogada eleitoral Marilda Silveira. “Em caso de unanimidade (placar de 3 a 0 no TRF-4), ele precisará de uma liminar para suspender os efeitos da condenação. Em um julgamento por maioria (placar de 2 a 1), há precedente afirmando que os embargos infringentes interpostos no TRF-4 suspenderiam automaticamente os efeitos da decisão e, portanto, a inelegibilidade.”

 

Dispositivos. Para o advogado eleitoral Fabrício Medeiros, como os dispositivos da Lei da Ficha Limpa nesse caso são claros e objetivos em relação à inelegibilidade, a discussão a ser travada no âmbito do TSE “deve se circunscrever ao aproveitamento de uma eventual cautelar suspensiva da condenação”. A Ficha Limpa prevê que o candidato poderá obter, em caráter cautelar, a suspensão da inelegibilidade. Para o advogado especialista em Direito Constitucional e Eleitoral Tony Chalita, para concorrer Lula precisa ter alguma decisão que impeça a aplicação do acórdão do TRF4, seja no âmbito do próprio Tribunal, do Superior Tribunal de Justiça ou do STF. Especialistas avaliaram que, mesmo que não consiga essa liminar, Lula ainda poderia fazer o registro de candidatura no TSE até 15 de agosto e começar atividades de campanha. Após abrir prazo para o Ministério Público e partidos adversários se manifestarem, os sete ministros da Corte Eleitoral deverão julgar o pedido até 17 de setembro. “Depois do registro, Lula já pode fazer campanha, pesquisas eleitorais começam a aparecer. A questão-chave é saber até que ponto a análise de contexto vai pesar nas decisões da Justiça”, afirmou o cientista político Fernando Schüler, do Insper.

 

TREs vão definir nomes em setembro

Mesmo se um pré-candidato tiver o registro indeferido pelo TSE, ainda cabem recursos. Em setembro, os Tribunais Regionais Eleitorais do País deverão programar as urnas com informações dos candidatos, inclusive os nomes que irão disputar a Presidência. A carga das urnas deverá ser concluída até 30 de setembro. Se Luiz Inácio Lula da Silva for derrotado no TSE, pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal, a quem caberia dar a palavra final sobre a candidatura do petista.