Título: O poder paralelo de Cachoeira em Goiás
Autor: Sassine, Vinicius: Edson Luiz
Fonte: Correio Braziliense, 02/03/2012, Brasil, p. 7

Empresário da jogatina e suposto comandante de um ramificado esquema criminoso, Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, manteve "laços estreitos" com políticos detentores de foro privilegiado, passíveis de julgamento somente no Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou no Supremo Tribunal Federal (STF). O bicheiro foi responsável pela nomeação de "dezenas de pessoas" para funções públicas em Goiás, estado onde fez nascer e prosperar seus negócios de jogos de azar.

As informações fazem parte da decisão judicial que levou Cachoeira para a prisão. O Correio teve acesso a trechos da decisão, do último dia 28. O bicheiro está preso na carceragem da Superintendência da Polícia Federal (PF) em Brasília desde quarta-feira, quando a PF e o Ministério Público Federal (MPF) deflagraram a Operação Monte Carlo. Foram presas 30 pessoas, entre elas dois delegados da PF, supostamente articuladas em torno dos negócios ilícitos de Cachoeira.

Nas conversas telefônicas interceptadas para a Operação Monte Carlo com autorização da Justiça, aparecem diálogos entre Cachoeira e parlamentares do Senado e da Câmara, como o Correio apurou. As conversas são, em geral, curtas, sem detalhamento do conteúdo a ser tratado. Nos diálogos, Cachoeira marca encontros com os parlamentares. As transcrições dessas falas serão remetidas às instâncias responsáveis por investigar políticos com foro privilegiado: Procuradoria-Geral da República (PGR) e Supremo Tribunal Federal (STF).

A decisão judicial sobre a apreensão de bens e sobre as prisões dos envolvidos traz elementos da influência e dos contatos políticos mantidos por Cachoeira. "É assustador o alcance dos tentáculos da organização criminosa", cita a decisão, assinada pelo juiz Paulo Augusto Moreira Lima, da 11ª Vara Federal de Goiânia.

O MPF de Goiás conduziu as investigações e, por isso, a ordem das prisões e apreensões partiu da Justiça Federal goiana. A PF de Brasília integrou a equipe, em razão do envolvimento criminoso de dois delegados da PF goiana. "Afora o envolvimento de agentes públicos e os crimes objeto da presente cautelar, que serão julgados em primeira instância, foram identificados laços estreitos com políticos e empresários", cita o juiz Paulo Augusto, em referência aos contatos mantidos por Cachoeira.

O magistrado ressalta a influência do bicheiro no governo goiano. "Descobriu-se a influência de Cachoeira na nomeação de dezenas de pessoas para ocupar funções públicas no estado de Goiás." Um dos presos preventivamente na operação policial é o ex-presidente da Câmara de Goiânia Wladmir Garcez. Cabia a ele, conforme a investigação, explorar a jogatina e servir de ponte entre o bicheiro e a Polícia Civil de Goiás. "Ele era utilizado por Cachoeira para contatar o corregedor-geral da Polícia Civil, objetivando obter informações sigilosas", menciona a decisão judicial.

Espionagem Outro investigado preso preventivamente em Brasília é Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, sargento da reserva do Centro de Inteligência do Comando da Aeronáutica. Idalberto é um dos arapongas mais lembrados em Brasília. Ficou conhecido por ter participado de investigações da PF como a Operação Satiagraha. A CPI das Escutas Telefônicas Clandestinas no Congresso chegou a sugerir o indiciamento de Idalberto, em maio de 2009. Conforme a decisão judicial de Paulo Augusto, cabia a Idalberto recrutar pessoas para Cachoeira e obter informações sigilosas. Nos registros da contabilidade do grupo, aparecem pagamentos mensais de R$ 5 mil ao sargento, segundo as investigações.

Permanecem foragidos Lenine Araújo de Souza, sócio de Cachoeira, e Geovani Pereira da Silva, que atuava como uma espécie de contador no grupo. Lenine é apontado pelas investigações como o segundo na escala hierárquica. Ele gerenciava a contabilidade da jogatina em Águas Lindas, Luziânia, Valparaíso e Santo Antônio do Descoberto, todos no Entorno. "Ele fazia pagamentos a autoridades", cita a decisão. Geovani é acusado de fazer o controle financeiro da organização e de constituir uma empresa individual para lavar o dinheiro do jogo. Em 2010, a empresa movimentou R$ 4 milhões, conforme a investigação.