O globo, n. 30865, 07/02/2018. País, p. 4

 

Moraes defende prisão após condenação em 2° instância

Carolina Brígido

07/02/2018

 

 

Ministro do STF vota pela execução da pena em julgamento de deputad

-BRASÍLIA- O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou ontem pela execução da pena depois da condenação confirmada por um tribunal de segunda instância. Ele era o único ministro que ainda não tinha se manifestado sobre o assunto, pois tomou posse em 2017 e o julgamento sobre o tema no STF ocorrera um ano antes. O voto de Moraes foi dado na Primeira Turma, composta por cinco ministros, no julgamento de um recurso do deputado João Rodrigues (PSD-SC), mas não influencia a jurisprudência do tema. Os ministros determinaram, por 3 a 2, a execução imediata da pena de cinco anos e três meses do deputado, imposta pelo TRF-4.

Há expectativa de que a Corte analise novamente em plenário a questão da prisão após decisão de segunda instância, com o voto dos 11 integrantes. Em 2016, por seis votos a cinco, a decisão foi para que as prisões pudessem ser autorizadas. Mas os ministros se dividem quanto à aplicação do que foi votado, com uns autorizando a prisão e outros mantendo os condenados livres enquanto restam recursos.

Diante da indefinição, costura-se nos bastidores uma solução intermediária, com a possibilidade de prisão depois da condenação confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Moraes está entre os que estudam essa alternativa.

— Entendo que a interpretação mais correta deve seguir as normas constitucionais. Nosso esquema de organização da Justiça é de que as provas de uma causa só podem ser analisadas pela primeira e pela segunda instância. Recursos sem efeitos suspensivos não podem congelar o esquema funcional do Judiciário e impedir a efetiva jurisdição — afirmou, completando: — Não se pode afastar outros princípios constitucionais, como o do juiz natural que, por ordem escrita e motivada, determinou a execução. Sua decisão não pode ser transformada em tábula rasa.

O ministro acrescentou que esse entendimento não fere o princípio da presunção de inocência, porque o réu continua tendo direito a recorrer a cortes superiores, mesmo preso. Ele também acrescentou que seu voto não contraria a Convenção Americana de Direitos Humanos, nem a Convenção Europeia de Direitos do Homem.

CENÁRIO INDEFINIDO

O voto de Moraes era considerado decisivo em um eventual novo julgamento sobre o tema. Desde 2016, ministros mudaram de ideia. Moraes entrou no STF, em substituição a Teori Zavascki, morto no ano passado, que votou pela prisão em segunda instância. O novo cenário está indefinido. Há, hoje, quatro ministros que continuam defendendo as prisões após condenação de segunda instância: Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Luiz Fux e a presidente, Cármen Lúcia. Por outro lado, três ministros defendem a prisão somente depois de exauridos todos os recursos judiciais: Celso de Mello, Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski.

Em 2016, Rosa Weber votou com esse grupo, para que o réu recorra em liberdade por mais tempo. Recentemente, declarou que cogita mudar de ideia. No julgamento de ontem, ela não se posicionou sobre o tema pois negou o recurso por questões técnicas. Gilmar Mendes, por sua vez, votou em 2016 pelas execuções antecipadas da pena, mas hoje defende, junto com Dias Toffoli, que a execução só seja determinada após condenação pelo STJ. O argumento deles é que diferentes tribunais que integram a segunda instância podem dar decisões em sentidos opostos, provocando tratamentos distintos para situações semelhantes.

A presidente do STF, Cármen Lúcia, cogitou levar o assunto ao plenário este ano, mas desistiu. Agora, o tema poderá ser rediscutido se algum ministro levar um processo sobre o assunto para o plenário. No ano passado, ministros defendiam que o tema voltasse ao debate. Neste ano, com a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo TRF-4, ministros passaram a considerar ainda mais importante definir logo o assunto, já que estava claro que o tribunal não tinha mais o mesmo entendimento de 2016.

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Na Europa, auxílios a juízes são modestos

Fernando Eichenberg e Bruna Borelli

07/02/2018

 

 

França reduziu a quase zero subsídios de moradia; Portugal paga benefício

-PARIS E LISBOA- A grande maioria dos juízes franceses não se beneficia de quase nenhum auxílio e remuneração extra além do salário mensal. Mesmo os que tinham direito a apartamentos de função tiveram a situação alterada com uma mudança na legislação em 2012. Céline Parisot, secretária-geral da União Sindical dos Magistrados, explica que essa prática foi quase abolida na categoria.

— O decreto de maio de 2012 reviu todas as regras de distribuição dos apartamentos de função, e tivemos de devolver quase todos que tínhamos para uso dos magistrados em 1º de setembro de 2013. Restam hoje apenas uns 30, para um total de cerca 8 mil magistrados no país, e a maioria deles corresponde aos departamentos ultramarinos e à (ilha de) Córsega — afirma Céline Parisot. — E mesmo para os apartamentos restantes não é algo gratuito, os locatários devem desembolsar um certo valor, com desconto em relação ao aluguel de mercado.

A legislação francesa prevê a todos os funcionários públicos, juízes incluídos, um auxílio-moradia para determinados casos. As localidades contempladas são divididas em três zonas, cada uma delas estabelecendo um auxílio de até 3% do salário do juiz beneficiado. Mas, mesmo nestas situações, são poucos os magistrados contemplados, diz Céline.

Já os juízes portugueses têm direito a uma compensação de € 775 por mês como auxíliomoradia. Há um número de casas (não necessariamente mobiliadas) oferecidas pelo Estado, e os juízes podem se candidatar para consegui-las. No caso de não quererem ou não conseguirem os imóveis, eles recebem o subsídio como compensação.

Para os que trabalham e moram no arquipélago dos Açores e na ilha da Madeira, existe um subsídio adicional de € 420 por mês. Os alocados nas ilhas, mas com residências fixas no continente, têm viagens pagas para ver as famílias nas férias ou recebê-las, uma vez por ano. Além disso, ganham passagens para os transportes públicos e acesso às áreas restritas dos aeroportos.

Sem contar o subsídio de compensação, o salário de um magistrado em Portugal oscila entre € 3,3 mil, no início da carreira, e € 6 mil, no topo.

Nos Estados Unidos, como O GLOBO mostrou na edição de ontem, juízes não têm compensações para custear moradia.