O globo, n. 30859, 01/02/2018. Rio, p. 9

 

Corrupção policial na mira da União

Gabriela Goulart e Luiz Ernesto Magalhães

01/02/2018

 

 

Nova fase de Plano Nacional de Segurança prevê criação de corregedoria autônoma e integrada

Depois de inúmeras reuniões, de operações que não mudaram significativamente os índices de violência e da assinatura de um protocolo de intenções, novas diretrizes do Plano Nacional de Segurança Pública entram em prática no Rio a partir da próxima segunda-feira. O grande foco será o combate à corrupção e à “politização’’ nas polícias, compromisso assumido pelo governo do estado e que deverá ser implementado ao longo deste ano — ou pelo menos iniciado. A meta é reestruturar os órgãos de segurança sob a supervisão da força-tarefa multidisciplinar que atua no Rio desde o fim do ano passado.

Na conta do governo federal, ficam bloqueios marítimos (Baía de Guanabara, Baía de Sepetiba e Angra dos Reis) e aéreos (aeroportos), para evitar a chegada de drogas e armas, contando inclusive com a criação de uma Polícia Federal Marítima. Essas medidas complementarão as operações conjuntas já realizadas há alguns meses numa parceria entre as Forças Armadas e a Polícia Rodoviária Federal nas estradas federais que cortam o estado:

— Outro aspecto será a melhoria das polícias, com a criação de uma corregedoria autônoma e integrada — disse o ontem ministro da Defesa, Raul Jungmann, ao fim de sua participação na abertura do seminário “O futuro começa hoje, ações da PMERJ — 2018’’, que acontece na Firjan até hoje.

Por meio de nota, o governador Luiz Fernando Pezão disse que “as corregedorias das polícias Civil e Militar vêm intensificando os trabalhos de combate a qualquer desvio dentro das corporações’.’ Em outro trecho, afirma que “o governo não compactua com irregularidades e vem cortando na própria carne e punindo os maus policiais’.’

Durante seu discurso ontem, Jungmann disse que o modelo de segurança adotado no país está falido devido a mudanças no perfil da criminalidade. Isso porque as ações do crime organizado se nacionalizaram e se transnacionalizaram. Como exemplo, citou a influência que o traficante Antonio Francisco Bonfim Lopes, o Nem, nos conflitos pelo controle de pontos de venda de droga na Rocinha, apesar de estar preso em Porto Velho (RO):

— Nem está a cinco mil quilômetros do Rio. Mesmo assim, declara uma guerra na Rocinha. Isso levou as Forças Armadas a serem convocadas. O sistema também faliu porque o governo federal não tem controle sobre a situação da segurança nos estados, somente em situações extraordinárias, o que não deveria acontecer.

O ministro acrescentou que, em meio à crise econômica, os estados têm enfrentado problemas na segurança pública que levam a União a intervir com a mobilização das Forças Armadas:

— Os problemas se multiplicam. Em 18 meses no Ministério da Defesa, já participei de 11 operações para Garantia da Lei e da Ordem (GLO) em vários estados.

A primeira versão do Programa Nacional de Segurança é de janeiro de 2017, e boa parte das propostas ficou no papel, como revelou reportagem publicada pelo GLOBO, em dezembro do ano passado. Entre as medidas que deixaram de ser implantadas, estavam a criação de Núcleos de Inteligência Policial (Nipo) nos 26 estados e no Distrito Federal. Também não foi à frente o projeto “DNA das Armas”, que buscava melhorar o sistema de rastreamento das armas de fogo apreendidas no país. Um dos motivos foi a falta de recursos.

— Houve um contingenciamento (no orçamento da União) por volta de abril, que foi sendo descontingenciado o ano inteiro. O planejamento para aquele plano era entrar em cerca de 17 estados. Nós ficamos restritos a três estados — disse o secretário-adjunto da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), órgão vinculado ao Ministério da Justiça, almirante Alexandre Mota, em entrevista publicada à época pelo jornal.

PROPOSTAS PARA ESTE ANO

O seminário realizado na Firjan conta com a participação de 220 pessoas, entre militares, especialistas em segurança e nomes da sociedade civil. O objetivo é definir estratégias para melhorar o policiamento no Rio ainda este ano. Ao fim dele, um relatório de propostas — que incluirão metas a serem cumpridas pela corporação — será entregue a Pezão. Ao todo, foram eleitos oito temas para discussões, entre eles absenteísmo na PM; reorganização territorial da presença policial; vitimização policial; indicadores de desempenho; e meritocracia e progressão de carreira.

— Esse seminário é realizado num momento em que o estado está se reestruturando financeiramente. O governador tem o compromisso de contratar policiais assim que for regularizada a situação dos servidores — disse o comandante-geral da PM, coronel Wolney Dias.

O antropólogo Rubem César Fernandes, secretário-executivo da ONG Viva Rio, que realiza o evento em parceria com a PM, ressaltou:

— É uma iniciativa para quem procura esperança. Para sair desse clima de desencanto. Estamos procurando um caminho que demostre ser possível levantar o moral em meio a uma tormenta que estamos vivendo.