Valor econômico, v. 18, n. 4444, 19/02/2018. Brasil, p. A2.​

 

 

Privatização da Infraero volta ao radar e pode render até R$ 17,2 bi

Daniel Rittner

19/02/2018

 

 

Encolhida após a perda de dez grandes aeroportos, mas ainda à frente de terminais lucrativos como Congonhas (SP) e Santos Dumont (RJ), a Infraero agora quer um sócio estrangeiro. A estatal praticamente desistiu dos planos de pulverização do capital em bolsa ao receber um estudo da consultoria alemã Roland Berger, encomendado pela empresa para pensar no futuro de suas operações. O relatório, que acaba de ser apresentado ao governo, sugere a busca por um parceiro externo como melhor alternativa para dar sustentabilidade à estatal.

A venda de 40% a 51% das ações pode render entre R$ 13,3 bilhões e R$ 17,2 bilhões ao Tesouro Nacional, segundo a precificação feita pela consultoria e obtida pelo Valor. Isso representa um ganho potencial aos cofres públicos que supera as estimativas de receitas com o processo de "descotização" de hidrelétricas da Eletrobras (R$ 12,2 bilhões).

Os cenários simulados no estudo envolvem a manutenção do controle da Infraero pela União ou sua transferência para um acionista privado, o que vai requerer uma decisão política e talvez fique para o próximo governo. "Se depender de mim, seremos minoritários", diz o presidente da estatal, Antônio Claret.

Para ele, instrumentos como um bom acordo de acionistas, ou uma "golden share" em posse da União, podem ser suficientes para a continuidade de algumas políticas públicas, como a manutenção de subsídios cruzados entre aeroportos superavitários e deficitários. É esse sistema que garante a operação de aeroportos em lugares remotos do país.

O executivo vê pelo menos cinco gigantes mundiais potencialmente interessados em entrar na Infraero: as francesas Vinci e Aéroports de Paris (ADP), a alemã Fraport, a espanhola Aena e a asiática Changi. Todas trabalham com redes de aeroportos fora de seus países de origem. Algumas já foram procuradas para sondagens preliminares. "Nossa visão é buscar um parceiro que tenha experiência internacional em gestão aeroportuária", ressalta.

Por causa do novo plano, Claret prefere suspender temporariamente a venda de participação minoritária (49%) da Infraero nos terminais concedidos pela ex-presidente Dilma Rousseff - Guarulhos, Brasília, Viracopos, Galeão e Confins. Uma resolução do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), publicada em agosto de 2017, colocou o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) como responsável pela modelagem do processo de venda.

Para o presidente da Infraero, não faz sentido oferecer essas participações isoladamente no mercado e a fórmula mais viável é deixá-las no mesmo pacote de alienação das ações da holding como um todo. "Gera mais valor agregado e evita a perda do que já foi investido nas concessões", afirma Claret. Se isso acontecer, aumenta-se ainda mais o potencial de arrecadação com a venda - total ou parcial - da Infraero.

Depois de mais um leilão, que está previsto para o segundo semestre, a Infraero ficará com uma rede de 45 aeroportos. Terminais como Recife, Vitória e Cuiabá também vão passar para a iniciativa privada. Mas, além de Congonhas e Santos Dumont, ativos rentáveis como Manaus e Curitiba continuarão sendo administrados pela estatal. O estudo da Roland Berger indica que há capacidade de quadruplicar o Ebitda (lucro antes de impostos) da Infraero com intervenções como enxugamento do quadro de pessoal e melhoria da governança.

Claret diz que medidas tomadas recentemente já começaram a surtir resultado. Depois de quatro balanços consecutivos no vermelho, por exemplo, a estatal inverteu um prejuízo operacional de R$ 120 milhões em 2016 para lucro de R$ 505 milhões no ano passado. Houve eliminação de três diretorias, 12 superintendências, 43 gerências e 104 coordenações para cortar despesas.

Outro drama é adequar o quadro de empregados à nova dimensão da companhia. O programa de demissões voluntárias propiciou a saída de 1.051 funcionários em 2017 e de 144 pessoas somente em janeiro. Desde que começou a onda de concessões de aeroportos, no primeiro mandato de Dilma, o número de colaboradores caiu de 14.089 em 2012 para menos de 9 mil atualmente.

Para levar adiante qualquer pretensão de busca por um sócio privado, a Infraero terá que "contratualizar" seus aeroportos. Os terminais jamais foram incorporados ao patrimônio formal da empresa. Por isso, tal como já se faz com os contratos de concessão, ela está pedindo a outorga oficial dos ativos por 25 a 30 anos.

Vindo da iniciativa privada, onde fez carreira na Vallourec & Mannesmann, Claret diz que a venda de ações da Infraero poderia sair bem mais rápido se não fosse a morosidade do setor público. "Faz um ano que estamos tentando expurgar as atividades de navegação aérea e não conseguimos", afirma o executivo, como ilustração do problema. Trata-se de uma referência às torres de controle e estações de telecomunicações mantidas pela estatal. Elas geram um prejuízo anual de R$ 300 milhões e absorvem 1,7 mil trabalhadores. O Comando da Aeronáutica já topou ficar com essa estrutura, o que ajudaria a aliviar as contas da Infraero, mas o plano não avança.

A capitalização da Infraero, mesmo que seja com um sócio minoritário, é fundamental para "sair da mesmice" e permitir investimentos maiores. Claret lembra que obras como reforma e ampliação dos terminais de passageiros de Foz do Iguaçu (PR), Navegantes (SC) e Campo Grande (MS) já estão em licitação ou na fase de desenvolvimento de projetos. Se tudo der certo, e houver disposição do futuro governo, ele afirma, uma "nova Infraero" pode estar funcionando em 2020.