O Estado de São Paulo, n. 45419, 23/02/2018. Política, p. A8

 

Operação da Lava Jato atinge governo do PSDB no Parana

Julia Affonso, Ricardo Brandt e Luiz Vassallo

23/02/2018

 

 

Nova fase, batizada de Integração, abre frente no setor de concessões rodoviárias, prende seis pessoas e cumpre mandados na Casa Civil

A Polícia Federal deflagrou ontem no Paraná a Operação Integração, a 48.ª fase da Lava Jato. A investigação apura a suspeita de esquema de corrupção e lavagem de dinheiro em concessão de rodovias federais no Estado. Perícias realizadas pela PF indicaram superfaturamento de obras e indícios de preços abusivos nos pedágios. Um assessor da Secretaria da Casa Civil da administração Beto Richa (PSDB) foi alvo de mandado de busca e apreensão no Palácio Iguaçu, sede do governo. Richa não é investigado na operação.

Além da Casa Civil, foram alvo ontem da operação a concessionária Econorte, do Grupo Triunfo, agentes do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e do Departamento de Estradas de Rodagem (DER) do Paraná. Ao todo, foram expedidos 50 mandados de busca e apreensão e 6 pedidos de prisão temporária. Primeira operação da Lava Jato em 2018, a Integração alcançou quatro Estados: Paraná, Santa Catarina, São Paulo e Rio.

Foram presos temporariamente o diretor-geral do DER, Nelson Leal Júnior, o agente do DER do Paraná Oscar Alberto da Silva Gayer, o atual diretorpresidente da Econorte, Helio Ogama, o dirigente da empresa Rio Tibagi Leonardo Guerra, o diretor financeiro da Triunfo Participações, Sandro Antônio de Lima, e o empresário Wellington de Melo Volpato.

O assessor da Casa Civil Carlos Nasser teve pedido de prisão feito pelo Ministério Público Federal, mas negado pelo juiz Sérgio Moro, da 13.ª Vara de Curitiba. No entanto, foram autorizadas buscas em seu endereço e ele prestou depoimento. Nasser foi afastado do cargo (mais informações nesta página).

A força-tarefa da Lava Jato suspeita que as concessionárias do Anel da Integração, as rodovias que ligam as principais cidades do Estado, se valiam do mesmo esquema usado para pagar propinas na Petrobrás com o objetivo de corromper agentes públicos do setor de rodovias.

Operadores. O pedido protocolado pela força-tarefa da Lava Jato na Procuradoria da República tem como base investigações relacionadas às atividades de Rodrigo Tacla Duran e Adir Assad, apontados como operadores de propina.

Segundo a PF, a Econorte usou os serviços dos operadores, ambos alvo da Lava Jato em outras operações. Assad está preso e fechou acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República – ainda não homologado –, e Tacla Duran está foragido na Espanha.

“Uma das concessionárias se utilizou dos serviços de Adir Assad e Rodrigo Tacla Duran para operacionalizar, ocultar e dissimular valores oriundos de atos de corrupção. Dentre os serviços prestados por estes operadores está a viabilização do pagamento de vantagens indevidas a agentes públicos”, afirmou a Polícia Federal.

O Ministério Público Federal informou ter identificado “repasses diretos a empresas que estavam em sociedades” a servidores do DER/PR, do Dnit e da Casa Civil do Estado do Paraná. “Os investigadores suspeitam que esses pagamentos eram usados como contrapartida por favorecimentos conferidos à concessionária Econorte na execução do contrato de concessão.”

Dados da quebra de sigilo bancário demonstraram que, entre 2005 e 2015, a Econorte recebeu R$ 2,3 bilhões de tarifas pagas pelos usuários. Deste valor, R$ 343 milhões foram repassados para uma subsidiária integral em contratos de conservação de rodovias. Da subsidiária integral, R$ 110 milhões foram repassados à holding do grupo, que transferiu pelo menos R$ 63 milhões a empresas de fachada ou sociedades cuja prestação de serviços ou entrega de produtos não foi comprovada.

Tarifas. Perícias apontaram superfaturamento nos valores das obras das concessionárias. Segundo apurações, mesmo existindo determinação do TCU e um estudo técnico recomendando a redução da tarifa em 18%, a empresa investigada foi favorecida por dois termos aditivos e um termo de ajuste que aumentaram o valor pago pelo usuário em mais de 25%. Para justificar o aumento, o DER-PR alegava necessidade de reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos.

Segundo a Lava Jato, o diretor-geral do DER, Nelson Leal Júnior, um dos que subscreveram os aditivos com a empresa investigada, adquiriu de forma oculta um apartamento em Balneário Camboriú (SC), no valor de R$ 2,5 milhões, dos quais R$ 500 mil foram pagos em espécie ou com recursos cuja origem não foi identificada.

Investigação​. “Uma das concessionárias se utilizou dos serviços de Adir Assad e Rodrigo Tacla Duran. Dentre os serviços prestados está a viabilização do pagamento de vantagens indevidas a agentes públicos.”

Polícia Federal​. “Investigadores suspeitam que esses pagamentos eram usados como contrapartida por favorecimentos conferidos à Econorte.”

 

Ministério Público Federal

 

 

 

 

 

______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

 

Beto Richa afasta assessor e determina investigação

23/02/2018

 

 

Após a Polícia Federal deflagrar a Operação Integração, o governador do Paraná, Beto Richa (PSDB), afastou o assessor Carlos Nasser até “a completa apuração dos fatos”. Em nota, a Secretaria do Comunicação do Estado afirmou que Nasser ocupava um cargo de “terceiro escalão”, sem “vínculo com o gabinete do governador”.

A força-tarefa da Lava Jato identificou R$ 2,2 milhões depositados nas contas de empresas que pertencem a Nasser. Em depoimento, o assessor da Casa Civil disse que sua empresa “não foi ativa nem obteve valor expressivo”. Nasser não foi preso, mas houve buscas em seu endereço e ele foi ouvido.

A Secretaria de Comunicação do Estado informou ainda que o governador determinou investigação para apurar as eventuais irregularidades apontadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal. Segundo a nota da pasta, a apuração será conduzida pela Controladoria-Geral do Estado.

“Tanto os contratos quanto os aditivos relacionados ao Anel de Integração foram conduzidos pelo Departamento Estadual de Estradas de Rodagem (DER), que é o poder concedente. E todos terminaram submetidos ao crivo da Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Infraestrutura do Paraná, que homologou seus termos”, informou a pasta.

O diretor-geral do DER do Paraná, Nelson Leal Júnior, é suspeito de receber propinas da concessionária Econorte. Segundo a investigação, ele comprou imóvel no valor de R$ 2,5 milhões em Balneário Camboriú (SC). Em depoimento, Leal, um dos presos ontem, disse que comprou o apartamento em 2010 e o vendeu em 2013.

Em nota, Rodrigo Tacla Duran, apontado pela Lava Jato como operador de propina, afirmou que sua “movimentação financeira foi corretamente declarada e os respectivos impostos, recolhidos”.

O Dnit disse que vai acompanhar as apurações e colaborar com as autoridades, adotando as medidas administrativas que forem necessárias. A Econorte não respondeu aos contatos da reportagem. O Estado não conseguiu localizar as defesas dos demais citados. / J.A., R.B. e L.V.

_______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

 

“Gostaria muito de um HC”, apela presa a Gilmar

Luiz Vassallo

23/02/2018

 

 

Habeas Corpus /Detida em Brasília, Rosa Maria diz que não é “da Lava Jato, mas pede liberdade a ministro

O ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes tem sido o destinatário de cartas de uma detenta que pede a ele que lhe conceda um habeas corpus. Condenada por tráfico de drogas e sem recursos para pagar um advogado, Rosa Maria da Conceição apela a Gilmar em uma das cartas: “Não sou uma presa importante da Lava Jato, mas gostaria muito que o senhor me concedesse um HC”.

Rosa Maria afirma que assiste a “todas as entrevistas” do ministro – que já mandou soltar 16 alvos de desdobramentos da Operação Lava Jato no Rio – pela televisão. “O senhor é um homem muito justo (...) Sei que sou uma presa sem nenhuma importância, mas peço ao senhor uma oportunidade de sair e cuidar dos meus filhos”, diz a detenta na correspondência.

De acordo com Rosa Maria, sua filha passa por “problemas psicológicos”. “O pai dos meus filhos é falecido e a situação fica mais difícil para eles e para mim (...) Fico no aguardo de uma resposta positiva.”

A carta, redigida de próprio punho em uma folha de caderno, chegou ao Supremo no dia 10 deste mês. A mensagem, que partiu da Cela 4, Bloco III, Ala C do presídio feminino de Brasília, foi enviada em 6 de janeiro. Uma correspondência anterior de Rosa Maria, com o mesmo pedido ao ministro, é datada de agosto do ano passado.

Apesar da insistência de Rosa Maria para que suas demandas por liberdade cheguem ao gabinete de Gilmar, os pedidos ficaram sob relatoria da presidente da Corte, Cármen Lúcia. A ministra, no entanto, negou seguimento aos recursos e mandou a Defensoria Pública auxiliá-la em sua defesa.

Apesar de um habeas corpus poder ser redigido por qualquer pessoa, ele deve cumprir requisitos, alguns não preenchidos por Rosa Maria, segundo o STF.

Pena. Rosa Maria foi presa em julho de 2012 e cumpre pena de 12 anos e 10 meses em regime fechado. Segundo a detenta relata na carta a Gilmar, sua progressão de pena deve ocorrer em maio deste ano.

Conforme a Secretaria de Segurança Pública e Paz Social do Distrito Federal, Rosa Maria divide a cela com outras 11 internas e “não faz parte das atribuições da Gerência de Análise Jurídica, responsável por acompanhar a execução da pena de cada interno de Execuções Penais sobre o cumprimento dessa pena, ajudar a pessoa que cumpre pena a escrever habeas corpus”.

 

Trecho. Carta de Rosa Maria para o ministro Gilmar Mendes