Título: Instituições arrocham crédito
Autor: Angelo , Ana D
Fonte: Correio Braziliense, 01/04/2012, Economia, p. 10

O crescimento da inadimplência nos financiamentos de veículos obrigou os bancos a fechar a torneira do crédito fácil. A emergente classe C, que teve acesso facilitado nos últimos anos, foi a mais atingida. Hoje, essa parcela da população está fora do mercado, afirmam especialistas e revendedores do setor. O prazo de pagamento encurtou e, agora, só com uma boa entrada. Além da renda três vezes superior ao valor da prestação, as instituições financeiras estão passando um pente-fino na ficha do cliente e uma investigação cuidadosa de todas as dívidas em seu nome.

As instituições estão exigindo renda de pelo menos R$ 3 mil, permanência mínima de três anos no emprego e no mesmo endereço. Antes, eram aprovadas entre 70% e 75% das fichas de clientes enviadas às instituições financeiras. Hoje, esse percentual não passa de 30%, segundo revendedoras de automóveis no Distrito Federal, que viram os negócios despencarem. Os trabalhadores autônomos, de todas as classes, são os que estão tendo a maior dificuldade para obter o financiamento maior.

"Os advogados, corretores de imóveis e demais profissionais que trabalham por conta própria têm uma renda instável. Recebem muito em um mês e nada em outro. Se não fizerem reservas, não têm como pagar. É um risco que os bancos não querem mais correr", afirma o gerente de vendas da concessionária Nissan Grand Premier, Danilo Fonseca.

O aperto na aprovação de crédito para os clientes foi sentido, principalmente, nos últimos três meses. "O carro que era vendido com o valor inteiramente parcelado em até 60 meses, hoje, é dividido em, no máximo, 48 parcelas. Assim mesmo, se o cliente der pelo menos 20% de entrada", afirma o diretor de marcas, Rafael Correa, da concessionária Fiat Saga.

Na revendedora de veículos Star Cia, o baque também foi grande. O gerente de marcas, Alex Lacerda, estima que, nos últimos nove meses, as vendas caíram 40%. A média de aprovação de crédito não ultrapassa os 15% dos clientes. "Muitos que compraram um carro financiado há dois anos não conseguiriam o mesmo crédito hoje. Em 2010, um cliente que ganhasse R$ 900 conseguia financiar um veículo. Mas, com essa renda, não consegue honrar as parcelas e a manutenção de um carro", reconhece. A Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) e a Associação Nacional das Empresas Financeiras das Montadoras não se manifestaram sobre o aumento da inadimplência.

Taxas ilegais Os consumidores também estão enforcados, porque as taxas de juros dos financiamentos são altas, e muitos só olham o valor da prestação. O problema é que o percentual fica sempre mais alto que o informado pelos gerentes e vendedores de concessionárias, como o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), além de outras taxas ilegais que ainda são cobradas. O site do Banco Central informa os juros médios de cada instituição em cada mês, que variam conforme o cliente e o valor financiado. Os percentuais relacionados não incluem o custo do IOF, embutido na prestação.

A supervisora de Assuntos Financeiros do Procon-SP, Renata Reis, alerta que é proibida a cobrança de tarifas administrativas para concessão de crédito, como a famosa Taxa de Abertura de Crédito (TAC), e para emissão de boleto bancário. Desde fevereiro de 2011, o BC proibiu também os bancos de cobrarem a denominada tarifa ou taxa de retorno paga pelas instituições financeiras às concessionárias, como uma espécie de prêmio pela captação do cliente. Ela vem disfarçada de diversos nomes, mas o principal é "serviços de terceiros", com valores entre R$ 1 mil e R$ 2,5 mil, acrescidos no valor financiado.

O Judiciário entende que a cobrança dessas taxas de quaisquer contratos, mesmo de datas anteriores a fevereiro de 2011, é ilegal. É esse o entendimento predominante no Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) e, por isso, cabe revisão dessas cláusulas do contrato. O TJDF considera abusiva também a taxa pela inserção do gravame no cadastro do Detran. "A remuneração da instituição financeira advém do pagamento dos juros remuneratórios, já embutidos nas prestações, de modo que é abusiva a cobrança de abertura de crédito e de inserção de gravame", diz outro acórdão de uma apelação julgada em março de 2011.