Correio braziliense, n. 20095, 29/05/2018. Política, p. 2

 

Governo cauteloso com o fim da greve

Rodolfo Costa

29/05/2018

 

 

CRISE DOS COMBUSTÍVEIS » Após acordo fechado no domingo, Planalto espera o fim do movimento dos caminhoneiros, mas manifestantes ainda mantêm barreiras nas estradas. Governo estuda formas de garantir que a redução do preço do diesel chegue às bombas

Um dia após o governo federal ter aceitado integralmente a pauta de reivindicações dos caminhoneiros para pôr fim à paralisação que já dura mais de oito dias, a avaliação do Palácio do Planalto é de ter conseguido “superar o problema”. “Temos absoluta certeza que a greve não tem mais razão para existir”, disse o ministro chefe da Casa Civil, Carlos Marun. “Caminhoneiros foram muito bem-sucedidos, tiveram atendimento de todas as reivindicações. Inclusive das medidas publicadas em Diário Oficial no dia de ontem (domingo). Cumprimos nossa parte e, agora, esperamos que a outra parte também cumpra com a sua”, disse o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha.

O otimismo, entretanto, esbarra na continuidade de bloqueios em 44% das rodovias federais. Uma das dificuldades é preciso tempo para que as entidades representativas da categoria informem e convençam os manifestantes a se desmobilizar. “As coisas precisam de um tempo para se amoldar. Estamos falando de dias”, afirmou Marun.

Em nota, a Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA) recomendou “conscientização de todos os caminhoneiros para que avaliem com cuidado suas decisões sobre a continuidade ou não da paralisação, sob pena de perdermos essas conquistas históricas da categoria”. Sugeriu, ainda, que todos os caminhoneiros que optarem por continuar a paralisação liberem a circulação de combustíveis de toda espécie, inclusive gás de cozinha, além de leite, produtos destinados à merenda escolar e a hospitais.

Na tarde de ontem, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) anunciou que ainda havia 556 pontos com algum tipo de aglomeração de caminhoneiros, incluindo locais de bloqueio. No início da noite, os números apontavam para 594 pontos de agrupamento, embora nem todos fossem pontos de interrupção do tráfego. O governo comemora que há mais locais liberados do que obstruídos, mas aponta a presença de infiltrados nas manifestações, movimento que dificulta a desmobilização dos protestos (leia mais na página 3). O Planalto  investiga a ação de três grupos — “Intervenção militar já”, “Fora Temer” e “Lula Livre”.  “A PRF conhece as estradas onde trabalha, sabe quem é líder do movimento dos caminhoneiros e sabe das infiltrações políticas. Ela está mapeando e não quer cometer nenhuma injustiça. Com muita cautela, vai começar a separar os infiltrados”, disse Padilha.

Repasse

Outro problema é como garantir que o prometido desconto de R$ 0,46 por litro de óleo diesel chegue às bombas. Como, no Brasil, vigora o regime de liberdade de preços nas etapas de produção, distribuição e revenda de combustíveis, os postos têm liberdade para estabelecer o valor de venda ao consumidor. Para assegurar o preço mais baixo, o presidente Michel Temer determinou ao Ministério da Justiça, Torquato Jardim, que acione os serviços de Proteção ao consumidor (Procons) nos estados. “O presidente pediu ao ministro (Torquato) que baixasse norma para que o Procon possa trabalhar todas as vendas nas refinaria para saber como (a redução) chegará à bomba”, destacou Padilha. O governo não deu maiores detalhes sobre a ideia. Mas a tendência é de que o Ministério da Justiça acione a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) para participar da formulação da norma.

O ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República, Sérgio Etchegoyen, disse que o governo usará “todo o poder de fiscalização” para garantir o repasse do desconto. Mas Padilha prega que os caminhoneiros também devam participar do processo de controle. “O Procon é que vai cuidar disso. Então, todos aqueles interessados deverão, se for o caso, fazer a comunicação ao Procon. O interessado quem é? O caminhoneiro. O caminhoneiro passou a ser o fiscal da observância ou não desse preço. Teremos que ter na bomba a redução de R$ 0,46 desse combustível que venha a ser adquirido a partir de hoje”, ressaltou.

Etchegoyen, Padilha, Marun e mais seis ministros participaram ontem pela manhã de reunião com o presidente Michel Temer para monitorar a situação criada com o movimento dos caminhoneiros. Após o encontro, o chefe da Casa Civil disse que a possibilidade de Pedro Parente deixar a presidência da Petrobras não está em discussão no governo. Ele disse que Parente “mostrou que está literalmente afinado” com a intenção do presidente Michel Temer de recuperar e colocar a estatal entre as maiores empresas do mundo. “Para nós, ele é um gestor eficaz e eficiente”, elogiou. O ministro negou ainda que o governo tenha intenção de modificar a política de preços da estatal, com a possível fixação de valores por períodos mensais, em vez de diários. A única exceção é a manutenção dos preços do diesel pelos próximos 60 dias, como foi acertado com os caminhoneiros no domingo.

Conciliação

Após admitir o uso das Forças Armadas para garantir a desobstrução das estradas, o presidente Michel Temer adotou um discurso mais conciliador com os grevistas, no intuito de desanuviar o clima e facilitar o fim da paralisação. Ontem, em discurso na solenidade de posse do novo ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, Ronaldo Fonseca, o presidente evitou fazer críticas à categoria e garantiu que o diálogo sempre foi uma prioridade.

“Naturalmente entendeu-se que, logo no começo, eu deveria usar de toda força necessária para, logo no primeiro dia, impedir o movimento. Mas não é assim. Nossa vocação é o diálogo, que é o que praticamos ao longo desta semana”, declarou Temer. Para ele, a expectativa é de que a greve tenha um fim ainda hoje. “Tenho absoluta convicção que, entre hoje (ontem) e amanhã (hoje), todos nós, irmanados, e, naturalmente, aqueles que estão na chamada greve, (...) tenho certeza que tudo isso dará tranquilidade”, enfatizou.