O Estado de São Paulo, n. 45507, 22/05/2018. Política, p. A6

 

Joesley tenta pagar multa de delação

Amanda Pupo  e Rafael Moraes Moura

22/05/2018

 

 

Empresário pede ao STF para depositar primeira parcela de um total de R$ 110 milhões mesmo após Procuradoria-Geral rescindir acordo

A defesa do empresário Joesley Batista, do Grupo J&F, pediu ontem ao ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), que determine a abertura de uma conta judicial bancária para que ele deposite os valores combinados em seu acordo de delação premiada. Quando a colaboração foi fechada, o empresário acertou o pagamento de R$ 110 milhões em multa.

A Procuradoria-Geral da República, no entanto, rescindiu o acordo com delatores da J&F no ano passado. Para que o acordo perca os seus efeitos, é preciso que Fachin homologue a rescisão. O ministro não tem prazo para decidir sobre o pedido feito pelos advogados do empresário.

Em dezembro, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, reforçou o requerimento de rescisão das colaborações premiadas de Joesley e Ricardo Saud, ex-executivo da J&F. A decisão havia sido tomada em setembro pelo então procuradorgeral Rodrigo Janot. Na semana passada, a procuradora-geral endossou a solicitação em torno de Wesley Batista, acionista do grupo, e Francisco de Assis e Silva, também ex-executivo da J&F.

A defesa de Joesley destaca que a abertura da conta é necessária porque o vencimento da primeira parcela da multa ocorre no próximo dia 1.º de junho. Em um dos termos do acordo, Joesley se comprometeu a pagar os R$ 110 milhões, sendo 80% destinados à União e 20% ao ressarcimento dos bens jurídicos prejudicados pelo crime de lavagem de dinheiro.

O trecho da colaboração assinala que a multa será paga no prazo máximo de dez prestações anuais, devendo o saldo devedor ser corrigido pela inflação oficial (IPCA), a partir do dia 1.º de junho.

‘Fatos criminosos’. Os acordos de executivos da J&F foram homologados pelo STF em 11 de maio do ano passado. À época, Joesley envolveu o presidente Michel Temer, ao gravar conversa entre os dois em encontro no Palácio do Jaburu.

Já a rescisão das colaborações de Joesley e Saud foi feita pela PGR porque os executivos teriam omitido “fatos criminosos” ao fechar a delação. No caso dos dois são citados o suposto pagamento de R$ 500 mil ao senador Ciro Nogueira (PP-PI) para mudar o posicionamento no caso do impeachment da então presidente Dilma Rousseff, a existência de uma conta bancária no Paraguai em nome de Ricardo Saud, e a participação de Marcelo Miller como defensor dos interesses da J&F quando ainda era procurador da República. A atuação de Miller também foi o motivo para a PGR rescindir os acordos de Wesley e Francisco.

No caso de Wesley, há o componente adicional, segundo Dodge, “por também ter praticado, após a celebração de seu acordo, crime de insider trading” – utilização de informações privilegiadas para atuar no mercado financeiro. Wesley e o irmão Joesley são réus por essa denúncia na Justiça Federal em São Paulo.

Denúncia. Na semana passada, o Ministério Público Federal denunciou, pela primeira vez, Joesley e Silva sib acusação de corrupção ativa, lavagem de dinheiro, violação de sigilo funcional e embaraço de investigação. A denúncia desconsiderou os benefícios estabelecidos no acordo de delação. O MPF também denunciou outras quatro pessoas no mesmo caso.

 

Caso

Joesley fechou acordo de delação ano passado; termo não foi homologado pelo STF

 

União

80% da multa de R$ 110 milhões será destinada à União; primeira parcela vence no dia 1º de junho

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Doleiro vincula colegas de BH com ex-governador de Minas

Julia Affonso

22/05/2018

 

 

Delator na Operação Câmbio, Desligo diz que conta de empresa de Newton Cardoso era usada em esquema

O doleiro Cláudio Fernando Barboza de Souza, o Tony, delator da Operação Câmbio, Desligo, afirmou que Camilo Lelis de Assunção, preso em Belo Horizonte durante a ação da Polícia Federal, usou uma conta no exterior ligada a uma empresa da família do ex-governador de Minas Newton Cardoso (MDB) para operar. Segundo ele, Camilo e outro “doleiro da capital mineira (José Carlos Saliba) atendiam as operações maiores, notadamente do senhor Cardoso”.

As declarações de Tony foram feitas em 28 de fevereiro. A Operação Câmbio, Desligo foi deflagrada pela Procuradoria da República no início deste mês. Maior ofensiva já feita contra o mercado paralelo da moeda americana no País, ela levou à prisão 35 doleiros, que agiam desde os anos 1970 em praças diversas e comunicação com escritórios em paraísos fiscais.

Newton Cardoso governou Minas entre 1987 e 1991. O emedebista, de 80 anos, foi deputado federal por três mandatos (19791983, 1995-1996 e 2011-2015).

Camilo Assunção foi preso preventivamente na Câmbio, Desligo e está custodiado no sistema penitenciário estadual do Rio. De acordo com Tony, foi Camilo quem lhe contou sobre suas supostas relações com Cardoso. Tony contou ainda que, em 90% de suas transações com Camilo, seu colega de Belo Horizonte lhe vendia dólares. Em contrapartida, Tony disse que entregava reais em São Paulo para Camilo.

Aos procuradores, Tony contou que, “em algumas oportunidades”, vendeu dólares para Camilo no exterior e recebeu reais em Belo Horizonte. “Nas operações que Camilo vendia dólares ao colaborador, Camilo já comentou com o mesmo que o dinheiro era oriundo da empresa Demetal, relacionada à família de Newton Cardoso”, afirmou.

 

Defesa. O Estado não conseguiu contato ontem com Newton Cardoso. O advogado Marcelo Leonardo, que defende Camilo, disse que seu cliente “não é doleiro e nunca operou para o ex-governador e nem para ninguém”. “Há, na investigação, apenas a palavra de delator, sem qualquer prova de corroboração.” O advogado Carlos Alberto Arges Júnior, que defende Saliba, afirmou que ele “desconhece qualquer operação de câmbio envolvendo o ex-governador”.