Correio braziliense, n. 20149, 22/07/2018. Política, p. 3

 

Bolsonaro mira nas alianças de Alckmin

Bernardo Bittar

22/07/2018

 

 

Depois de ser rejeitado pelo PR, deputado diz que o ex-governador tucano reuniu "a nata de tudo o que não presta no Brasil ao lado dele". PSL oficializa o nome do ex-militar na corrida ao Planalto, hoje, no Rio

Um dia antes da convenção partidária do PSL, Jair Bolsonaro, mirou no candidato tucano Geraldo Alckmin. Afirmou que o ex-governador de São Paulo “reuniu a nata de tudo o que não presta no Brasil ao lado dele”. Em solenidade de formatura de paraquedistas do Exército, no Rio de Janeiro, o deputado defendeu que a aliança com o blocão — grupo composto por DEM, PP, PRB e Solidariedade — pode até garantir tempo de televisão, mas, amarra o presidenciável à velha política. Foi a primeira vez que Bolsonaro endureceu o discurso ao falar de Alckmin.

O grupo que hoje desperta as críticas de Bolsonaro é o mesmo que ele tentou se aliar no início das conversas com os demais partidos. Em sabatina do Correio Braziliense, em 6 de junho, Bolsonaro foi questionado sobre a sua capacidade de governar e negociar com o Congresso. O capitão da reserva revelou uma espécie de carta de intenções rumo ao Centrão — que, agora, apoia Alckmin — em dar sustentação ao eventual governo dele. Durante o evento no jornal, o candidato foi questionado sobre o grau de fisiologismo do grupo e admitiu tal característica.

Bolsonaro, depois, disse que não estava se referindo aos deputados e senadores do Centrão ao atacar Alckmin. O parlamentar ainda explicou que mesmo com esse apoio dado aos tucanos, grande parte dos parlamentares das legendas em questão pretende apoiar um futuro governo seu. “Ele é um general sem tropa porque 40% dos deputados que compõem esses partidos têm um compromisso de governabilidade sem o toma lá da cá conosco”, explicou o deputado.

Namoro

Muito antes de tentar se aproximar do Centrão, Bolsonaro namorava o PR. Convidou publicamente o senador Magno Malta para ser seu vice. Malta declinou do convite em evento na Assembleia Legislativa do Ceará. Depois, desmentiu. E disse que as notícias veiculadas pela imprensa são “uma vergonha”. A desistência do senador, que chegou a sinalizar sua vontade de ser vice do capitão, deve-se, em parte à ala feminina do partido, que considerou a aliança prejudicial às suas candidaturas.

Bolsonaro deve ser oficializado hoje como o candidato do PSL à Presidência. O nome de seu vice ainda é mantido em segredo. O partido afirma estar “se aproximando” de, ao menos, quatro pessoas. Uma delas é Janaína Paschoal (PSL), uma das autoras do pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Semana passada, a advogada negou o convite, mas disse “o temperamento dos dois formaria uma boa dupla”. O PSL respondeu dizendo que “ainda não chamou Janaína, porque alguns nomes estão na frente do dela”.

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Ranking dos crimes eleitorais

22/07/2018

 

 

Estados do Norte e do Nordeste concentram, proporcionalmente, o maior número de investigações por crimes eleitorais no país no período de uma década. Nas últimas seis eleições (2006-2016), Roraima, Acre, Rio Grande do Norte, Paraíba, Tocantins e Amapá tiveram a maior relação de inquéritos policiais por eleitor no Brasil. A maioria dos procedimentos abertos se refere a compra de voto.

Os números da Agência Estado fazem parte de um levantamento com base em relatórios da Polícia Federal obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). A reportagem comparou dados do número de inquéritos de matéria eleitoral enviados pela Divisão de Assuntos Sociais e Políticos (Dasp), da Polícia Federal, com a quantidade de eleitores de cada um desses estados.

Na década, considerando apenas os pleitos nacionais, houve crescimento de 8,9% no número de inquéritos: de 1.022 para 1.113 No Ceará e em Roraima, os casos crescem ano a ano. No entanto, houve queda na quantidade de crimes eleitorais referentes aos pleitos municipais. Ainda assim, foram abertos 2.073 inquéritos em 2016 — ante 3.528 em 2008 (diminuição de 41,2%).

Procuradores eleitorais, delegados e presidentes dos tribunais regionais eleitorais apontam que esse tipo de problema é impulsionado pela dependência que essas regiões têm em relação a empregos relacionados à máquina pública. Roraima é o estado que mais registrou esse tipo de ocorrência — 12,9 por cada 100 mil eleitores, em média, na década.

“De 10 anos para cá o voto de cabresto tem diminuído, mas ainda é um grande problema. A falta de acesso à educação e profissionalização, e por consequência, postos de trabalho, faz com que esses eleitores dependam muito de vínculos políticos regionais”, disse o secretário judiciário do Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, Helder Silva Barbosa.

Segundo ele, houve uma “institucionalização” do voto de cabresto em algumas regiões. “Prefeitos ameaçam terceirizados ou dizem aos eleitores que as escolas vão fechar, o vale-gás não será mais concedido e aquele contrato terceirizado será cancelado.”

Reforço policial

Em razão do número de casos registrados, Norte e Nordeste são as regiões que mais receberam, na década, reforço da Polícia Federal no período eleitoral, tanto no primeiro quanto no segundo turno das eleições. Dos oito estados que pediram auxílio para a realização do último pleito nacional em 2014, sete eram dessas regiões, além do Distrito Federal.

Ainda assim, esses números podem representar apenas parte do fenômeno, já que muitas denúncias não resultam em inquérito. “A maior parte dos crimes eleitorais é de menor potencial ofensivo, como boca de urna e, via de regra, não resulta em inquérito policial. A apuração é feita em termo circunstanciado”, diz o procurador regional eleitoral em Rondônia, Luiz Gustavo Mantovani.

Para o professor de direito da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e promotor de Justiça Tácito Yuri de Melo Barros, a crise econômica e a forte dependência dos cargos públicos contribuem para que esse tipo de crime seja comum nessas regiões. “No Norte e no Nordeste essas questões são mais acentuadas, pois têm a ver com as necessidades da população. Às vezes a moeda de troca é ainda mais simples, nem sequer é um bem durável, mas sim comida, um botijão de gás”, diz.

Para o professor de Direito Eleitoral da FGV São Paulo e do Mackenzie, Diogo Rais, uma das explicações pode estar na importância da eleição na vida desses cidadãos. “Vive-se mais dentro da máquina pública do que em outras regiões. Em cidades menores, o risco é ainda maior.”

 

1.113

Total de inquéritos abertos considerando apenas eleições nacionais na última década

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O tabuleiro eleitoral

Luiz Carlos Azedo

22/07/2018

 

 

O fato novo na campanha eleitoral é a ampla aliança formada pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) com o propósito de catapultar sua candidatura ao segundo turno, garantindo-lhe para isso a vantagem estratégica do maior tempo de televisão entre os candidatos. Ao amarrar as alianças com o PTB, PSD e PPS, o tucano conseguiu atrair o bloco de centro formado pelo DEM, PP e PR. O Solidariedade ainda ameaça pular fora do barco. Muita água vai rolar até o registro das coligações, cujo prazo é 15 de agosto, mas os blocos eleitorais estão se consolidando e já se pode dizer que Alckmin entrou, finalmente, na disputa pela Presidência.

O ex-governador paulista foi beneficiado pela falta de identidade dos partidos do Centrão (que não tem nada a ver com o blocão ideologicamente conservador da Constituinte de 1987) com os demais candidatos, depois de a candidatura do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), à Presidência não vingar. O bloco é muito fisiológico e namorava o candidato do PDT, Ciro Gomes, mas as atitudes radicais do ex-governador cearense, outra vez, puseram tudo a perder. A carta enviada à Embraer e a Boeing contra a fusão das duas grandes empresas foi a gota d’água. Sinalizou para o DEM que Ciro não era um político confiável para os que defendem a não intervenção estatal na economia. As afirmações de que não abriria mal da “hegemonia moral” na relação com os aliados espantaram os demais.

Ciro negociava com o Centrão, mas miravam o PSB, que ainda não decidiu o que pretende fazer nas eleições. Uma ala da legenda defende a aliança com PT e outra, propõe o lançamento de uma candidatura própria. Nas pesquisas de intenção de voto, Ciro está em vantagem em relação a Alckmin; essa dianteira, porém, torna-se frágil diante do isolamento em que ficou. Do bloco que aderiu a Alckmin, somente o Solidariedade deve se manter ao lado de Ciro, por causa do alinhamento de sua base sindical com o candidato do PDT.

Pesaram a favor de Alckmin o discurso moderado, a paciência para conversar e uma trajetória de político tradicional que respeita a palavra empenhada e compartilha o poder com os aliados. É tudo o que os políticos do centrão desejam, pois estão mais focados na eleição de bancadas federais que garantam participação no futuro governo, qualquer governo. Não deixa de ser um ônus para Alckmin a aproximação dessas forças, em particular o PR, de Waldemar Costa Neto, figura carimbada desde o mensalão, que negociava com Jair Bolsonaro (PSL) e deixou o ex-capitão a ver navios.

Isolamento

Em primeiro lugar nas pesquisas de opinião sem Lula, Bolsonaro sentiu o golpe, pois contava com o tempo de televisão do PR e a deriva das forças do Centrão para chegar ao segundo turno. A defecção de Costa Neto levou-o ao isolamento, com pouquíssimo tempo de televisão para campanha. Com isso, a jurista Janaína Paschoal, coautora do pedido de impeachment de Dilma Rousseff — acompanhada dos juristas Hélio Bicudo e Miguel Reale Junior — pode vir a ser a vice na chapa de Bolsonaro. Também está isolada a candidata da Rede, Marina Silva, que é a segunda colocada nas pesquisas. Tentou atrair o PPS e o PV, que seriam alternativas de alianças, mas os dois partidos estão com Alckmin. Marina já provou sua resiliência nas duas campanhas anteriores, sua capacidade de resistir ao isolamento será posta à prova novamente.

A alternativa da ex-senadora é alavancar a candidatura nos chamados movimentos cívicos, fazendo um contraponto ao pragmatismo de Alckmin. A candidata da Rede paga o preço por ter se mantido acima dos partidos e à margem do jogo político tradicional. Vem daí a sua força e sua fraqueza. Até agora, diante da paridade de meios de campanha nas redes sociais, manteve-se numa posição mais robusta do que a de Alckmin. Vamos ver o que acontecerá quando a campanha começar no leito tradicional das coligações eleitorais e na tevê, o ponto fraco de sua candidatura.

Outro candidato isolado é o senador Álvaro Dias (Podemos), que também não conseguiu ampliar sua coligação. O político paranaense atrapalhou muito os planos de Alckmin até agora, pois conseguiu capturar uma fatia significativa dos potenciais eleitores do tucano no Sul do país, inclusive, numa franja da fronteira de São Paulo. Por essa razão, chegou a ser cogitado para vice do tucano, mas não quis nem conversa.

PT e PMDB ainda não se posicionaram claramente no tabuleiro eleitoral. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está preso em Curitiba, insiste com sua candidatura, mesmo inelegível. É uma estratégia de confrontação com o Judiciário que tem tudo para dar errado, mas os petistas acreditam que pode ser a salvação para seus candidatos nas eleições e, até mesmo, levá-los de volta ao comando do país. A lógica é simples: manter o nome de Lula até ele ser impugnado e, depois, substituí-lo por outro petista. O mais cotado é o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad. É impossível saber qual será a capacidade de transferência de votos de Lula na cadeia.

Finalmente, o grande enigma: o MDB, que lançou Henrique Meirelles. A tradição do partido, desde a campanha de Ulysses Guimarães, é cristianizar seus candidatos. Federação de caciques regionais, a candidatura do ex-ministro da Fazenda é sob medida para isso, pois tem baixa densidade eleitoral e praticamente nenhum laço orgânico com as bases da legenda. O partido opera em função das eleições estaduais, para eleger suas bancadas e, depois, aprisionar o novo presidente da República.