Correio braziliense, n. 20170, 11/08/2018. Política, p. 3
O dilema dos petistas
Alessandra Azevedo e Renato Souza
11/08/2018
Apesar de manter o registro de Lula para o dia 15, integrantes do PT se dividem sobre a substituição imediata por Haddad. O receio é de que, ausente de eventos oficiais de campanha, a legenda perca apoio, algo verificado em pesquisas internas
Com o candidato oficial do partido preso em Curitiba e ausente do primeiro debate entre os presidenciáveis, o PT reavalia a estratégia para a campanha. A sigla continua decidida a registrar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 15 de agosto, mas repensa o que fazer a partir de então. Com base em levantamentos internos, a direção do PT já avalia que a próxima pesquisa eleitoral vai mostrar uma queda na intenção de votos em Lula — reflexo da ausência no debate e sintoma da necessidade de uma mudança de rumos.
A legenda está dividida sobre como agir nos próximos dias para não piorar o quadro e perder algo em torno de 20% a 30% do eleitorado que Lula ostenta até agora, a depender do cenário. A última esperança de boa parte dos petistas é que, quando a candidatura for oficializada, a Justiça o libere para participar de debates. As divergências internas ficam mais fortes diante da possibilidade de que venha outra negativa do Judiciário em relação à possibilidade dele fazer campanha — como ocorreu esta semana — ou a decisão do TSE de impugnar a candidatura do ex-presidente, algo que a direção do partido espera que aconteça até uma semana depois dos registros, em 22 de agosto. Em qualquer um desses casos, uma ala defende a troca imediata do nome dele pelo do vice, Fernando Haddad, enquanto outra aposta em recursos para esticar a exposição de Lula como candidato.
A segunda corrente, da qual fazem parte a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, e o senador Lindbergh Farias (RJ), é favorável à manutenção de Lula como cabeça de chapa o máximo de tempo possível, mesmo depois que o TSE decidir pela nulidade da candidatura. Eles defendem a apresentação de recursos, o que esticaria o tempo dele como candidato por mais alguns dias, porque entendem que desistir antes de o TSE tomar uma decisão iria contra o argumento defendido pela legenda até agora, de que Lula é um preso político e está sendo injustamente impedido de participar das eleições. “Eles vão ter que abrir mão em algum momento, mas acredito que evitam fazer isso muito cedo para não enfraquecer o discurso”, avalia o cientista político Sérgio Praça, da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Impugnação
Mesmo admitindo que é necessário um “selo” da impugnação do TSE para abrir mão do nome do ex-presidente sem cair em contradições, outro grupo quer que Haddad assuma o quanto antes a chapa, assim que a Corte decidir negar a candidatura. Entre os defensores dessa ideia estão o senador Jorge Viana (AC) e o ex-governador da Bahia e ex-ministro da Casa Civil Jaques Wagner. Essa ala considera muito arriscado deixar o PT sem representação nos debates e, talvez, na propaganda eleitoral gratuita, a depender de decisão judicial a respeito desse assunto. “O problema é convencer Lula disso”, disse um cacique petista.
Um dos riscos de manter a candidatura de Lula até o fim é de que o partido perca votos por não aparecer o suficiente, o que, em uma corrida fragmentada como a que se desenha, é um perigo real de que o PT não chegue ao segundo turno. Enquanto outros candidatos se expõem, ganham destaque e conseguem apresentar propostas, o petista está, literalmente, isolado. O partido está perdendo “preciosos dias de campanha para apresentar Haddad”, que é pouco conhecido em nível nacional, pondera Praça.
A reavaliação da estratégia petista ficou clara em entrevista coletiva concedida na tarde de ontem por Gleisi, após visita a Lula, em Curitiba. Apesar de ter reafirmado que o ex-presidente é o candidato oficial do partido, que o nome dele será registrado em 15 de agosto e que é a foto dele que estará nas urnas em 7 de outubro, a senadora fez uma observação que sinaliza para uma mudança de rumos ao relembrar que, “durante a campanha, o nosso candidato a vice é o porta-voz do presidente”. Segundo Gleisi, Haddad “vai andar o Brasil, vai fazer os debates, vai participar das sabatinas, vai ser a voz de Lula, do nosso programa, do nosso projeto para o povo brasileiro” — ou seja, fará todas as tarefas atribuídas a um candidato cabeça de chapa, não ao vice.
Invisível
Os receios do partido ficaram ainda maiores diante da pouca visibilidade do “debate alternativo” promovido por Haddad e a aliada Manuela D’Ávila (PCdoB) — vice-candidata, quando Lula sair de cena — ao vivo na internet, durante o debate de quinta-feira. As visualizações foram muito abaixo do que os petistas esperavam. Apenas 44,8 mil visualizações, contra 2,6 milhões que viram o debate oficial, sem representante do PT e quase nenhuma menção à candidatura de Lula, que foi encarado pelos candidatos como página virada.
O partido tentou minimizar o fato de Lula ter sido pouco mencionado e da ausência dele não ter sido suprida pelo debate paralelo. Ontem, em entrevista coletiva em Curitiba, após visitar o ex-presidente na sede da Polícia Federal, em Curitiba, a presidente do partido, Gleisi Hoffmann, afirmou que ele “só viu um pedaço do debate”, que considerou “sem propostas”. Mas, nos bastidores, a ausência preocupa muitos dirigentes do partido.
Depois de ter sido invisibilizado no debate, Lula corre o risco de não aparecer no horário eleitoral gratuito, que começa em 31 de agosto, segundo a especialista em direito eleitoral Karina Kufa. Se a justiça criminal não autorizá-lo a participar das propagandas oficiais na televisão e no rádio, ele não pode ser substituído pelo vice, explica. “É a mesma lógica do debate”, diz. A propaganda eleitoral gratuita vai até 4 de outubro, três dias antes do primeiro turno.