Correio braziliense, n. 20213, 23/09/2018. Opinião, p. 11

 

Por que Bolsonaro não deve ser eleito

Antônio Augusto de Queiroz

23/09/2018

 

 

A eleição presidencial colocará o cidadão brasileiro no dia 7 de outubro, novamente, diante de um dilema: escolher o próximo presidente com base na emoção ou na razão. Em política, as escolhas emocionais não costumam produzir bons resultados, embora sejam sempre tentadoras. Por seu lado, eleições jamais são escolhas exclusivamente racionais. Se assim fossem, não seria necessário o próprio processo eleitoral. Um computador poderia escolher, a partir de algoritmo ou cálculo probabilístico, o melhor candidato.

É importante, porém, que o eleitor pense bastante antes de seguir uma onda ou votar apenas pensando em chavões ou palavras de ordem, pois a escolha terá impactos profundos sobre a vida do país. No presidencialismo brasileiro, o presidente da República enfeixa uma tríplice dimensão de poderes. Como chefe do Poder Executivo, é, ao mesmo tempo, chefe de Estado, chefe de governo e o supremo mandatário, o líder da nação. E, com a carência de estadistas no país, encontrar quem cumpra esses três papéis em sua total dimensão é muito raro. E, mesmo quando encontra, muitas vezes, não obtêm, durante seus governos, o reconhecimento político merecido.

O candidato Bolsonaro — pela sua trajetória política, suas declarações e seus compromissos — mostra que não detém as capacidades necessárias para o exercício da Presidência. Sua visão de Estado penal, sua formação e convicções autoritárias são incompatíveis com o exercício da presidência numa democracia das dimensões e importância do Brasil, especialmente neste momento de crise.

Para exercer o papel de chefe de Estado, o presidente deve ter equilíbrio, capacidade de diálogo, autoridade moral e legitimidade política. No contexto internacional, deve defender os interesses do país acima de quaisquer outros, e fazer escolhas ponderadas examinando todos os cenários. Não pode ser beligerante, nem arrogante, mas deve ser altivo, representando a soberania nacional.

Como chefe de governo, além de visão de futuro, deve ter a capacidade de apresentar ao país um programa de governo consistente e realista. Deve ter conhecimento da realidade social e econômica e capacidade de coordenar o governo, escolher bons ministros e dar-lhes liberdade e autonomia para exercer as funções, porém, preservando a autoridade e prerrogativa de ser a última instância decisória. Um bom chefe de governo precisa saber ouvir, saber questionar e, sobretudo, saber decidir.

A responsabilidade de governar é indelegável e não admite “superministro” ou quem, sem o voto, queira exercer o mandato. Não pode escolher pessoas sem nenhuma experiência de governo para fazer do país um laboratório de teses importadas, ou remédios amargos que instituições multilaterais insistem em aplicar em países como o Brasil.

Como líder da nação, precisa exercer essa liderança, legitimada pelo voto, sem autoritarismo, sem ódio, sem preconceitos, estabelecendo o diálogo com todos os setores da sociedade – inclusive a oposição – além de apontar os rumos para o país superar as dificuldades. Precisa estar presente, sintonizado com a sociedade e negociar com o Congresso, a cada momento, a aprovação da pauta legislativa que permita implementar propostas. Essa espécie de liderança requer não apenas a capacidade de ouvir, negociar, transigir, mas também sabedoria para, quando for o caso, com firmeza, defender suas posições sem submeter-se a barganhas antirrepublicanas.

Assim, os principais atributos do presidente devem ser o equilíbrio emocional, a tolerância, a calibragem nas decisões, a capacidade de formar consensos e não fomentar o ódio ou a sede de vingança. Deve respeitar a diversidade, a pluralidade, ter capacidade de relativizar e flexibilizar dogmas, costumes e valores que professa. 

A tripla condição de um presidente demanda que a sociedade reconheça essas capacidades, de forma satisfatória, sob pena de ingovernabilidade. Um presidente que seja eleito com o discurso do ódio, que aponte problemas e seus supostos culpados sem apresentar soluções, explorando a luta e a disputa entre facções, que ameace “banir” os adversários da vida política, que expresse, a todo momento, visões preconceituosas sobre minorias, que encare os pobres como “desajustados”, que defenda violência como solução para os problemas de segurança da sociedade, não terá a capacidade de reunir o país num grande pacto social e político, necessário para superar a crise atual.

Uma escolha que não leve em conta esses diversos fatores e, além disso, seja pautada pela desilusão com a política, pelo descrédito nos candidatos e pelo apoio a uma visão autoritária, de que é com gritos e rompantes que serão resolvidos os problemas nacionais, certamente agravará as dificuldades já existentes e resultará em desfecho que não será o melhor para o Brasil.

ANTÔNIO AUGUSTO DE QUEIROZ

Jornalista, consultor, analista político e diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap)