Correio braziliense, n. 20198, 08/09/2018. Cidades, p. 19

 

Ensino abaixo da meta

Luiz Calcagno

08/09/2018

 

 

“Falta estímulo.” Essa é a principal explicação de estudantes, educadores e especialistas quando questionados sobre o desempenho do Distrito Federal no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Se, por um lado, as notas das escolas públicas e privadas mostram uma tendência de crescimento (veja arte), por outro, não acompanham as metas definidas pelo Ministério da Educação (MEC). Além disso, apenas 12 das 83 unidades públicas de ensino médio obtiveram nota. O número de estabelecimentos privados avaliados nessa etapa também é baixo. A razão é o reduzido número de estudantes nessas instituições que participaram do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), uma das avaliações que compõem o índice.

Polyana Moreira, 16 anos, está no 2º ano do ensino médio e gosta de estudar. Ela ainda não escolheu o que cursar na universidade, mas se envolve com as atividades desenvolvidas no Centro Educacional 1 do Cruzeiro, que ficou em sexto lugar no ranking das escolas públicas da capital. Para a jovem, falta investimento em tecnologias para atrair os alunos. “O desestímulo acontece por vários fatores. E, muitas vezes, um estudante que está desanimado puxa outros colegas. A evolução do aluno é a evolução da escola. Eu procuro me envolver nos projetos e acho que a tecnologia pode ajudar. Ter bons computadores e material de laboratório”, exemplifica.

O pai dela, Luís Fernandes, 57, está satisfeito com a escola da filha, mas faz ressalvas. “A circulação de professores temporários também desestimula. Quando entra um que mobiliza os estudantes, que eles gostam, logo ele sai”, lamenta. Para o coordenador da unidade de ensino, Eudes Henrique, o segredo para que os alunos tenham bom rendimento e participem do Ideb é motivá-los. “Muitos alunos reclamam disso, mas sempre participamos das olimpíadas de conhecimento e dos torneios de robótica. Dessa forma, eles conseguem perceber o próprio desempenho”, explica.

Diretora do Centro de Ensino Fundamental 1 do Cruzeiro, Fátima Silva de Carvalho Mendonça aposta no envolvimento da comunidade para melhorar o desempenho dos estudantes e estimulá-los a fazer a prova. A unidade tem alunos do 1º ao 9º ano do ensino fundamental e atingiu nota 5,9 nos anos iniciais (de 1º ao 5º ano) e 5,4 nos anos finais (do 6º ao 9º ano). “Além disso, os professores têm liberdade para desenvolver projetos. Os nossos alunos participaram do festival de cinema com curtas feitos por celulares”, destaca.

Falhas no sistema

Na visão do professor do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília (UnB) Pedro Demo, há um descuido com a educação nas escolas públicas e privadas a partir dos anos finais do ensino fundamental. “Parece que baixamos a guarda nessa etapa. É onde estamos crescendo menos. A rede pública conclui os anos iniciais do ensino fundamental com 6 e, nos anos finais, com 4,3. A tragédia vem no ensino médio, onde podemos ver que a diferença entre o ensino público e o privado é grande”, avalia.

Para Pedro, falta aprendizado adequado. “Temos um tom de estagnação no ensino médio. De 2005 a 2017, são 12 anos perdidos. O sistema de ensino que temos não vai funcionar. Ele leva só à transmissão de conteúdo instrucionista. As pessoas não aprendem. É preciso um sistema de aprendizagem, com leitura, pesquisa e produção de texto. A aprendizagem é uma autoria, está na mente do estudante e, lá, você não entra. A proposta de ensino está errada.” O professor ressalta que é preciso saber por que só uma minoria dos alunos do ensino médio fez a prova.

Reforma estrutural

O secretário de Educação do DF, Júlio Gregório Filho, admite que os resultados estão aquém do esperado, mas tem uma visão positiva sobre as notas do DF no Ideb. “O mais importante não é o ponto de partida e o de chegada, mas o quanto cresceu no caminho. Em termos de avaliação, a escola privada tem uma nota maior do que a da pública, mas apresentou uma avaliação inferior. O ensino fundamental, nos anos iniciais, em 2015, estava com 4,4. Chegou a 2017 com 6. Subiu 1,6 ponto. Já a particular teve nota inicial de 6,4 e terminou com 7,4”, compara Júlio.

A maior discrepância de notas entre a escola pública e a particular ocorre no ensino médio. O secretário destaca que, mesmo nesse cenário, a rede distrital apresenta um crescimento mais constante. “Ainda assim, nas duas redes, a fotografia não é das melhores. Apesar do quadro horroroso, somos o 4º do Brasil. E todo mundo está no vermelho. Nós temos que reestruturar o ensino médio. Sei que o momento político é delicado, mas alguma coisa tem que ser feita. O DF está trabalhando com professores, gestores, em um redesenho do currículo, para termos uma escola em que o aluno seja mais protagonista.”

Professores

Representantes do Sindicato dos Professores do DF (Sinpro) e do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares do DF (Sinepe) também se manifestaram sobre o Ideb na capital. Cláudio Antunes, diretor da primeira entidade, diz que professores da rede pública estão analisando os números. Sobre a baixa adesão de estudantes à prova no ensino médio, diz não acreditar em um “boicote”. “Acontece que o professor está sobrecarregado e o aluno, desanimado”, opina.

Já o presidente do Sinepe, Álvaro Moreira Domingues, destacou, entre outras coisas, a necessidade de todas as escolas particulares do DF participarem da avaliação. “É inadmissível que o sistema de ensino do DF, tanto público quanto privado, com uma estrutura significativa e quadro excepcional de professores, continue com esse desempenho. No ensino médio, o declínio do interesse do aluno é significativo. Isso justifica uma reforma no sistema. A começar pelo modelo financiamento”, exemplifica.

Ainda de acordo com Álvaro, também é necessário ser mais firme com o estudante para que ele faça a avaliação. “O mecanismo tem que ser mais contundente. Ele tem que fazer a prova, se não, não recebe o certificado de conclusão. E a nota, por sua vez, tem que integrar o diploma”, sugere.