Correio braziliense, n. 20251, 31/10/2018. Política, p. 6

 

Polêmica na escolha do reitor

Lucas Valença

31/10/2018

 

 

Especialistas avaliam que a atuação de membros da equipe do presidente eleito, Jair Bolsonaro, do PSL, de tentar interferir na escolha dos reitores das universidades públicas federais, rompe com um procedimento informal adotado pelo Executivo desde a redemocratização. A nomeação é de atribuição do presidente da República, que recebe uma lista tríplice das instituições de ensino superior, mas a medida pode vir a pôr em risco a autonomia universitária.

Na coluna Brasília-DF, a jornalista Denise Rothenburg informa que integrantes ligados a Bolsonaro mapeiam os mandatos dos reitores das universidades públicas federais. A “ordem é tentar influir na composição das listas tríplices” para que o capitão reformado possa evitar futuros protestos contra o próximo governo. A intenção gerou mal-estar em integrantes da comunidade acadêmica procurados pelo Correio.

O funcionamento do ensino superior no Brasil é estabelecido pela Lei nº 5.540, de 1968, mas teve partes do texto alteradas por outros governos. Atualmente, a elaboração da lista tríplice se dá de acordo com a Lei nº 9.192, de 1995, que também concede ao presidente da República a nomeação dos nomes escolhidos pela universidade federal. Há uma eleição entre professores, alunos e funcionários para legitimar a escolha da maioria, mas não produz a escolha da lista. É o Conselho Universitário — composto por representantes da instituição, como diretores de centro, ex-reitores, pró-reitores,  DCE, entre outros — que define os nomes endereçados a Brasília.

Pelo diálogo

Para o historiador do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) Frederico Tomé, respeitar a escolha da comunidade acadêmica é uma maneira de “abrir um diálogo” com a academia. Porém, o professor acredita que a não indicação do nome que encabeça a lista é uma forma de não cumprir com os “preceitos democráticos”. “Não necessariamente é autoritária, já que há uma lista de três nomes e o chefe do Executivo pode escolher qualquer um deles, mas certamente pode prejudicar a legitimidade do reitor nomeado perante os integrantes da universidade”, explica. Para o acadêmico, não escolher o primeiro da lista pode ser entendido como uma interferência indevida. “Optar pelo segundo ou terceiro nome pode sinalizar certa afinidade ideológica com o ministro da Educação ou com os poderes instituídos e isso ameaça a autonomia universitária”, afirma.

Segundo o constitucionalista Eduardo Mendonça, a autonomia universitária é um preceito da Constituição, mas o conteúdo específico não é nítido e aborda vários fatores. O jurista diz que, por mais que entenda a lista tríplice como uma “boa fórmula de escolha do reitor”, não é um elemento essencial. Assim, uma eventual mudança na forma de se indicar o comando universitário pode vir a ser referendado pela Supremo Tribunal Federal, caso seja provocado. “É importante por conter a escolha de uma parte da comunidade universitária, mas existem outras entidades da administração pública que não utilizam esta forma e funcionam bem”, esclarece Mendonça.