O globo, n. 31130, 30/10/2018. País, p. 6

 

'A agenda econômica de Bolsonaro terá meu apoio'

Rodrigo Maia

Maiá Menezes

Thiago Prado

Fernanda Krakovics

30/10/2018

 

 

Deputado busca apoio para se reeleger ao comando da Casa e diz que teria sido melhor apoiar Ciro Gomes do que Geraldo Alckmin

O senhor estará na base do governo Bolsonaro a partir do ano que vem?

Votei no Bolsonaro pela agenda econômica dele. Tenho muita convergência com os caminhos que estão sendo propostos pelo Paulo Guedes. Se essa for a agenda do governo no Parlamento, terá sempre o meu apoio.

O que dá para votar este ano?

Depende de como vai ser a articulação do novo governo no Parlamento. A cabeça nesse corpo precisa ser do novo, não do que está saindo.

A flexibilização do Estatuto do Desarmamento é uma agenda do próximo governo...

Há consenso para ampliar as restrições (ao porte de armas) e tirar da Polícia Federal o poder discricionário de liberar ou não a licença, depois de atingidos os pré-requisitos. O que tem de polêmico nesse debate é o porte rural. Hoje, no campo, o fazendeiro pode ter a posse de arma na sua propriedade. Mas ele não pode andar em nenhum ambiente no entorno porque não tem o porte. Isso restringe muito a proteção pessoal do produtor rural em relação até à entrada de animais. Só tem que ter cuidado para não virar uma milícia armada. Mas não é uma agenda para a semana que vem, não tem data marcada.

O deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS) disse que a proposta de reforma da Previdência do futuro governo é distinta da do governo Temer. Há clima para votar o tema ainda este ano?

Eu não conheço a proposta do Onyx. Temos duas questões a serem resolvidas: o estoque, que são as pessoas que já estão no sistema, e os novos. Um governo eleito como esse tem sempre força para aprovar suas matérias.

A partir de janeiro ou agora?

Eu não sei como o governo vai atuar. A partir do ano que vem, com certeza terá força para aprovar as reformas que propôs na eleição.

Onyx irá para a Casa Civil, mas é da cota pessoal do Bolsonaro. O DEM vai participar do governo?

Quem tem que avaliar isso é o presidente eleito com o presidente do partido (ACM Neto). Repito: a minha opinião é que a agenda que o Bolsonaro propôs através do Paulo Guedes é 100% convergente com aquilo que a gente pensa. Isso temos que apoiar de qualquer jeito.

Afinal, o senhor vai disputar a Presidência da Câmara de novo?

Não decidi ainda. Ninguém é candidato a presidente da Câmara apenas pela sua vontade. É preciso construir as condições. Agora, se perguntar se gosto de ser presidente da Câmara, se é uma posição que te dá prestígio e poder? Sim.

Bolsonaro já disse que não fará indicações políticas para o seu ministério. Acha que ele conseguirá governabilidade dessa forma?

Existe um mito sobre a necessidade de se dar cargos. A preocupação do deputado, legítima ,ém ui tomai or com para suas basesquer que, naquele município onde ele foi o mais votado, o governo coloque dinheiro em saúde e educação.

Na eleição que rejeitou a velha política não passou um recado de que práticas antigas terão que ser revistas?

É claro que tem um recado, uma parte da política já se reinventou. O Jair Bolsonaro, por exemplo, se reinventou. Tem sete mandatos e se elegeu como a mudança na política. Parabéns para ele, enxergou na frente dos outros.

O senhor apoiou Geraldo Alckmin (PSDB), que teve um péssimo desempenho nas urnas. No que que ele errou?

O resultado da eleição mostrou que havia um esgotamento do ciclo de 30 anos da redemocratização. A punição maior, indicavam as pesquisas, era ao PT e ao PSDB. O PT sobrevivia principalmente no Nordeste pela liderança do Lula. O resultado da eleição provou que os partidos que estavam no entorno do PSDB também estavam contaminados pela velha política. O problema do Geraldo (Alckmin) foi muito mais de fim de ciclo do que dele.

O Ciro (Gomes) era um nome melhor para o Centrão apoiar?

Para ganhara eleição, está na cara que era. Mas o partido majoritariamente não queria o Ciro. Eu entendia que ele isolava o PT e agente passava ater condição deter uma candidatura ma isao centro. Dois seriam fortíssimos eque desistiram eram Luciano Hucke Joaquim Barbosa. Como eles não se colocaram, o Jair conseguiu representar esse sentimento de mudança, que ele já vinha trazendo desde a eleição de 2014.

O que o DEM vai fazer agora?

A relação da política com a sociedade mudou. Todo mundo achava que se você não desse um abraço no eleitor, ele não votava em você. Que a estrutura de TV te fazia conhecido. Não estou dizendo que a TV perdeu a força. Acho, por exemplo, que o episódio de 6 de setembro (facada) deu ao Bolsonaro um nível de exposição na mídia que compensou o pouco tempo de TV. Agora, o WhatsApp ganhou uma importância que não vi ninguém, fora o grupo do Bolsonaro, atento.

Reconhece então que foi pego de surpresa nessas eleições?

Eu sei o que aconteceu, agora, os instrumentos, como ele (Bolsonaro) fez, ele não construiu da noite para o dia. Todos terão que construir. Eles descobriram quais aplicativos e de que forma seriam melhor usados. O aperto de mão é importante, mas hoje o eleitor se sente próximo a você através do celular, o que a gente não imaginava que tivesse tanta confiança.

Na eleição do Rio, Eduardo Paes errou?

Ele fez tudo certo. Tinha era uma onda pró-Bolsonaro que, pelo movimento que o Flávio (Bolsonaro) fez, ficou vinculada ao juiz. E teve o indeferimento da candidatura do Garotinho, que foi decisivo para o Wilson (Witzel). Ojuiz cresceu mais no voto evangélico. A queda do Garotinho abriu um espaço.

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Os sinais trocados do presidente eleito

Bernardo Mello Franco

30/10/2018

 

 

Jair Bolsonaro deu sinais trocados no primeiro dia como presidente eleito. Em entrevistas a quatro emissoras de TV, ele repetiu promessas de moderação e respeito às leis e à democracia. Ao mesmo tempo, renovou ameaças a opositores e a jornais que o criticarem no exercício do poder.

No Jornal Nacional, o capitão se disse “totalmente favorável à liberdade de imprensa”. Pouco depois, ameaçou usar verbas públicas para punir veículos. A intenção é sufocar financeiramente quem publicar reportagens que o desagradem.

Ele fez ataques à “Folha de S.Paulo”, que revelou a existência de uma funcionária fantasma em seu gabinete. Não explicou, porém, por que demitiu a assessora. Ela foi flagrada vendendo açaí em Angra dos Reis durante o horário de expediente.

Na Band, Bolsonaro disse que não fará nada para “esmagar a oposição”. Na mesma entrevista, esmagou a história ao dizer que o regime militar não foi uma ditadura. Ele também tentou relativizar a censura a jornais e revistas. Disse que a prática foi pontual, embora a presença de censores nas redações tenha sido permanente a partir de 1968.

O presidente eleito afirmou no JN que tratará a Constituição como “nossa Bíblia aqui na terra”. Em seguida, reforçou ameaças a adversários políticos. Questionado sobre a promessa de expurgar “marginais vermelhos”, deixou claro que se dirigia à futura oposição. “Logicamente estava me referindo à cúpula do PT e à cúpula do PSOL”, sentenciou.

Bolsonaro se disse vítima de fake news, mas voltou a espalhar notícias falsas que usou na campanha. Ele acusou o candidato derrotado Fernando Haddad de ter produzido um “kit gay” que atentaria contra “a inocência das crianças”. O site Fato ou Fake esclareceu que o material era dirigido a educadores, não a alunos, e nem chegou a ser distribuído.

O ministro Carlos Horbach, do TSE, proibiu o PSL de explorar a história no horário eleitoral. Ele afirmou que a propaganda do presidente eleito “gerava desinformação”, com “prejuízo ao debate público”.

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Liberalismo e ameaças no 1º dia como eleito

Paulo Celso Pereira

30/10/2018

 

 

Em seu primeiro dia como presidente eleito, Jair Bolsonaro finalmente emitiu sinais claros sobre qual personagem encarnará no Palácio do Planalto. Na economia, aparentemente a política será, de fato, liberal. A diplomacia tende a se alinhar aos Estados Unidos e, como os republicanos de lá, a política pró-armas deve se tornar prioritária. Só que, apesar dos acenos à oposição, o presidente eleito deixou explícito que o fim da campanha não sepultou traços de autoritarismo. Ao prometer cortar verbas da imprensa crítica, o que o PT só fez após a eleição de 2014, o presidente eleito mostrou desconhecer que o dinheiro público é dos governados, não dos governantes.

Após passar meses evitando detalhar seu plano de governo, Bolsonaro mostrou que a ala liberal de sua equipe deve dominar a agenda econômica. Um dia após ser eleito, fez um discurso de adesão total à agenda pró-mercado capitaneada pelo futuro ministro Paulo Guedes.

A primeira providência foi aderir à proposta do presidente Michel Temer para a reforma da Previdência. Mas não foi só. De olho no destravamento da economia, prometeu um governo austero, defendeu a importância do teto de gastos, prometeu reduzir despesas cotidianas, cortar ministérios, cargos públicos e fazer privatizações — citando inclusive da Empresa Brasileira de Comunicação. Em uma frase que dificilmente seria dita em período eleitoral, deixou explícito que atenderá aos desejos do empresariado:

—Devemos desburocratizar, desregulamentar, buscar maneiras de os investidores, os patrões, os empresários, os comerciantes tenham meios de empregar gente sem tanta burocracia, porque somente dessa forma você pode movimentar a nossa economia —pontuou.

As entrevistas revelaram também qual deve ser o primeiro conflito no núcleo do governo: a disputa entre Paulo Guedes e o futuro chefe da Casa Civil, Ônyx Lorenzoni, que, pela manhã, havia atacado a proposta de Temer para a reforma da Previdência, pois esta seria “apenas um remendo”.

Ficou claro também que a organização da base parlamentar do novo presidente não será simples. Bolsonaro disse explicitamente o que alguns de seus assessores já falavam de forma reservada: ele pretende implantar uma negociação individual com mais de 300 parlamentares. Para complicar ainda mais, disse que faria isso pois “a maioria” dos deputados é honesta, mas seria vítima de líderes mal-intencionados.